Ação Educativa na CONAE 2024: confira aqui o que rolou!

Durante a Conferência Nacional de Educação 2024, a Ação Educativa disseminou a campanha “#FiqueDeOlho: para combater a violência, Gênero nos Planos Já!” e materiais sobre a promoção de direitos humanos nas escolas

Ação Educativa na CONAE 2024: confira aqui o que rolou!

Uma educação de qualidade é aquela que consegue incluir, acolher e proteger todas as pessoas. Foi com essa bandeira que a Ação Educativa participou da Conferência Nacional de Educação 2024 (Conae), que ocorreu em Brasília, durante os dias 28 a 30 de janeiro. A Conae teve o objetivo de elaborar o novo Plano Nacional de Educação, principal instrumento da política educacional brasileira, que terá vigência de 2024 a 2034.

Visando garantir igualdade de gênero no novo PNE, a Ação Educativa levou à Conferência a campanha “#FiqueDeOlho: para combater a violência, Gênero nos Planos Já”, que reúne uma série de materiais que buscam ampliar o debate acerca do enfrentamento das desigualdades de gênero e raça, da proteção de estudantes e educadoras/es contra violências e abusos e da valorização da diversidade. A Campanha tem por objetivo garantir igualdade de gênero no novo PNE e para isso reúne uma série de materiais que reafirmam o dever dos governos em implementar políticas públicas e que desmistificam a desinformação sobre a abordagem de gênero, promovidas por movimentos ultraconservadores. A campanha foi idealizada pela Iniciativa De Olho nos Planos e pelo projeto Gênero e Educação.

“Leis que visavam proibir a abordagem de gênero foram consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020. Na época, o Supremo concluiu que é dever dos governos garantir a educação para a igualdade de gênero nas escolas, mas o efeito de perseguição e autocensura continua sendo sentido. Censurar o debate é acirrar ainda mais a violência, o preconceito, a segregação, o racismo, o sexismo e a LGBTQIAP+fobia.

Acesse a cartilha da campanha

O que rolou na CONAE 2024?

Concluída na última quarta-feira (30), a CONAE aprovou seu texto final, que será a referência para o projeto de lei do Plano Nacional de Educação de 2024 a 2034. O documento propõe a revogação do Novo Ensino Médio e da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o fim do modelo de escolas cívico-militares e a adoção de metas para a igualdade de gênero e raça no PNE.

Em estande compartilhado com a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e o CEERT, a Ação Educativa disseminou materiais, dialogou com estudantes, professores e entidades da sociedade civil, convidando o público também para responder uma enquete sobre o fenômeno da censura e perseguição contra docentes e estudantes que desenvolvem projetos para combater o racismo, o sexismo e a LGBT+fobia nas escolas. 

Segundo Claudia Bandeira, assessora da área de educação da Ação Educativa e da iniciativa De Olho nos Planos, combater o racismo, sexismo e a LGBTfobia está integralmente ligado ao fortalecimento da democracia no país e nas escolas. “A qualidade na educação está diretamente relacionada com a participação de populações historicamente excluídas dos processos de construção das políticas públicas educacionais garantindo que o direito a uma escola pública de qualidade e o acesso às universidades públicas sejam para toda a população brasileira, sem exclusão e discriminação” afirma.

Ver mais: Os desafios para efetivar gestão democrática em conferências de educação no Brasil– via De Olho nos Planos

Durante a CONAE, a Ação Educativa, além de contribuir para garantir no Documento Referência da Conferência agendas como igualdade de gênero e raça, revogação do NEM, a autoavaliação participativa da escola articulada ao SINAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) e a garantia da EJA em prisões; aprovou junto com a Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação 4 moções: 1) a importância de combater a educação domiciliar; 2) a desmilitarização da educação; 3) por uma política de promoção da igualdade de gênero, raça e diversidade sexual na educação e; 4) a garantia da participação da sociedade civil e movimentos sociais como segmento na próxima CONAE desde a etapa municipal. 

Em paralelo a CONAE, a equipe de comunicação da campanha “#FiqueDeOlho: Gênero nos Planos Já” registrou e entrevistou pessoas durante a 1ª Marsha Trans Brasil, que acontecia em frente ao planalto do Congresso Nacional no dia 29 de janeiro, data que comemora o Dia Nacional da Visibilidade Trans.

O evento da Marsha celebrou o marco dos 20 anos da visibilidade Trans no país e veio para reafirmar a luta histórica da população trans e travesti por garantia de direitos e de políticas públicas que acolham e protejam toda a comunidade.

Materiais de referência buscam ampliar o debate

Na página da campanha, estão disponíveis cartilhas e publicações, como  o guia “Por que discutir gênero nas escolas” e duas edições da coleção Indicadores de Qualidade na Educação, voltadas para discutir o ensino médio e as relações raciais na escola. 

O Guia sobre gênero é resultado do processo formativo de jovens realizado pela Ação Educativa e é voltado para o ensino médio. Ao trabalhar a partir de experiências e situações sexistas e racistas no cotidiano escolar, o guia aponta caminhos para combater violências e ampliar o acolhimento e a autoestima de estudantes. O material reafirma o dever da escola no combate às desigualdades e o seu papel em fortalecer o desenvolvimento crítico de estudantes.

Realizada com apoio da Unicef, a coleção Indicadores de Qualidade na Educação é composta por materiais que apresentam uma metodologia de autoavaliação participativa a partir de um conjunto de indicadores educacionais qualitativos. Cada edição possui uma metodologia voltada para o contexto de cada etapa de ensino, demonstrando como o envolvimento de toda uma comunidade escolar pode contribuir em processos que visam a melhoria da qualidade da educação.Na página da campanha, que já conta com mais de 1,7 mil acessos, é possível acessar outros materiais, que abordam uma perspectiva de defesa da democracia, dos direitos humanos e do fortalecimento da escola como espaço de acolhimento e cidadania. Para saber mais, acesse a página


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Igualdade de gênero nos planos de educação: uma tarefa urgente

As agendas de “gênero” e “raça” devem se articular a todos os Eixos do Documento Referência da CONAE, como: financiamento, gestão democrática, valorização profissional e qualidade na educação.

Igualdade de gênero nos planos de educação: uma tarefa urgente

A educação e a sociedade brasileira sentiram os efeitos, na última década, da retirada do “gênero” no texto do atual Plano Nacional de Educação (PNE). A exclusão dessa garantia no mais importante documento de planejamento educacional do país ajudou a fomentar um clima de censura e perseguição nas escolas, impactando discussões sobre gênero, raça e outras formas de discriminação junto às comunidades escolares. Às vésperas da tramitação do novo PNE e da Conferência Nacional de Educação (CONAE), onde será construída uma proposta para o novo Plano,  a sociedade civil agora age para garantir um PNE sem retrocessos, com ousadia e que reafirme o direito de profissionais da educação e estudantes discutirem gênero, raça e sexualidade na escola. 

Nesse contexto, a Ação Educativa lançou a campanha #FiqueDeOlho: para combater a violência, gênero nos Planos já!, reforçando que garantir igualdade de gênero nos Planos é se comprometer com a melhoria da qualidade na educação, já que educação de qualidade é a que consegue incluir e acolher todas as pessoas. É preciso criar espaços de acolhimento e solidariedade nas escolas; prevenir e combater o assédio, abuso sexual e violência doméstica; discutir as desigualdades entre homens e mulheres; promover o direito das pessoas viverem livremente sua sexualidade, entre outras ações. Esses são alguns aspectos que a equipe, por meio da Campanha, tem discutido no processo da CONAE, inclusive com escuta e encaminhamento de demandas de jovens a partir de uma Conferência Livre realizada na Ação Educativa durante a etapa municipal de São Paulo.   

A incorporação da igualdade de Gênero nos Planos para que o novo PNE avance no combate à violência e na redução das desigualdades educacionais significa, entre outras ações: 

  • Incorporar a laicidade na educação pública como princípio do PNE e incluir no texto o enfrentamento às desigualdades e discriminações de gênero, raça e sexualidade. 
  • Defender a implementação da LDB alterada pelas Leis nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008 como instrumento essencial para a construção de uma educação antirracista. 
  • Garantir a manutenção de escolas quilombolas e indígenas em seus territórios. 
  • Defender as políticas de ações afirmativas com recorte racial e social nas instituições de educação superior. 
  • Atuar por um financiamento adequado com distribuição equitativa dos recursos em diálogo com uma política econômica de redistribuição de renda e com as Leis Orçamentárias (LDO e LOA). 
  • Aprimorar na regulamentação do FUNDEB os Fatores de Ponderação para que correspondam ao custo real das diferentes etapas e modalidades da educação básica e possam ser utilizados como mecanismos de ação afirmativa racial e social. 
  • Democratizar o debate econômico nas unidades educacionais, comunidades escolares e territórios, promovendo a compreensão da relação da economia com o cotidiano das escolas e da população.
  • Aprimorar os mecanismos de gestão democrática e controle social do PNE e das políticas educacionais, ampliando a roda e a participação efetiva das comunidades escolares e das juventudes na construção e monitoramento das políticas educacionais. 

Sobre esses aspectos e sua incorporação no PNE, nos planos estaduais e municipais e no planejamento educacional, conversamos com algumas pessoas de referência nas diferentes áreas. Confira: 

Financiamento

Eduardo Januário, Professor na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP), atuando na linha de pesquisa de Políticas Públicas, Financiamento Educacional e Gestão Democrática da Escola Pública, com ênfase nas escolas de periferias. 

Ação Educativa: Como o financiamento do PNE pode ser adequado para diminuir as desigualdades educacionais, especialmente das populações negras?

Eduardo Januário: A única possibilidade de diminuir a desigualdade racial é com investimento. Não conseguimos atingir a meta 20, que é assegurar 10% do PIB para educação. Então claro que sem dinheiro não dá para fazer aquilo que está previsto nas metas 3, 4, 8, enfim, metas que visam combater desigualdades entre negros e brancos. Por quê? Porque as escolas necessitam modificar o seu dia a dia, a sua realidade, as estruturas. Isso precisa de dinheiro. Então ficamos na perspectiva de acreditar que vai haver um aprimoramento de mecanismos, mas não há outra saída enquanto a gente não tiver 10% do PIB na educação. 

Ação Educativa:  Especificamente sobre o Fundeb e os fatores de ponderação, as propostas atuais de regulamentação contemplam esse horizonte? Os valores são suficientes para corrigir as distorções históricas?

Eduardo Januário: Quando falamos em mecanismos de distribuição, vamos lembrar que a Emenda Constitucional 59 já pensa nessas questões de tratar os desiguais conforme as suas desigualdades. E quando a gente pensa em educação quilombola, educação do campo, educação indígena, há uma defasagem de investimento. Por que defasagem de investimento? Porque essas escolas não estão, ao meu ver e ao ver do movimento, adaptadas o suficiente, não têm qualidade suficiente (até em termos de formação de professor, de estrutura). Uma pesquisa recente da Faculdade (FEUSP) mostra que inúmeras escolas de educação quilombola e educação indígena não têm livros didáticos para estudar. Então há uma proposta de educação quilombola, de educação indígena, de educação do campo, mas não há estrutura. Então tem que ter dinheiro, não tem jeito. Sobre os mecanismos de ponderação, 1.4 para educação quilombola e indígena eu acho que é o suficiente no sentido de priorizar essas medidas. Mas como fazer sem dinheiro? Tem que ter um montante maior, porque com o montante que temos vamos continuar com políticas que reparam a desigualdade de maneira superficial. Elas não mudam a estrutura da escola, não garantem livros didáticos, não possibilitam formação de professores que estejam levando em consideração outras epistemologias. Conseguimos, pelos fatores de ponderação, levar um pouco mais de dinheiro, mas a gente não consegue ampliar de fato aquilo que precisaria, que é essa estrutura que eu acabo de citar. Uma outra questão é da discussão do VAAR do Fundeb, que o movimento negro tem disputado. Num determinado momento, o VAAR ficou preso à ideia do resultado, mas nossa conversa é que ele deveria ser um dinheiro específico para reparação, não para resultado. A ideia seria que as escolas que estão nas periferias, que têm uma maior quantidade de pessoas negras, as escolas quilombolas, receberiam uma parte desse dinheiro. Assim, é possível impulsionar a leitura de livros, a formação de professores, modificar a escola. Outras perspectivas poderiam ser incluídas na sala de aula se tivéssemos dinheiro específico para isso. 

Gestão democrática e processos participativos

Juliane Cintra, Coordenadora Institucional (Comunicação, Eventos e TI) da Ação Educativa.

Ação Educativa: Como e onde é possível aprimorar os mecanismos de gestão democrática e controle social do PNE e das políticas educacionais, de forma a ampliar a participação efetiva das comunidades escolares e das juventudes na construção e monitoramento das políticas educacionais? 

Juliane Cintra: Há uma dimensão de fortalecer os Fóruns e os Conselhos de Educação, mas também é preciso repensá-los do ponto de vista do quão abertos e preparados estão para receber a diversidade que é constituinte do que são as comunidades escolares e do que são os diferentes grupos que integram o que chamamos de juventude. Esses espaços não são organismos estatais. Na verdade são espaços de abertura, de acolhimento da sociedade, e portanto devem representar e dialogar com a demanda desses grupos e com as suas próprias dinâmicas de funcionamento. Repensá-los metodologicamente é fundamental para assegurar que o descumprimento naturalizado dos planos decenais não seja perpetuado. Então acredito que o foco deveria ser nessas instâncias, mas sobretudo nesse repensar metodologicamente. É importante que a gente olhe para esses espaços também considerando como fundamental que a gente descentralize os processos deliberativos. Os processos decisórios devem ser descentralizados a partir da instância e com uma reformulação metodológica do que compreendemos como participação nessas esferas. Assim, conseguiremos avançar efetivamente para a construção da legitimidade popular e social dos planos de educação, porque é somente a partir da participação social que construímos pertencimento às políticas públicas. É fundamental ir além do nível consultivo. 

Gênero, raça e sexualidade

Suelaine Carneiro, socióloga, mestre em educação, coordenadora de educação e pesquisa de Geledés – Instituto da Mulher Negra e compõe a rede de ativistas do Fundo Malala. 

Ação Educativa: Qual a importância de explicitarmos as agendas de gênero, raça e diversidade sexual no PNE, bem como incorporar a laicidade na educação pública como princípio do PNE e incluir no texto o enfrentamento às desigualdades e discriminações? 

Suelaine Carneiro: Esse PNE tem que não só resgatar a educação com um direito humano, como uma etapa fundamental para a formação da concepção de cidadania, mas retirar o aprender sobre raça e gênero do lugar de “questão menor” na educação. 

Por exemplo, na questão do financiamento: é necessário sempre defender mais recursos para a educação. As escolas mais fragilizadas, com estudantes com mais dificuldades de aprendizado, de conseguir um desempenho razoável em relação a notas e progressão de ensino, essas escolas via de regra têm grande participação de estudantes negras e negros, então é preciso que tenham também um aporte diferenciado no que diz respeito a recursos, a ter um corpo docente completo. É o que temos procurado nesse tempo todo de resistência: pautar gênero e raça em todo o âmbito da educação, dizer que gênero e raça também são questões essenciais na educação – para além daqueles que são considerados “eixos duros” – financiamento, formação de profissionais da educação, livro didático. São temas que possibilitam interferir nos resultados de desempenho, na compreensão, na aprendizagem e principalmente no convívio escolar. Portanto, ter gênero e raça dentro de todos os eixos que forem constituídos no novo PNE é fundamental para que a educação como direito se realize. 

Além disso, temos também o desafio de pensar a laicidade. A Educação hoje está muito contaminada por uma concepção de religiosidade cristã de forma muito fundamentalista que interdita direitos, interdita falar sobre raça, sobre questões raciais, sobre cultura e história afro-brasileira e africana e que reafirma uma concepção de superioridade a partir da cor da pele. Temos que atuar nessas questões de maneira muito explícita, por isso o debate tem que perpassar todos os eixos. Ou seja, são muitos desafios e são esses os compromissos que devem estar em discussão durante o novo PNE. O ano de 2024 será decisivo para podermos recuperar a Educação depois de tantos anos de desmonte.

Combate ao racismo

Catarina de Almeida Santos, professora na Faculdade de Educação da UnB, do comitê da Campanha Nacional pelo Direito à Educação do DF. 

Ação Educativa: Como podemos, na formulação do novo PNE, reafirmar e defender a implementação da LDB alterada pelas Leis nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008 como instrumento essencial para a construção de uma educação antirracista? 

Catarina de Almeida Santos: Fazer com que esse país conheça e respeite a cultura afro-brasileira, africana e indígena não é algo que dê pra fazer com um ou outro programa, é preciso que seja uma ação sistêmica na escola, da educação infantil à pós graduação e isso significa passar pela formação inicial e continuada dos nossos professores e professoras, dos processos de gestão. Precisa estar presente em todas as metas e estratégias do PNE como ação sistêmica nos programas implementados, nas políticas desenhadas para o alcance dessas metas e objetivos. Do contrário, a gente não vai fazer funcionar. Se a cultura, história e força dos povos originários e dos povos que vieram pra cá escravizados não estiverem em cada uma das ações que desenvolvermos, a gente não reverte essa situação e não vamos conseguir fazer uma escola antirracista. 

São precisos mecanismos políticos, jurídicos e legais que permitam que as escolas e suas professoras e professores não sejam punidos por trabalharem essas questões, que isso esteja na literatura, no livro didático, na história das diferentes áreas do conhecimento. Mas também precisamos ter mecanismos de proteção pra reverter a demonização que se faz da cultura desses grupos. Isso significa metas e estratégias no PNE voltadas para o combate à intolerância religiosa e a todas as formas de violência. Isso também vale para questões de gênero, homolesbotransfobia, capacitismo, todos os elementos que são marcadores de diversidade nos corpos que compõem as diferenças nesse país. 

Ação Educativa: Qual a importância de garantir a manutenção de escolas quilombolas e indígenas em seus territórios? 

Manter as escolas quilombolas e indígenas em seus territórios não é questão de ser importante, é uma questão de sobrevivência. É uma questão de direito essencial, fundamental à manutenção dessas escolas. Pela sua existência, pela sua identidade, porque é direito desses grupos. Ou de sobrevivência da sociedade brasileira,  se um dia ela se quer civilizada, capaz de fazer as pazes com a sua história. A sobrevivência da população negra dependeu da sua organização em Quilombos, e até hoje os aquilombamentos são fundamentais para a nossa sobrevivência. Se não os aquilombamentos na perspectiva territorial, os aquilombamentos de nós enquanto povo preto, enquanto cultura. É de fundamental sobrevivência para nossa vida física e para nossa existência histórica e cultural. E isso serve também para os povos indígenas, que eram os povos originários desse país e que foram dizimados. A sobrevivência dessa cultura depende de nós mantermos as escolas nos territórios, e não a partir da lógica brancocêntrica e eurocêntrica, mas a partir da lógica dos povos dos territórios. Quem vai transmitir essa cultura e quem vai ensinar esses saberes senão aqueles que são detentores dos saberes tradicionais?

Supressão do termo “gênero” no atual PNE fomentou censura e perseguição nas escolas

Compreendidas como centrais para promover a democracia, as agendas de gênero, raça e sexualidade devem constar no novo PNE como forma de combater a violência

Dez anos atrás, na fase final da tramitação do atual Plano Nacional de Educação (PNE), uma alteração causou espanto e indignação: todas as menções a “gênero” foram suprimidas do texto. A exclusão do termo, capitaneada por setores conservadores, alterou um texto que vinha sendo construído há anos, com intensa participação social e através de diversas conferências de educação. Esse movimento impactou as discussões escolares nos anos seguintes sobre gênero, raça e outras formas de discriminação. Foram anos até o Judiciário reassegurar a legitimidade de tais debates no ambiente escolar, período em que docentes sofreram perseguições e viram suas condições de trabalho declinarem. 

Às vésperas da tramitação do novo Plano Nacional de Educação, a sociedade civil agora age para garantir um PNE sem retrocessos, com ousadia e que reafirme o direito de profissionais da educação e estudantes discutirem  gênero, raça e sexualidade na escola. 

Supressão do “gênero”: expressão de um movimento em curso 

O texto que chegou à Câmara em 2014 expressava, em seu art. 2º, inciso III, que o PNE tinha como diretriz “a superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual”. A disputa legislativa sobre a explicitação dessas agendas, especialmente de gênero e diversidade sexual, foi longa e intensa, e no fim prevaleceu uma versão do texto que retirava essas ênfases. Entre os principais opositores do “gênero” (e de uma suposta “ideologia de gênero”) estavam grupos católicos, evangélicos e formações seculares como o Movimento Escola sem Partido. 

“Estávamos conscientes do contexto extremamente adverso, marcado pelo crescimento da força política de setores fundamentalistas religiosos como parte do fenômeno de renovação de extrema-direita. Vínhamos enfrentando o avanço desse movimento na educação desde 2009, mas a maioria de nós não esperava a derrota naquela última etapa da tramitação, que revelou uma grande capacidade de articulação desses setores”, relembra Denise Carreira, professora da Faculdade de Educação da USP, fundadora da Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação e uma das lideranças do campo educacional que defendia a inclusão das agendas de gênero, raça e diversidade sexual.  “Vínhamos do processo das Conferências Nacionais de Educação que trouxeram proposições muito assertivas na perspectiva de fortalecimento de uma política educacional comprometida com essas agendas. Num primeiro momento, a derrota foi um baque. Depois compreendemos que a abrangência dessa derrota não era tão grande assim como a extrema-direita queria fazer entender”, avalia. 

A lei que entrou em vigor expressa apenas a necessidade da “erradicação de todas as formas de discriminação”. Um “conteúdo genérico, suficientemente inclusivo”, nas palavras dos pesquisadores Salomão Ximenes, Fernanda Vick e Márcio Alan Menezes Moreira em capítulo do livro GÊNERO E EDUCAÇÃO: ofensivas reacionárias, resistências democráticas e anúncios pelo direito humano à educação. Salomão, no entanto, enfatiza que isso não significa que a mudança foi banal. Comparando as versões que circularam na Câmara e no Senado, ele ressalta que, além da retirada da menção a discriminações específicas, houve também alteração no inciso 5o. O texto aprovado diz ser uma diretriz do PNE a “formação para o trabalho e para a cidadania, com ênfase nos valores morais e éticos em que se fundamenta a sociedade”. Segundo o professor de Direito e Políticas Educacionais da UFABC, essa redação contém “uma afirmação de que a sociedade se fundamenta em uma única moral pública, o que é uma visão típica do conservadorismo,. A visão democrática presente na Constituição Federal na verdade afirma que a sociedade é baseada em uma pluralidade de concepções que devem conviver e que são igualmente aceitáveis desde que não violem direitos humanos”, completa.

Por outro lado, como lembra Salomão, a supressão do “gênero” e da diversidade sexual no PNE não eliminou o dever do Estado de atuar ativamente contra essas discriminações e desigualdades, já previstas em outras normativas. E nem proibiu a abordagem desses temas, como foi propagado pelos setores conservadores. “A supressão a essas menções no PNE é parte de uma estratégia mais ampla de ataque ao caráter público da educação, às conquistas recentes dos movimentos feministas, negros, LGBT+. Ela só pode ser lida como reação ao processo de democratização da educação, como o ponto mais visível da estratégia que era desenvolvida naquele momento mas que ganhou muito mais destaque nos anos seguintes”, defende. 

Na mesma linha, Sonia Corrêa e Marco Aurélio Máximo Prado enfatizam, no livro Gênero e Educação, que a educação foi o primeiro alvo robusto das “cruzadas antigênero” que permeariam vários outros setores da sociedade brasileira – e que ocorreram simultaneamente em outros países. No Brasil foram mais de cem projetos de lei proibindo “gênero e/ou ideologia na educação” desde a disputa no PNE.

Saiba mais sobre as ofensivas antigênero na educação no livro GÊNERO E EDUCAÇÃO: ofensivas reacionárias, resistências democráticas e anúncios pelo direito humano à educação”. O download é gratuito. 

Impactos da exclusão do “gênero” no PNE: variação regional e debates ameaçados

O fato do Plano Nacional de Educação não mencionar várias discriminações de forma explícita deu brecha para que planos estaduais e municipais de educação aprovados nos anos seguintes também não o fizessem. Apesar disso,  a maior parte das unidades federativas ainda assegurou (em níveis diferentes) o combate a essas discriminações e a abordagem desses temas. Segundo levantamento de Claudia Vianna e Alexandre Bortolini, docentes da USP, mais da metade dos 25 planos estaduais aprovados no país inseriu questões relativas à agenda das mulheres sob uma perspectiva de gênero e quase um terço expressam clareza de que a garantia de acesso e permanência com qualidade passa pelo enfrentamento das desigualdades de gênero. No entanto, vários planos refletem o avanço de pautas conservadoras com a exclusão do gênero, corte ou limitação da agenda LGBT+ e inserção de itens que submetem a abordagem destes temas à concordância das famílias. O exemplo mais extremo é o plano do Ceará, que “impede, sob quaisquer pretextos, a utilização de ideologia de gênero na educação estadual”. 

Planos Estaduais de Educação e “gênero”

Veto explícito
: CearáOmissão (“gênero” e qualquer termo relacionado): Goiás, Pernambuco, São Paulo Incorporação parcial (com referências aos direitos humanos, à garantia de alguns direitos das mulheres e à cultura da paz, mas de forma restrita, por vezes reiterando perspectivas binárias, por vezes evocando a precedência da família sobre a escola. Sem qualquer menção a demandas LGBT+): Amapá, Acre, Alagoas, Espírito Santo, Distrito Federal, Paraíba, Piauí, Paraná, Rio Grande do Norte, Rondônia, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe, TocantinsExplicitação de questões de gênero e sexualidade (tanto no que diz respeito à superação de desigualdades e promoção dos direitos das mulheres, quanto no reconhecimento, proteção e promoção de direitos das pessoas LGBT+): Amazonas, Bahia, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Roraima. 
Fonte: artigo “Discurso antigênero e agendas feministas e LGBT nos planos estaduais de educação: tensões e disputas”, disponível em:  https://www.revistas.usp.br/ep/article/view/187136/172900

Na falta de diretriz nacional e em um contexto de crescente conservadorismo e guerra ao “gênero”, muitos municípios também tentaram, em seus planos locais de educação, reproduzir o veto. Essas decisões – muitas acompanhadas de perto pela Iniciativa De Olho nos Planos, como as dos municípios de Cascavel/PR, Ipatinga/MG, Foz do Iguaçu/PR, Nova Gama/GO, Farroupilha/RS, Ipê/RS, Teresina/PI, Recife/PE, Palmas/TO, Santa Bárbara d’Oeste/SP, Viçosa/MG, Varginha/MG, Paranaguá/PR e Mossoró/RN – começaram a ser derrotadas em 2020, quando diversas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) reforçaram que a proibição da abordagem de “gênero” é inconstitucional e que na verdade é um dever do Estado trabalhar para combater todas as discriminações e para reforçar a cultura de paz e a igualdade. Essas decisões só chegaram ao STF após uma grande articulação de entidades da sociedade civil comprometidas com uma educação que combata as discriminações. 

Mas a exclusão do “gênero” no PNE teve efeitos no cotidiano escolar também por ter sido instrumentalizada pelos setores conservadores. Como elenca Denise Carreira, professora da Faculdade de Educação da USP, a derrota foi utilizada “na estratégia de desinformação em massa da população, de estímulo à perseguição sistemática de professoras, estudantes e ativistas e foi base de proposições de projetos de leis antigênero municipais; além dos ataques à agenda de gênero e raça nos planos municipais e estaduais de educação”. 

Cássia Souza, pedagoga que atua nos municípios de Recife e Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, sentiu isso na pele. Coordenadora de programas do Centro das Mulheres do Cabo (CMC) e parte da rede de ativistas do Fundo Malala, ela não esquece que a derrota legislativa fomentou uma cultura de censura e perseguição: “Na época, eu realizava um projeto sobre direitos sexuais e reprodutivos das meninas, e a retirada deu margem para o fundamentalismo nos proibir de falar de gênero na escola. Sofremos muita repressão, saímos até no jornal local, com uma vereadora dizendo que estimulávamos as adolescentes a fazer sexo”, relembra. Foram necessárias formações com a comunidade escolar para continuar com o projeto, e relembrar a necessidade de discutir abuso e exploração sexual foi chave para prosseguir com o trabalho. “Não podíamos usar a palavra “gênero” para não perder aquele espaço, mas ainda conseguíamos trabalhar na sala de aula, éramos como ‘agentes secretas do gênero”, brinca. 

Em ambos os municípios, as discussões sobre gênero não estavam contempladas nos Planos Municipais de Educação, e em Cabo de Santo Agostinho uma portaria chegou a ser publicada prevendo sanções administrativas a docentes que trabalhassem o tema “gênero” nas escolas. Ou seja, houve uma criminalização da agenda. “Nós dávamos aula com medo de dar aula”, resume Cássia. Por isso, reforça ela, a inclusão dos temas nos Planos teria dado mais segurança para o trabalho do dia a dia, apesar de não significar uma mudança imediata de cultura. “Não tenho essa ilusão, mas garantir gênero na lei faz com que a gente não seja criminalizado por trabalhá-lo na escola, além de definir as formas de trabalhar com o tema”. 

É hora de fazer diferente 

Para que essa situação não se repita, é preciso garantir que o próximo PNE – e os planos estaduais e municipais – contemplem as agendas de gênero, raça e diversidade sexual. Nesse contexto, a Ação Educativa lançou a campanha #FiqueDeOlho: para combater a violência, gênero nos Planos já!. Com materiais físicos e digitais, a campanha reforça que garantir igualdade de gênero nos Planos é se comprometer com a melhoria da qualidade na educação, já que educação de qualidade é a que consegue incluir e acolher todas as pessoas. 

E garantir igualdade de gênero é mais do que apenas adicionar uma palavra a um texto: é também uma forma de criar espaços de acolhimento e solidariedade nas escolas; de prevenir e combater o assédio, abuso sexual e violência doméstica; de discutir as desigualdades entre homens e mulheres; promover o direito das pessoas viverem livremente sua sexualidade, entre outros. 

“A campanha parte do entendimento de que as agendas de gênero e raça promovem o pertencimento nas escolas, a proteção, a gestão democrática”, resume Marcelle Matias, educomunicadora e assistente da área de educação da Ação Educativa. Um dos focos da campanha é pautar a igualdade de gênero nas Conferências de Educação – que são parte da construção do novo PNE -, e outro foco é a mobilização juvenil que reuniu jovens em uma Conferência Livre na Ação Educativa como parte da CONAEE. “Jovens estudantes têm puxado essa agenda. Então a campanha também reforça o papel da juventude enquanto uma juventude ativista, que tem discutido gênero na escola de diferentes formas e que tem pouco a pouco ressignificado seu papel no espaço escolar”, reforça Marcelle. 

Assegurar essas agendas nos planos de educação, no entanto, vai ser um desafio, já que o ultraconservadorismo segue forte no Congresso e fora dele. “Precisamos envolver toda a sociedade para fazer pressão no Senado e na Câmara, como fizemos na votação do Fundeb”, opina Cássia Souza, pedagoga e cientista social. “Em 2013, eles conseguiram convencer a população e fazer a pressão social para vetar o gênero, agora temos que ser nós”, defende ela. 

Salomão Ximenes e Denise Carreira concordam que, passados anos de investidas ultraconservadoras e liberais na educação e na sociedade, o contexto atual é mais desafiador. Para Denise Carreira, professora da faculdade de Educação da USP, a composição do atual Congresso exige muita cautela para que o novo PNE não seja minimizado em suas metas e estratégias e ocupado por demandas de setores ultraconservadores e privatistas. “Temos que ficar vigilantes e articulados, participando ativamente do processo da Conferência Extraordinária Nacional de Educação, convocada pelo Fórum Nacional de Educação”. Ela, que frisa que mesmo nos contextos adversos surgiram muitas iniciativas positivas, reforça a urgência das agendas de gênero, raça e diversidade sexual pararem de ser vistas como “identitárias”. “É urgente que sejam compreendidas como eixos estruturais das desigualdades, sempre em articulação com renda, e centrais para a sustentação da democracia”, diz. 

Na mesma linha, Salomão Ximenes, professor de Direito e Políticas Educacionais da UFABC, também alerta para o perigo do apagamento das agendas antidiscriminatórias. Em sua análise, uma forma de proteger docentes contra tentativas de censura, especialmente após anos de incursões antidemocráticas, é inserir essas agendas nos currículos. “Conseguir reconstruir essa agenda hoje significa respaldar o trabalho com direitos humanos nas escolas”, diz. “É importante lembrar que pela legislação nacional e internacional a educação tem um objetivo, que é promover a democracia e o respeito entre as pessoas, combater o racismo e as discriminações. Precisamos de mais respaldo institucional para poder trazer temáticas que são obrigação das escolas”, completa.

Confira o resultado do Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica 2023

Hoje, 23 de outubro, às 19h, realizaremos uma transmissão ao vivo para homenagear as 10 propostas que se destacaram por sua criatividade e compromisso.

É com grande prazer que compartilhamos os resultados da terceira edição do Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica, que ocorreu de março a maio deste ano. Recebemos um total de 125 propostas, demonstrando o forte interesse em promover a igualdade de gênero na educação.

O Comitê de Seleção, composto por uma equipe de profissionais e pesquisadores em gênero, raça e sexualidade na educação básica, analisou criteriosamente todas as propostas e selecionou as 10 que se destacaram por sua criatividade e compromisso.

Hoje, 23 de outubro, às 19h, realizaremos uma transmissão ao vivo para homenagear esses projetos. Você pode conferir a lista de selecionados e participar da cerimônia de reconhecimento para conhecer as autorias das 10 propostas mais criativas acessando o link da transmissão ao vivo no YouTube da Ação Educativa (clique aqui).

Lista de resultado: Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica 2023

AUTORAS E AUTORESTÍTULO DA PROPOSTA
Agda Priscila da Silva, Alinne França Barros, Ana Gleysce Moura Brito, Árison Rodrigo de Brito, César Augusto Soares da Silva, Deysiane Ariele Nunes de Oliveira, Fernanda de Melo Beltrão, Jaime Cauã Lauriano de Lima, José Anderson Bezerra do Nascimento, Laís de Souza Lira, Lara Lemos Raulino de Souza, Letícia Franco Lemos dos Santos, Letícia Maria Oliveira Advíncula, Li Neves da Silva, Luis Philipe Machado, Luma Sabar Gomes Lins Santos de Barros, Maria Cecília de Oliveira Pacheco, Maria Júlia da Silva Pinto, Maria Júlia de Alcântara Martins, Maria Júlia Nunes Dantas, Maria Karolyne da Rocha Ferreira e Saulo José de Sena Silva.Expo fotos de negros comuns: o cotidiano d@s trabalhadores negros em Natal-RN
Aloísio Sousa Castro Junior e Luís Fellipe da Fonseca Lima SoaresRAÍZES AFROANCESTRAIS
Alexandra Eugênia Araújo, Regina Célia do Couto e Katharina Jahmile Rodrigues AraújoReescrevendo contos de fada: Preta de Ébano e Branca de Neve
Ana Maria Rivera FellnerEntre Algumas Outras Tecnologias
Ana Paula Rocha de AzevedoCultura afro-brasileira e indígena na Educação Infantil
Antônio Barros de Aguiar

Vamos ao Cinema? O Cinema Negro como recurso didático e conhecimento histórico
Cláudia NaoumClube das Cartas Secretas
Cláudia Santos PereiraFutsal feminino, gênero e espaço de fala: Desmistificando mitos
Débora Lopes Alves DuarteAs mulheres negras na história do Brasil
Déborah Goulart Silveira, Rafael da Silva Cezar e Monica MeloSete Mulheres
Eliana Cristo de OliveiraVozes da África – uma experiência literária, gastronômica e sensorial
Elisângela Cristina Siqueira de MeloSenhoras, sagradas, co(n)sa(n)gradas!
Elizangila Sousa de JesusWakanda para sempre
Emanuelle Souza Pacheco, Marcela Bianca Guedes Lopes, Júlia Souza e João Vitor FrutuosoNarrativas dos povos originários sobre a Terra e o tempo
Francisca Valeria Silva de Almeida, Ana Célia Pereira Damasceno de Macedo e Francigelda RibeiroVersos empenhados contra a violência a mulher
Gabriel Santinelli Felipe Godoy e Nickolas Spinelli KleinEnsino por narrativas: diversidade sexual e de gênero
Helen Regina Fernandes NascimentoConhecendo minha identidade africana
Juliana Kummer Perinazzo FerreiraVida Maria: Marias e suas vidas.
Larissa ScottaPor uma educação antirracista: discutindo o racismo linguístico
Laina Caroline dos Santos Sousa, Maria Rosane Costa Torres e Luciano Ribeiro Ferreira GarciaUma experiência interdisciplinar para o ensino da cultura africana
Marília Farias XavierOficinas de Autonomia Leitora e Relações Étnico-raciais da Pedagopreta.
Marileide Silva França e Carla Santos PinheiroHistórias do meu lugar: Trajetórias de mulheres que inspiram a nunca parar
Maria Claudia GorgesEntre algumas outras tecnologias
Rodrigo Chandohá da Cruz e Cintia Metzner de Sousa


Trabalhando a Transexualidade e a Não-Binariedade usando a Literatura Infantil.
Rosana de Souza Pereira CarvalhoA Escola de samba visita à escola formal
Samara da Rosa CostaÁfrica em nós: Práticas de alfabetização e letramento racial
Suemys Luize Pansani TavaresDescoloniza aí, EREMI!

Indicados ao Reconhecimento Público:

AUTORES E AUTORASTÍTULO DA PROPOSTA
Aldenora Resende dos Santos Neta, Ana Carolina Abrao Neri, Antonio Higor Gusmao dos Santos, Carolina da Silva Portela, Camila Fernanda Pena Pereira, Emanuele da Silva Freire, Joice Fernanda Pinheiro, Maria Jandira de Andrade, Odla Cristianne Patriota Albuquerque, Saulo Barros da Costa, Patricia Fortes de AlmeidaÚrsula em Quadrinhos: Protagonismos femininos e enfrentamentos no século XIX
Ana Lúcia Nunes de Sousa, Aline Silva Dejosi Nery, Luciana Ferrari Espíndola Cabral, Mariana da Silva LimaMulheres Negras Fazendo Ciência
Ana Caroline Gonçalves, Amanda Sales Santos, Ana Clara Fernandes Nascimento, Ruan Coutinho Rodrigues, Eliana Cristo de OliveiraClube de Leitura Black Girls
Cláudio Emanuel Dos Santos, Cláudio Vinícius Maia de Melo, Henrique da Silva Barbosa
Grafite e as artes desintegradas
Deysiene Cruz SilvaCART(a)GRAFIAS INTERGERACIONAIS: sexismo e racismo nas escolas.
Fernando Augusto do NascimentoTeatro, leitura e literaturas interseccionais
Gabriel Santinelli Felipe Godoy, Maíra Mello Rezende Valle
Sistemas Reprodutores: uma perspectiva antirracista e de combate à LGBTQIAfobia
Glauberto da Silva Quirino, Mariana de Oliveira Duarte
Relações de Gênero nas aulas de Educação Física
Hemily Pastanas Marinho, Luiz de Oliveira AulerianoClube de Leitura Ikiratsen Waina Kokama (Clube de Leitura Criança Mulher Kokama)
Hilson Santos OlegarioOs Estudos de Gêneros e de Sexualidades no combate ao racismo e a intolerância

Edital 2023 contará com uma segunda lista de aprovados em dezembro

Algumas propostas estão em processo de avaliação devido à necessidade de informações adicionais para sua aprovação final. As pessoas proponentes serão contatadas pela equipe de Gênero e Educação para obter os pareceres necessários e tornar as propostas mais completas e compreensíveis. Mais atualizações via e-mail.

Quando as propostas ficam disponíveis no banco de planos?

Após passarem por um processo de revisão, todas as propostas aprovadas – da primeira lista e, também, da segunda – ficarão disponíveis no banco de planos do site Gênero e Educação até dezembro de 2023. A equipe do Projeto Gênero e Educação entrará em contato com cada proponente para enviar devolutivas e as avaliações feitas sobre as propostas.

Dúvidas e informações: generoeeducacao@acaoeducativa.org.br

Como escolas podem conversar com famílias sobre gênero e sexualidade

Aproximar famílias do cotidiano escolar é um dos caminhos para ampliar a gestão democrática e o trabalho coletivo para a garantia dos direitos de estudantes

Como escolas podem conversar com famílias sobre gênero e sexualidade

Abordar questões de identidade, gênero e sexualidade é um dever das escolas e um direito dos estudantes, porque seu desenvolvimento integral e a convivência democrática e respeitosa em sociedade dependem disso. No entanto, um dos principais desafios é aproximar as famílias do fazer pedagógico para que elas participem e conheçam do que se trata esse trabalho.

“Não é pedir permissão, mas convidar as famílias a estarem mais presentes, porque elas são fundamentais para o cotidiano escolar e para concretizar uma gestão democrática. Além disso, elas têm um papel complementar ao da escola no desenvolvimento das crianças, adolescentes e jovens. É preciso que elas trabalhem juntas”, afirma Bárbara Lopes, coordenadora do projeto Gênero e Educação da Ação Educativa.

Nessa jornada, os conflitos vão aparecer e eles, em si mesmos, não são um problema, desde que não escalem para ameaças e agressividade. “O conflito faz parte da nossa convivência e da democracia e pode ser muito pedagógico”, explica Bárbara.

Educação em sexualidade 

Ao aproximar as famílias do trabalho que a escola desenvolve em torno destas questões, é possível desfazer mal entendidos e a desinformação. Assim, elas têm a oportunidade de compreender por que se trata de um direito humano que contribui para o desenvolvimento integral de todos.

“A educação em sexualidade ajuda a combater violências e a prevenir a gravidez não planejada e as ISTs. Mais do que isso, traz informações seguras sobre a puberdade e as adolescências, em meio a determinados contextos culturais e sociais. Também é sobre entender e respeitar os direitos e as identidades dos outros, a nossa diversidade humana”, diz a psicóloga Cristiane Narciso, que coordena os programas de Juventude, Sexualidade e Gênero da Fundação Gol de Letra.

Esse trabalho também é fundamental para promover um ambiente escolar seguro, acolhedor e inclusivo para toda a população LGBTQIAP+, que não a exclua das salas de aula e não viole seu direito à Educação. “A educação antirracista e a equidade social também sempre precisam fazer parte destas pautas de forma interseccional”, destaca Cristiane.

Confira algumas orientações das especialistas para abordar os temas de identidades, gênero e sexualidade, que podem ser adaptadas de acordo com a demanda de cada comunidade escolar e território:

Estreite as relações

Nos últimos anos, abordar identidade, gênero e sexualidade nas escolas se tornou alvo de controvérsias e motivo de perseguição a educadoras e escolas. O Manual de Defesa Contra a Censura nas Escolas apresenta orientações jurídicas e estratégias político-pedagógicas em defesa da liberdade de aprender e de ensinar, baseadas em leis nacionais e internacionais que garantem esse direito às escolas e aos estudantes. 

Superar esse ponto sensível é o primeiro desafio. “O movimento ultraconservador corroeu os vínculos e criou desconfiança entre famílias e educadores. Por isso, precisamos construir laços permanentes e contínuos com as famílias, não só quando aparecem situações potencialmente mais conflitivas”, afirma Bárbara. 

A questão religiosa também pode exercer resistência aos temas, o que demanda acolhimento e escuta dos educadores para que as famílias não se afastem. “É uma paciência pedagógica para tentar aproximar as pessoas sem abrir mão do que diz respeito aos direitos humanos básicos”, sintetiza Bárbara.

Mobilize o território

Além da escola e da família, a educação também é responsabilidade de toda a sociedade. Dessa forma, pode ser interessante mapear centros culturais, unidades de Saúde e outros setores que possam fortalecer o trabalho da escola e ampliar o diálogo com as famílias. “Também vale contar com as famílias que são mais abertas e engajadas e podem ajudar a aproximar outras”, indica Bárbara. 

Planeje um formato atrativo

A forma de apresentar os temas de identidade, gênero e sexualidade para as famílias importa tanto quanto mobilizar metodologias mais ativas com os estudantes. Dessa forma, as especialistas recomendam fugir do formato tradicional de reunião.

“Propor um dia da família, com oficinas e rodas de conversa, em agrupamentos variados, em um ambiente diferente, que favoreça a conversa entre todos, até atividades lúdicas e corporais, aproxima mais e mostra como funcionam as atividades na prática com os estudantes, tirando medos e preconceitos em torno disso”, recomenda Cristiane.

Explique por que também é papel da escola abordar estes temas

Famílias e escolas têm responsabilidades complementares. É papel das escolas garantir o acesso a informações seguras e atuais a tudo que diz respeito ao desenvolvimento dos estudantes e dos temas em pauta na sociedade. 

“A família não pode impor o que o estudante deve ou não ter acesso, porque ele não é propriedade da família e tem direito a acessar todo o conhecimento humano e informações presentes no mundo”, diz Bárbara. 

Nesse sentido, a popularização do acesso à internet cada vez mais cedo já é uma fonte de informações – e desinformações – para as curiosidades das crianças e adolescentes. Escola e família podem, portanto, ser aliadas. “A escola pode ajudar os estudantes a terem uma postura crítica diante de conteúdos que não têm base científica e são violentos”, pontua Bárbara.

A pesquisa Educação, Valores e Direitos, realizada pela Ação Educativa, também mostrou que as famílias se sentem pouco à vontade para abordar esse tema com as crianças e adolescentes. “As famílias reconhecem que têm alguns pontos que não vão conseguir dar conta”, relata Bárbara.

Se for o caso, pode ser interessante apresentar registros em vídeo e foto do que foi trabalhado com os estudantes e até relatos das crianças e adolescentes sobre o que acharam das atividades e o que aprenderam. Se as atividades ainda não tiveram início, é o caso de compartilhar o planejamento da escola e abri-lo para intervenções das famílias, como pede a gestão democrática.

Cuide da linguagem

O debate precisa ser acessível, porque o tema é cheio de termos que não fazem parte do cotidiano de muitas famílias. “Muitas famílias não se sentem à vontade para conversar e se posicionar por falta de conhecimentos sobre o tema e por eles próprios terem um afastamento com a escola e os conhecimentos pela vivência difícil que muitos deles tiveram quando crianças”, lembra Bárbara.

Dessa forma, fugir de discursos técnicos e explicar em linguagem simples o que significa cada um dos termos que surgirem na conversa é o melhor caminho. “É lembrar que estamos falando de pessoas, de vidas”, diz a coordenadora do projeto Gênero e Educação.

A pesquisa Educação, Valores e Direitos também mostrou que trazer notícias sobre o tema, falar sobre a importância de prevenir a gravidez na adolescência e ISTs, bem como histórias de escolas que conseguiram identificar situações de abuso, costuma mobilizar as famílias de forma favorável para começar o trabalho e, depois, evoluir para os demais temas.

“Quando perguntamos se as famílias concordam que a escola deve promover o respeito, a concordância é muito alta, e pode ser um caminho para começar essa aproximação”, aponta Bárbara.

Veja em Como escolas podem conversar com famílias sobre gênero e sexualidade – Centro de Referências em Educação Integral

8 iniciativas que falam de gênero, sexualidade e raça nas quebradas

Coletivos e projetos culturais fomentam debates sobre direitos humanos em diferentes formatos

Imagem de destaque da matéria "8 iniciativas que falam de gênero, sexualidade e raça nas quebradas". Na foto há um menino dançando no meio de uma roda

É a partir do senso de comunidade que iniciativas nas periferias de São Paulo acontecem todos os dias – são pessoas de todos os cantos, movidas pela coletividade, que fazem o “corre” ser realizado. O projeto Gênero e Educação da Ação Educativa selecionou algumas iniciativas que estão fomentando debates sobre questões voltadas a gênero, sexualidade e/ou raça nas pontas da cidade, de norte a sul, de leste a oeste ou até mesmo no interior.

“A gente é comunidade junta, a gente é mutirão em dias ruins”

“Favela venceu” – Don L

Espaço Puberê

Nascido no Grajaú, zona sul de São Paulo, o “Espaço Puberê” começou ainda em 2009, discutindo temas voltados à sexualidade infanto juvenil com oficinas de prevenção a ISTs (infecções sexualmente transmissíveis) e gravidez não planejada na adolescência. Com o passar do tempo, temas como educação emocional, parentalidades, educação em sexualidade e defesa de direitos humanos passaram a ser pautas abordadas pelo espaço.

Elânia Francisca, coordenadora do espaço, conta que o foco do Puberê é a “defesa e a proteção do direito ao desenvolvimento integral saudável de crianças e adolescentes, sobretudo da juventude periférica e negra, respeitando seus direitos sexuais e reprodutivos”. Francisca revela que uma das experiências mais marcantes durante a atuação no espaço foi quando uma pastora de uma igreja evangélica convidou o Puberê para dar oficina de autocuidado para adolescentes. “Para nós foi significativo pois sabemos o quanto o fundamentalismo religioso fragiliza as ações nas quebradas, e ter uma pastora sensível para esses temas mostra o quanto somos reconhecidas como uma coletiva que realiza um trabalho de respeito aos corpos e não de erotização, como muitas fake news tentam pregar.”

Imagem via Instagram @espacopubere e @vulvarias

Masculinidade Quebrada

O Masculinidade Quebrada surgiu em 2018 no Grajaú, Zona Sul de São Paulo, a partir das movimentações que o debate de gênero ganhava na região – mas que vinham de mulheres e meninas. Em uma metodologia de seis conversas, que abordam masculinidade, rede de afetos, sexualidade, relação com o feminino, violência de Estado e novas possibilidades, o coletivo nasceu com a ideia de “quebrar” a masculinidade hegemônica, trazendo novas perspectivas para que pessoas de todas as idades que se identificam com o masculino entendam gênero como algo construído socialmente. 

“O Grajaú é um dos distritos com maior número de notificações de violência de gênero, então havia uma constatação de que era urgente pensar sobre relações de gênero com homens, não só com mulheres”, comenta Raul Gomes, psicólogo responsável pelas atividades do coletivo. A iniciativa também conta com a supervisão de Elânia Francisca do Puberê, para que os integrantes e responsáveis do coletivo possam realizar “uma crítica maior aos processos de masculinidade”, conforme explica Gomes.

Imagem via Instagram @masculinidadequebrada

Okupação Cultural Coragem

A Okupação Cultural Coragem existe desde 2016, originada de um projeto chamado “Reggae na rua”, em que artistas tocavam um som de forma totalmente independente nas imediações da COHAB II, Zona Leste de São Paulo. Dos shows de reggae às batalhas de rap, artistas e produtores culturais passaram a ocupar um espaço nos arredores da Praça Brasil que viria a se tornar a Okupação, fortalecendo as atividades de artistas da região.

Com exposições como a “Aruanda”, que fala sobre religiões de matrizes africanas, e fortalecendo o corre de mulheres periféricas – são sete mulheres e dois homens na coordenação do coletivo -, a Okupação funciona de domingo a domingo, com coletivos de literatura, teatro, dança, rap, entre outras manifestações culturais que integram a programação cultural do espaço. “Hoje, a Okupação Cultural Coragem faz parte do circuito cultural da cidade, e o que eu mais curto são as exposições – a gente traz para a ocupação boas exposições, com muita qualidade, pra comunidade periférica acessar”, comenta Michele Cavalieri, produtora cultural e presidente do coletivo C.O.R.A.G.E.M – Coletivo de Ocupação, Revitalização, Arte, Graffiti, Educação e Música.

Imagem via Instagram @okupacaoculturalcoragem

Mães do Morro

Mães artistas, artesãs e oficineiras são as protagonistas das atividades realizadas pelo coletivo “Mães do Morro”, que surgiu em 2019 devido à falta de espaço e acolhimento para elas e seus filhos – tanto em eventos no território do Morro Doce, zona noroeste de São Paulo, quanto em outros lugares da cidade. Além das atividades culturais, as mães do morro organizam palestras e assessorias jurídicas sobre abandono paterno, violência doméstica, violência obstétrica, não romantização da maternidade, entre outros temas. 

“Além de fortalecer o fazer cultural da quebrada, o coletivo também tem um espaço de formação, principalmente para mulheres em situação de vulnerabilidade social”, conta Cida Marinho, uma das responsáveis pela iniciativa. “Por meio das rodas de conversa, podemos trazer dores, espaços de troca, vivências e espaços de escuta para essas mulheres”, complementa, em atividades que acontecem em praças e centros culturais da região.

Imagem via Instagram @maesdomorro

Rede Família Stronger

Fundado por Roberto Stronger, o coletivo surgiu em 2006 no Largo do Arouche, região central de São Paulo, com o intuito de proteger e acolher pessoas periféricas LGBTQIA+. Após 17 anos de atuação, o objetivo principal do coletivo é o direito à cidade, trabalhando com setorizações voltadas à atuação política e à promoção da saúde, principalmente com a prevenção de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), e por núcleos, como os voltados a pessoas transmasculinas, periféricas e negras.

Elvis Justino, integrante da Família Stronger há mais de 10 anos, explica que promover cultura pelo caminho inverso “saindo da Paulista e região central e voltando para nossos barracos e vielas” é revolucionário, pois além da ocupação da cidade ser um direito, e não um favor, “pessoas LGBT da periferia estão sendo protagonistas de suas próprias histórias.”

Imagem via Instagram @redefamiliastronger

Coletivo Acuenda

O Acuenda é um coletivo de drag queens que surgiu em 2014 no Jardim Romano, Zona Leste de São Paulo. Entre espetáculos e conversas sobre temas como gênero, sexualidade, racismo ou xenofobia, é por meio da cultura que os integrantes do coletivo divulgam a arte drag queen periférica e desejam que ela seja cada vez mais pulsante e viva nos extremos da cidade.

“A gente fala muito sobre identidade de gênero, orientação sexual e sobre a linguagem drag mesmo, que muitas pessoas ainda confundem com travestis e transexuais, e colocamos isso muito em pauta para mostrar as diferenças. Através dos eventos culturais, conseguimos aos poucos plantar essas sementinhas nas pessoas”, conta Bruno Fuziwara, da coordenação do coletivo. 

Imagem via Instagram @coletivoacuenda

Maracatu Ouro do Congo

Entre as construções de alfaias e os batuques, educadores iniciaram as atividades do Maracatu Ouro do Congo em 2009, mas a ideia de que ali se formava um grupo começou a partir de 2010, com um maior estudo sobre as questões de espiritualidade que envolvem o maracatu. A partir das atividades realizadas pelos artistas, uma rede de articulação cultural passou a se formar de maneira orgânica no Campo Limpo, Zona Sul de São Paulo, com o maracatu sendo levado a oficinas em diversas escolas e espaços culturais da região.

“A gente tem como objetivo trazer essa cultura pra cá – quando ela atravessa 3 mil quilômetros de Recife até São Paulo, a gente acolhe com muito respeito às questões de espiritualidade e as técnicas, queremos entregar algo com excelência como eles nos ensinam”, conta Paulo Félix Pinheiro, um dos fundadores do Maracatu. Ele relata que coloca toda a energia possível quando toca o tambor porque o maracatu não é só por ele, mas também por Antônio Severo da Silva: fundador do Ouro do Congo nascido em Cabo de Santo Agostinho (PE), que tinha o sonho de viver o Maracatu em São Paulo.

Imagem via Instagram @maracatuourodocongo

Adeola – Princesas Guerreiras

Ao serem convidadas para conversarem com crianças e adolescentes em um centro cultural no interior de São Paulo em 2015, as educadoras Denise Teófilo e Raísa Carvalho perceberam que o referencial literário de quando eram crianças não tinha muitas referências de personagens negras – e quando existia essa representação, muitas vezes era fomentando subjetividades racistas. Assim, nasce o “Adeola – Princesas Guerreiras”, que leva às crianças referências estéticas, históricas, de música e de arte dos povos africanos e afro-brasileiros. 

“Nossa proposta é conseguir criar imagens e possibilidades de histórias sobre rainhas e guerreiras,  envolvendo o lúdico e a brincadeira para acessar memórias sobre a história que ainda precisa ser recontada”, compartilha Teófilo. Das experiências mais marcantes do projeto, a educadora destaca o momento de coroação com turbantes, em que as crianças constroem coroas com tecidos. “O brilho no olhar das crianças pretas ao verem as princesas com certeza é a nossa experiência mais marcante.” 

Imagem via Instagram @princesasadeola

Nova edição do Edital Igualdade de Gênero seleciona propostas que contribuam para o enfrentamento do sexismo e do racismo nas escolas

Inscrições prorrogadas! O edital visa valorizar o conhecimento e a experiência de educadoras de creches, pré-escolas, escolas e universidades e ecoar decisões do STF, de 2020, que estabeleceram como dever do Estado brasileiro a abordagem de igualdade de gênero em escolas.

Ilustração de plano de aula do edital Igualdade de Gênero na Educação Básica. Na imagem há várias pessoas de braços levantados. Algumas delas portam cartazes em que é possível ver os dizeres: 'eu, mulher negra resisto', 'na luta por respeito'. Ilustradora: Barbara Quintino.

A Ação Educativa, em aliança com mais de 50 entidades comprometidas com a luta pelo direito humano à educação de qualidade, lança nesta terça-feira (21/03), Dia Internacional pela Eliminação da Desigualdade Racial, a terceira edição do Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica. Entre as entidades copromotoras, estão o Geledés – Instituto da Mulher Negra, Professores contra o Escola Sem Partido, o Cladem – Comitê Latino-americano para a Defesa dos Direitos da Mulher, a ANAJUDH-LGBTI – Associação Nacional de Juristas pelos Direitos Humanos de LGBTI e a ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e de Pesquisa em Educação, entre outras.

Nesta edição, o Edital se junta ao “Ciclo comemorativo – 20 anos da alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) pela Lei 10.639”. Com diversas ações previstas, o ciclo propõe refletir sobre os avanços e desafios na implementação de políticas públicas comprometidas com o enfrentamento ao racismo e a disseminação da contribuição dos diferentes povos no desenvolvimento econômico, social e cultural do Brasil. Dessa forma, serão valorizadas propostas para a educação básica que articulem gênero, raça e diversidade sexual em uma perspectiva interseccional.

ACESSE O DOCUMENTO DO EDITAL COMPLETO

Podem participar do Edital: educadoras e educadores, pesquisadoras e pesquisadores, organizações da sociedade civil, coletivos, movimentos sociais e profissionais de educação de todo país que atuam na Educação Infantil e na Educação de Jovens e Adultos.

Poderão ser inscritas: propostas de plano de atividade ou de práticas cotidianas, planos de aula, sequências didáticas ou relatos de experiências sobre promoção da igualdade de gênero na educação básica e que que contribuam para a efetiva implementação da LDB alterada pelas leis n.10.639/2003 e n.11.645/2008

As inscrições devem ser feitas exclusivamente por formulário disponível no site generoeeducação.org.br até o dia 16 de maio de 2023.

ACESSE O FORMULÁRIO DE INSCRIÇÕES

Durante a inscrição, proponentes poderão contar com um material de apoio para auxiliar no processo de elaboração e organização da proposta para o Edital. Trata-se de um documento de orientações sobre cada campo do formulário de inscrição e que poderá ser utilizado como rascunho. Para acessar o material de apoio clique aqui (em formato Word)

Edital 2023: seleção e aprovação das propostas

Todas as propostas aprovadas serão publicadas no banco de planos de atividades e de aula do site Gênero e Educação as autorias receberão certificados. As 10 propostas mais criativas e em acordo com os critérios estabelecidos no edital serão reconhecidas em evento virtual, receberão vales-livros da Livraria Africanidades e bolsas de estudo no Centro de Formação Educação Popular, Cultura e Direitos Humanos da Ação Educativa.

Segundo as entidades idealizadoras, o edital visa enfrentar a censura nas escolas promovida por movimentos ultraconservadores, além de ecoar as decisões do Supremo Tribunal Federal de 2020, que estabeleceram como dever do estado brasileiro a abordagem de gênero nas escolas. As edições anteriores receberam cerca de 350 inscrições de propostas de todo o Brasil.

Perguntas e Respostas

Qual o tema da terceira edição do Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica?

O Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica 2023 é voltado para os 20 anos da Lei 10.239/03,  que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.364/1996), tornando obrigatório o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira. Nesse marco, a terceira edição será dedicada a priorizar propostas que contribuam para a efetiva implementação da Lei 10.639/2003, assim como da Lei 11.645/2008, a partir da perspectiva interseccional com gênero.

O que é interseccionalidade?

Criado pela pesquisadora e jurista Kimberlé Crenshaw, o conceito da interseccionalidade se refere a intersecção das diferentes identidades e dos marcadores sociais e tem, como propósito, analisar a articulação das diversas formas de opressões, buscando analisar criticamente as desigualdades de gênero, raça, classe, território e outras discriminações na sociedade. Acesse O olhar interseccional por uma escola mais acolhedora.

Quem pode participar do Edital?

Creches, escolas, universidades, organizações da sociedade civil, coletivos juvenis, movimentos sociais, profissionais de educação e demais educadoras e educadores podem participar.

É preciso ter formação acadêmica para participar do Edital?

Não

O que posso enviar como proposta para o Edital?

As inscrições podem ser em formato de:
- Plano de atividade ou de práticas cotidianas (para a educação infantil)
- Plano de aula
- Sequência didática
- Relato de experiência

Como enviar minha proposta e até quando?

Você pode enviar sua proposta por meio do preenchimento do formulário disponível online, até 2/5.

Preciso enviar uma proposta que esteja relacionada A TODOS os temas do Edital?

As pessoas interessadas em se inscrever podem mandar propostas com os seguintes temas: Masculinidades; Pessoas com deficiências e educação inclusiva; Combate a LGBTQIAfobia; Combate a violência de gênero (física, psicológica, sexual, etc); Mulheres nas ciências e exatas; Equidade no esporte; Saúde mental Direitos sexuais e reprodutivos; Mercado de trabalho e trabalho doméstico; Enfrentamento do racismo; Valorização da cultura e história afro-brasileira; Valorização da cultura e história indígena; Mídias e tecnologias digitais; Enfrentamento da intolerância religiosa; Gênero, racismo ambiental e emergência climática; e Outros temas…

A proposta não precisa abarcar todos esses temas listados. Basta escolher apenas um!

O que é educação básica?

A educação básica é composta por três etapas de ensino: educação infantil (que corresponde a creche e a pré-escola), ensino fundamental (com ciclo I e ciclo II) e ensino médio.

O que é modalidade?

Elas integram a educação básica, em seus níveis e etapas. Tratam-se de caminhos diferentes em que a educação é desenvolvida e disponibilizada aos estudantes. São modalidades de ensino: Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional, Educação Especial, Educação Escolar Indígena, Educação Escolar Quilombola, Educação do Campo

O que é modalidade regular de ensino?

É a modalidade de ensino que atende aos estudantes que frequentam a escola com as idades regulares de acordo com cada etapa de ensino (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio)

O que é Educaçação de Jovens e Adultos?

A modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA) é destinada para estudantes maiores de 15 anos, que não tiveram acesso ou continuidade de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade própria. Os cursos de EJA devem pautar-se pela flexibilidade, tanto de currículo quanto de tempo, permitindo percursos individualizados, conteúdos significativos e atividades diversificadas

* Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica

O que é educação escolar indígena?*

A modalidade da Educação Escolar Indígena possui pedagogia diferenciada em respeito à especificidade étnico-cultural de cada povo. Busca fortalecer suas práticas sócio-culturais, identidades, ciências, memórias históricas, modos de fazer e de reproduzir suas culturas, crenças e tradições. Como forma de preservação da cultura sociolinguística de cada povo, o ensino é sempre que possível, ministrado em modo bilíngue contemplando suas línguas maternas.

* Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica

O que é educação escolar quilombola?*

A Educação Escolar Quilombola também possui pedagogia própria em respeito à especificidade étnico-cultural de cada comunidade, reconhecendo seu histórico social, cultural, político e econômico. Deve, em consequência, considerar a ancestralidade, os saberes tradicionais, as lutas pelo direito à terra, ao território, ao desenvolvimento sustentável e à memória.

* Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica

O que é educação do campo?*

Voltada para a população rural, a Educação do Campo é caracterizada a partir dos princípios da sustentabilidade e da pedagogia de alternância.  Ela incorpora os espaços da floresta, da pecuária, das minas e da agricultura e se estende, também, aos espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. Para atendimento a essa população, são necessárias adaptações às peculiaridades da vida rural e de cada região, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas.

* Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica

O que é educação especial?*

Educação Especial é a modalidade oferecida para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. Ela é transversal a todas etapas e modalidades. Busca criar condições para que a(o) professor(a) possa explorar as potencialidades de todos os estudantes, adotar uma pedagogia dialógica, identificar habilidades e necessidades dos estudantes, organizar e orientar sobre os serviços e recursos pedagógicos e de acessibilidade para a participação e aprendizagem.

* Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica

O que é educação profissional e tecnológica?*

No cumprimento dos objetivos da educação nacional, a modalidade da Educação profissional e tecnológica integra os diferentes níveis e modalidades de educação e as dimensões do trabalho, da ciência e da tecnologia. Ela ocorre na oferta de cursos de formação inicial e continuada ou qualificação profissional e nos de Educação Profissional Técnica de nível médio.

* Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica

Qual a diferença de “Objetivo geral” e “Objetivos específicos” no formulário de inscrição?

Os objetivos demonstram o que pretende ser desenvolvido, valorizado e incentivado na atividade. Objetivo geral é a ideia principal da atividade. Já os objetivos específicos são as particularidades dos resultados do que se pretende alcançar com a atividade.

Qual a diferença de “Conteúdos” e “Metodologia” no formulário de inscrição?

O conteúdo é O QUE você está propondo. Quais são os temas da atividade?

A metodologia é COMO você executaria o que está na sua proposta. Como acontece a atividade? Como os conteúdos serão desenvolvidos? É preciso descrever como a atividade será planejada e conduzida ao(s) objetivo(s) e conteúdo(s) estabelecido(s).

Quais são os critérios para ter minha proposta aprovada?
  1. Perfil: poderão se inscrever profissionais da educação básica e do ensino superior, pesquisadoras/es acadêmicos, educadoras/es, coletivos juvenis, movimentos sociais, instituições de sociedade civil e de pesquisa;
  2. Adequação aos objetivos e à proposta do edital;
  3. Consistência conceitual e metodológica da proposta submetida, de acordo com a etapa e modalidade a que se direciona;
  4. Inovação da proposta formativa;
  5. Viabilidade para a replicação da proposta.
Uma das minhas referências bibliográficas não está disponível online. O que fazer?

Nesse caso, indique apenas o nome da pessoa autora, nome da obra, ano da obra, seu formato (livro, CD, revista, outros) e (se for o caso) o volume.

Todas as propostas aprovadas irão ganhar o vale livros R$600 da Livraria Africanidades?

Não, somente as 10 propostas mais criativas, considerando os critérios citados no edital e análise do Comitê de Seleção do Edital, composto por profissionais da educação e especialistas sobre os estudos de gênero, raça e sexualidade.

Catarinas inaugura nova fase com evento cultural em Florianópolis

Portal de jornalismo feminista celebra sua reformulação visual e editorial com apresentações de Anis de Flor e Slam Cruz e Sousa, na Fundação Badesc

Seis anos após o lançamento do Catarinas, a equipe volta à Fundação Badesc, no centro de Florianópolis, para celebrar a nova fase do portal, marcada por uma reformulação visual e editorial. O evento acontece no dia 18 de novembro, sexta-feira, das 18h30 às 22h. A programação terá coquetel e apresentações culturais de Anis de Flor e Slam Cruz e Sousa, com entrada gratuita.

O Slam Cruz e Sousa, cujo nome homenageia um poeta negro de Florianópolis, é um coletivo que promove batalhas de poesias faladas e eventos culturais na capital de Santa Catarina e região, visando acessibilizar a arte de resistência no estado.

Anis de Flor é uma cantora contemporânea e da nova MPB naturalizada em Florianópolis. Apaixonada pela potência revolucionária-social da música, lançou recentemente seu primeiro álbum, FÉRTIL, que traz sua narrativa como mulher afro-indigena que vive no Sul do Brasil – obra que será apresentada no evento.

O novo Catarinas

Para a reformulação, o Catarinas criou um grupo de trabalho multidisciplinar composto pelo designer Lyn Jannuzzi e três profissionais da casa: a diretora executiva Paula Guimarães, a editora e estrategista digital Jess Carvalho, e Mariana Fraga, presidenta da Associação Catarinas. Ao longo de quatro meses, a equipe se dedicou a estudar o segmento, o público, os rumos do portal e suas demandas de segurança, a fim de propor novas soluções para a marca, o site e a linha editorial. 

“A reformulação da identidade visual e da linha editorial vem para demarcar as mudanças que ocorreram no Catarinas nos seis anos de existência, acompanhando as transformações no jornalismo, nos movimentos sociais, feministas e antirracistas, na produção científica e na sociedade como um todo. Ao mesmo tempo que é uma maneira de reforçar ainda mais nosso jornalismo posicionado e combativo, que mira nas garantias dos direitos fundamentais e humanos, e no fomento ao exercício da cidadania plena em que caibam todas as pessoas”, diz Paula Guimarães.

Hoje o Catarinas se posiciona como um veículo independente, transafirmativo, anticapacitista e anticapitalista que reporta os fatos de maneira crítica, por meio da lente do feminismo interseccional. “O portal segue vivo porque se mantém em diálogo com a sociedade, e a nova logomarca traduz muito bem essa nossa busca diária. Já as cores que agora compõem a paleta remetem à diversidade que pauta cada vez mais o nosso jornalismo, com destaque para o roxo que representa o feminismo, e o verde, que é muito usado pelos movimentos feministas latinoamericanos de luta pela descriminalização do aborto”, comenta Jess Carvalho. O resultado está disponível no site do portal.

Serviço

Lançamento do novo Portal Catarinas
Data: 18 de novembro, sexta-feira
Horário: 18h30 às 22h
Local: Fundação Cultural Badesc (Rua Visconde de Ouro Preto, 216 – Centro de Florianópolis)
Entrada franca

Cendhec apresenta recomendações para promoção de igualdade de gênero nas escolas

Adolescentes matriculadas nas redes de ensino do Recife, Igarassu e Camaragibe também participaram da entrega do documento para representantes das Secretarias do Recife, Igarassu e Camaragibe

Cendhec apresenta pesquisa sobre desigualdades de gênero na Educação

Ao lado de estudantes de escolas da rede pública de ensino municipal, integrantes do Centro Dom Helder Camara entregaram um Documento de Recomendações para representantes das Secretarias de Educação do Recife, Igarassu e Camaragibe. Construído após pesquisa desenvolvida pelo Cendhec com apoio do Fundo Malala, o documento foi baseado na escuta de adolescentes dos três municípios sobre os impactos das desigualdades de gênero no cotidiano escolar. As recomendações foram apresentadas durante o seminário “Meninas por uma Educação com Igualdade”, que aconteceu na Unicap, na manhã desta quarta-feira (16).

O Documento de Recomendações, que foi chancelado por 22 entidades e ativistas que atuam na defesa dos direitos de crianças e adolescentes, oferece uma série de sugestões sobre estratégias e ações que podem ser implementadas pelas gestões escolares para ajudar a diminuir desigualdades no dia a dia escolar. Os pontos foram elencados a partir da experiência do projeto Na Trilha da educação. Gênero e Políticas Públicas para Meninas, em especial a realização de uma pesquisa que ouviu as estudantes do ensino fundamental II de oito escolas públicas. Ao todo, 438 meninas responderam a questionários que foram aplicados entre os meses de março a setembro de 2022. 

Medidas de enfrentamento ao Racismo, LGBTransfobia, Machismo, Gravidez na adolescência, evasão escolar estão entre as recomendações elaboradas com base no que dispõem o Estatuto da Criança e do Adolescente, Constituição Federal, Conselhos de Educação e outros órgãos da rede de defesa. Para Katia Pintor, coordenadora do DCA do Cendhec, o documento é um importante instrumento em defesa de uma educação com equidade. “O documento de recomendação que o Cendhec apresenta tem a importância de trazer à luz informações e orientações para que as gestões de cada município possam implementar projetos e políticas públicas a partir do que o Cendhec identifica e aponta como necessidade de criação e reestruturação de ações voltadas à garantia da igualdade de gênero nas escolas”. 

A mesa de abertura do evento contou com as presenças do advogado, professor coordenador da Cátedra Unesco/Unicap e presidente do conselho diretor do Cendhec, Manoel Moraes; da coordenadora do Programa de Direito da Criança e do Adolescente (DCA) e coordenadora adjunta da instituição, a cientista social Katia Pintor; e Manuella Donato, consultora de projetos do Fundo Malala no Brasil. 

Pedagoga do Cendhec e integrante da Rede de ativistas do Fundo Malala, Paula Ferreira, atuou na mobilização das escolas durante a pesquisa e ressaltou que “a educação precisa ser um espaço de acolhimento, um espaço protetivo, e para isso é necessário estar em constante diálogo com outros atores da rede de garantia de direitos de crianças e adolescentes. Tivemos um desafio com a implementação da pesquisa num contexto de pandemia, mas entendemos que esse elemento também precisava estar inserido neste estudo, porque vai nos mostrar o quanto a educação de meninas foi ainda mais impactada nesse período”, pontuou a pedagoga. 

Paula Ferreira, pedagoga; e Alcione Ferreira, coordenadora do projeto

Alcione Ferreira, jornalista e coordenadora de projeto do Cendhec, apresentou os primeiros dados da pesquisa que merecem atenção das gestões municipais, uma vez que geram efeitos diretos no desenvolvimento das estudantes, e que também foram apontados no documento de recomendações. “Com o lançamento dos primeiros dados da pesquisa já percebemos o quanto o trabalho só começa, entra em nova fase: a de gerar junto aos atores públicos subsídios que contribuam para pensar efetivamente uma educação comprometida com a pauta de gênero. Não é possível pensar educação de qualidade sem pensar em igualdade de gênero”, afirma a coordenadora, que também participou da mobilização das gestões e secretarias durante todo o processo de aplicação da pesquisa. 

Andreika Asseker, Secretária de Educação de Igarassu, pontuou que a atuação do Cendhec ajudou as gestões a repensar formas de contribuir com o fortalecimento do papel da mulher, das meninas e da educação como fonte promotora de direitos. “Ajudou as meninas a se olharem, terem esse pertencimento do que elas podem, do que elas conseguem. Ajudou uma mudança de mentalidade dos professores, na própria comunidade, como também nas políticas públicas do município”. A Rede de Igarassu adotou a lei do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, garantindo a distribuição de absorventes para meninas da rede de ensino.”Também fizemos algumas mudanças estruturais na política de atendimento dos alunos na rede com essa perspectiva do fortalecimento da mulher. É realmente um programa fantástico que veio como uma pesquisa de intervenção em campo mudando as nossas práticas e a gente só tem que agradecer e fortalecer essa parceria com o CENDHEC”, pontuou. 

Um dos momentos mais especiais da programação foi protagonizado pelas adolescentes Peróla Canuto, da Escola Costa Porto e Sarah Raquel, da Escola Evangelina Delgado, de Igarassu. As duas meninas representaram as estudantes da rede pública municipal e falaram sobre suas reivindicações e sonhos de futuro. “Eu acho que o projeto me ajudou muito e foi muito revolucionário. Foi gratificante participar porque eu reparei que meu olhar se abriu e algumas coisas na escola mudaram sobre mim, também sobre outras meninas. Era muito difícil incluir meu nome social nas questões da escola e hoje em dia, depois desse projeto, está sendo muito mais fácil”, declarou Pérola. 

Assista o seminário na íntegra, disponível no canal do Geledés – Instituto da Mulher Negra

Pesquisa aborda as desigualdades na escola

A pesquisa desenvolvida pelo Cendhec buscou entender os efeitos das desigualdades de gênero na vida escolar de meninas. Realizada com 438 estudantes do ensino fundamental II das redes de ensino municipal público do Recife, Camaragibe e Igarassu, o levantamento compõe uma das ações do projeto Na Trilha da Educação. Gênero e Políticas Públicas para Meninas e mostrou que  94% das estudantes ouvidas querem que o tema igualdade de gênero seja discutido nas escolas. 

Racismo, assédio, lgbtqia+fobia, trabalho doméstico e falta de incentivo para a prática de atividades esportivas são alguns dos problemas apontados pelas adolescentes. a pesquisa foi dividida em dois métodos: quantitativo – por meio da aplicação de questionários;  e qualitativo – através da formação de grupos focais. As adolescentes consultadas responderam ao questionário no método quantitativo; gestoras/es e professoras/es também foram ouvidos durante o estudo. Já no método qualitativo, um grupo de 71 meninas participou de rodas de discussão sobre desigualdade de gênero e educação, sendo 35 estudantes matriculadas no fundamental II e 36 jovens que estão fora da sala de aula, com até 21 anos. Mães de estudantes também foram entrevistadas. 

Uma educação não sexista orienta-se pelo que dispõe a Resolução 34/180 da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), de 18 de dezembro de 1979, a qual se coloca a favor das “mesmas condições de orientação profissional, de acesso aos estudos e de obtenção de diplomas nos estabelecimentos de ensino de todas as categorias”. O documento propõe também a “eliminação de qualquer concepção estereotipada dos papéis masculino e feminino em todos os níveis”.

Rebecca Andressa, de 14 anos, estudante da rede municipal do Recife, tem a resposta na ponta da língua quando o assunto é a educação que ela quer.  “Uma escola que tenha igualdade para meninos e meninas é uma escola que apoia não só os meninos, mas também as meninas para que elas tenham sua voz ouvida. Tem muitas desigualdades na escola e precisamos de mais respeito, não só na escola como em qualquer lugar”. 

“A pesquisa é uma ferramenta muito importante para conhecer os problemas que as meninas enfrentam nas escolas. A partir desses dados e informações, o poder público pode elaborar estratégias e políticas que garantam a equidade de gênero nas escolas”, diz Maíra Martins, representante de Fundo Malala no Brasil, que atua em 10 países: Afeganistão, Brasil, Etiópia, Índia, Líbano, Nigéria, Paquistão e Turquia. No mundo, são 81 ativistas, sendo 11 no Brasil – incluindo Paula Ferreira, do Cendhec -, que integram a Rede Malala para articular ações de incidência política a partir de territórios socialmente vulneráveis. 

45,9% das entrevistadas têm 12 anos, 78% das entrevistadas são negras e pardas, 41% são evangélicas e 19,9% são católicas (60% cristãs).

Principais dados

  • Perfil das estudantes ouvidas: 45,9% das entrevistadas têm 12 anos, 78% das entrevistadas são negras e pardas, 41% são evangélicas e 19,9% são católicas (60% cristãs).
  • Desigualdade de gênero: Das meninas entrevistadas em Igarassu, Recife e Camaragibe, 59,1% responderam não saber o que é desigualdade de gênero, ao mesmo tempo, 66% acham que meninas e meninos não têm os mesmos direitos na escola. Sete em cada dez afirmam que seus professores não discutem o tema, porém 94,1% apontam que debater direitos de meninas e meninos é necessário.
  • Falta de incentivo afasta meninas das atividades esportivas: Aproximadamente 60% das estudantes acreditam que existe preconceito em relação às meninas praticarem esportes. Segundo elas, este preconceito é demonstrado pelos meninos, que foram citados em 91,5% das respostas. Um percentual de 26,5% das estudantes afirmaram se sentirem desconfortáveis com comentários sobre suas roupas
  • Assédio na escola: A pesquisa apresenta que 31,5% (sendo 7,1% muitas vezes + 24,4% algumas vezes) já se sentiu incomodada com atitudes/comentários de meninos. Dessas, 54,4% (sendo 11,9% muitas vezes +  42,5% algumas vezes) sentiu que havia maldade, segundas intenções. 53,8% não contou pra ninguém sobre essas atitudes. 
  • Racismo: Uma a cada 4 meninas sofre preconceito em ambiente escolar. De acordo com o levantamento, 26,9% das meninas entrevistadas dizem terem sido afetadas por algum tipo de prejulgamento/repúdio em suas instituições de ensino. Das vítimas, 38,1% atribui a ação ao racismo: 27,1% por ter cabelo crespo/enrolado; 11,0% por ser negra; 
  • Saúde mental, educação e pandemia: Quase metade das meninas em idade escolar se queixam de ansiedade. A pesquisa apresenta que a maioria (48,9%) das meninas entrevistadas se diz, na maior parte do tempo, ansiosa.

Ao todo, 68,3% das consultadas sentiram que a pandemia afetou sua saúde emocional, 65,9% disseram que a tristeza as abalou no período, outras 27,8% conviviam com o medo de perder alguém.

Sem aulas presenciais, o desenvolvimento delas também sofreu um duro golpe. Os números mostram que 55,5% das meninas relataram ter dificuldades para participar de aulas remotas, 43,2% destas atribuíram à dificuldade de acesso à internet. Ainda segundo o levantamento, 48,2% afirmam ter percebido prejuízos importantes em sua aprendizagem durante a crise sanitária.

Informações para a imprensa

Mariana Moraes (81)  9418-6421 – comunicacao@cendhec.org.br
Lenne Ferreira (81) 99818.9238
Fotos: Marlon Diego

Portal Catarinas lança especial sobre Gênero na Escola

Projeto conta com reportagens, cartilha, vídeo e atividades a favor de uma educação democrática e contra a censura de debates de gênero, sexualidade e raça em sala de aula

Gênero e Educação - Portal Catarinas lança especial sobre Gênero na Escola

Amanhã (30), no Portal Catarinas, acontece o lançamento do Especial Gênero na Escola, que trará uma série de materiais e atividades informativas em defesa de uma educação que promova a igualdade de direitos e combata discriminações contra pessoas LGBTIA+.

Nos últimos anos, a iniciativa acompanhou relatos de ameaças, perseguições e censuras a docentes universitários e do ensino básico em todo o Brasil. Em comum entre os casos, está a acusação de que as(os)  professoras(es) estariam “doutrinando” estudantes por meio da “ideologia de gênero”, termo utilizado para incitar pânico moral sobre temas sensíveis na sociedade.

As políticas educacionais tornaram-se alvo de movimentos reacionários, desde um setor católico e evangélico fundamentalista, a políticos de extrema direita, grupos libertários de direita, militares e fascistas, que incentivaram a perseguição e criminalização de docentes, além de disputarem os parâmetros curriculares nacionais.

“O conservadorismo se utiliza das questões morais e religiosas como agenda ou pano de fundo para conservação das estruturas de poder que nós temos, que é masculino, branco, heterossexual”, afirma a doutora em educação e integrante da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, Catarina de Almeida Santos.

Em 2011, Jair Bolsonaro, como deputado, utilizou o termo “kit gay” para atacar uma cartilha do projeto Escola sem Homofobia, produzida pelo Ministério da Educação e que seria distribuída para professores,. Em 2015, Flávio Bolsonaro, como deputado estadual pelo Rio de Janeiro, encomendou um projeto de lei para o idealizador do movimento Escola Sem Partido. Projeto que se desdobrou em inúmeros outros, proibindo gênero ou “ideologia de gênero” em sala de aula.  

Nesse contexto, em que observamos uma série de iniciativas fascistas causarem fissuras na frágil democracia brasileira, ganharam força modalidades de ensino que alteram os pilares da educação pública. “As propostas das escolas cívico-militares e da educação domiciliar são desdobramentos, que nascem da campanha inicial, que era mais específica e estava voltada para gênero e ideologia na educação. Isso cria um ambiente favorável para proposições que são muito mais sistêmicas e estruturais, e estão inspiradas na mesma matriz ideológica”, explica Sonia Corrêa, pesquisadora associada à Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA).

Robson Ferreira Fernandes, historiador e professor entrevistado para o Especial, se ampara na legislação para se proteger de perseguições 

“Hoje, o meu perfil é de um professor que debaixo dos braços está assegurado por todos os documentos legais, principalmente a Constituição. Eu não consigo fazer o planejamento de nada que não tenha como princípio a legalidade”, ressalta o docente depois de haver sofrido várias perseguições. 

Portanto, torna-se urgente que docentes e instituições de ensino se apropriem da base jurídica brasileira, que defende a liberdade de ensino, o pluralismo de ideias e a liberdade de aprender e ensinar. Além das decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020, que consideraram inconstitucionais as leis que tentam coibir a liberdade de cátedra das professoras(es). 

+ Ver mais: Sequência Didática “Mais do que uma hashtag, vidas negras importam”

Fernandes, professor de História na rede pública da Grande Florianópolis, sofreu diversas perseguições e ameaças. Foto: Diorgenes Pandini.

Especial Gênero na Escola

Fazem parte do Especial três reportagens aprofundadas sobre o tema, que serão lançadas dia após dia a partir da próxima terça-feira, 30 de agosto. Assim como um vídeo didático explicando a inconstitucionalidade das perseguições e as estratégias de defesa caso um docente sofra alguma forma de cerceamento. 

Teaser Gênero na Escola

Em setembro, haverá o lançamento da cartilha “Como defender-se das censuras ao debate de gênero, sexualidade e raça nas escolas?” nos formatos digital e impresso, que será disponibilizada para download no site e distribuída para o Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Santa Catarina (Sinte-SC). Também será realizada uma roda de conversa em uma instituição de educação pública em Florianópolis (ainda a ser definida) e uma live com especialistas nas redes sociais do Catarinas.    

No mês seguinte, estará disponível para download no Portal Catarinas um relatório com a sistematização dos dados da pesquisa realizada ao longo dos últimos meses, como o levantamento das leis e do avanço jurídico contra a censura nas escolas. 

O quê? Catarinas lança especial Gênero na Escola
Quando? A partir da próxima terça-feira, 30 de agosto
Onde? Em catarinas.info e nas redes do Portal
Arte: BeaLake | Foto: Diorgenes Pandini