Educação antirracista e o papel da escola: entrevista com Luana Tolentino

Em seu novo livro, Luana Tolentino convida escolas a refletirem sobre as violências de raça e gênero e se comprometerem por uma educação antirracista

Educação antirracista e o papel da escola: entrevista com Luana Tolentino

Ter uma educação ativamente antirracista e antissexista é fundamental para garantir o direito à cidadania plena para crianças, adolescentes e jovens. É disso que trata o novo livro da educadora e escritora Luana Tolentino. Sobrevivendo ao racismo: Memórias, cartas e o cotidiano da discriminação no Brasil (editora Papirus 7 Mares) reúne textos publicados na revista Carta Capital que abordam vivências da própria Luana e notícias recentes, buscando sensibilizar quem lê para se engajar na transformação da realidade. 

Com uma longa trajetória na educação, Luana Tolentino atualmente tem se dedicado à formação inicial e continuada de professores. Ela compõe o novo comitê de seleção do Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica 2023, promovido pelo projeto Gênero e Educação, da Ação Educativa. Em sua terceira edição, o Edital celebra os 20 anos da alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação pela Lei n. 10.639/2003, que instituiu a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira. Dessa forma, o edital irá valorizar propostas que articulem as dimensões de gênero e raça.

Conversamos com Luana sobre seu novo livro e o lançamento em São Paulo, que será realizado no dia 20 de junho, às 19h, na Livraria da Travessa (Rua dos Pinheiros, 513). 

Você pode contar um pouco sobre seu novo livro, Sobrevivendo ao racismo? Como foi o processo de organizar memórias e situações mais recentes sobre o impacto do racismo para a experiência de estudantes negras/os?

Os textos que compõem o livro foram escritos entre 2017 e 2022 e foram publicados na coluna que eu mantenho na Carta Capital. Eu queria lançar um livro novo e, garimpando que livro seria esse, me veio que eu tinha muitos textos falando sobre a questão racial e os impactos do racismo na educação. São textos, especialmente, em que eu aparecia muito – trazendo a questão da memória, trazendo a Luana menina, para pensar a questão do racismo. E a partir dessas memórias, é fazer com que as pessoas possam refletir a respeito dos impactos do racismo na trajetória de crianças e adolescentes negras, principalmente no contexto escolar, no espaço educacional.

Estamos num momento muito singular da luta racial, pela promoção da educação antirracista. Nós percebemos, sobretudo por parte dos educadores que estão no chão da escola, todo um trabalho de implementação da Lei n.10.639, que tornou obrigatório em 2003 o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira em instituições públicas e privadas. E esse engajamento e compromisso vem acompanhado também de muitas denúncias de racismo no contexto escolar, de violências, negligências, equívocos, de questões racistas na promoção de práticas pedagógicas.

Trazendo para o livro, eu trato de transformar em crônica esses episódios que têm circulado muito na mídia e nas redes sociais, de modo a fazer com que as pessoas reflitam sobre isso, sobre de que maneira nós vamos enfrentar e de trabalhar para que fatos como os que eu cito não se repitam. Tem as minhas histórias, que se cruzam com esses fatos, e reflexões sobre esses fatos. É uma escrita muito ocupada, muito pensada para sensibilizar os leitores – sejam educadores ou de outras esferas profissionais –, com o sentimento e o desejo de que as pessoas assumam um compromisso com o combate ao racismo.

Como você vê a articulação entre as dimensões de gênero e raça no cotidiano escolar?

Tem duas autoras, que inclusive eu cito no livro: a escritora afro-americana Toni Morrison e a Viola Davis, por quem eu sou perdidamente apaixonada. Toni Morrison diz que a menina negra é a mais vulnerável das criaturas. Já a Viola Davis diz que a soma de pobreza e racismo é brutal para essas meninas. Então não é possível pensar a questão de gênero sem fazer um recorte, um atravessamento de raça, quando se trata do contexto educacional, já que as meninas fazem parte do grupo mais vulnerável no espaço escolar.

Se sobre os meninos negros incide a violência física, sobre as meninas pesa a violência física, a violência simbólica e a invisibilidade. Ao se pensar o enfrentamento do racismo e as políticas públicas de promoção da equidade racial no contexto educacional, é preciso fazer essa interseccionalidade de gênero e raça, já que esse grupo tem ficado para trás no contexto educacional e nas políticas públicas. 

Como a sociedade pode se engajar para que estudantes não apenas sobrevivam ao racismo, mas tenham acesso a uma educação que de fato enfrente as desigualdades raciais?

Há uma grande diferença entre sobreviver e viver. E a nós negros têm sido negado o direito de viver em plenitude, já que ainda tem sido negado o direito à educação a nós: o direito de ingressar, permanecer e ter uma trajetória exitosa nos espaços escolares. Tem sido negado o direito à saúde, à moradia, ao trabalho. Tem sido negada ainda a nossa condição de gente, tem sido negada diariamente a nossa humanidade.

É fundamental que toda a sociedade se engaje para que a trajetória da população negra não seja apenas uma trajetória de sobrevivência, mas que seja garantido a esse grupo o direito à vida e cidadania plena. E a escola tem um papel fundamental nesse processo, ela precisa ser o espaço de reconhecimento e de valorização da diversidade étnico-racial, da comunidade negra e das contribuições da população negra para a construção desse país. Ao fazer isso, a escola estará se colocando no lugar de garantir o direito à vida a pessoas como eu, a crianças, a jovens, a adolescentes negros e negras desse país.

8 iniciativas que falam de gênero, sexualidade e raça nas quebradas

Coletivos e projetos culturais fomentam debates sobre direitos humanos em diferentes formatos

Imagem de destaque da matéria "8 iniciativas que falam de gênero, sexualidade e raça nas quebradas". Na foto há um menino dançando no meio de uma roda

É a partir do senso de comunidade que iniciativas nas periferias de São Paulo acontecem todos os dias – são pessoas de todos os cantos, movidas pela coletividade, que fazem o “corre” ser realizado. O projeto Gênero e Educação da Ação Educativa selecionou algumas iniciativas que estão fomentando debates sobre questões voltadas a gênero, sexualidade e/ou raça nas pontas da cidade, de norte a sul, de leste a oeste ou até mesmo no interior.

“A gente é comunidade junta, a gente é mutirão em dias ruins”

“Favela venceu” – Don L

Espaço Puberê

Nascido no Grajaú, zona sul de São Paulo, o “Espaço Puberê” começou ainda em 2009, discutindo temas voltados à sexualidade infanto juvenil com oficinas de prevenção a ISTs (infecções sexualmente transmissíveis) e gravidez não planejada na adolescência. Com o passar do tempo, temas como educação emocional, parentalidades, educação em sexualidade e defesa de direitos humanos passaram a ser pautas abordadas pelo espaço.

Elânia Francisca, coordenadora do espaço, conta que o foco do Puberê é a “defesa e a proteção do direito ao desenvolvimento integral saudável de crianças e adolescentes, sobretudo da juventude periférica e negra, respeitando seus direitos sexuais e reprodutivos”. Francisca revela que uma das experiências mais marcantes durante a atuação no espaço foi quando uma pastora de uma igreja evangélica convidou o Puberê para dar oficina de autocuidado para adolescentes. “Para nós foi significativo pois sabemos o quanto o fundamentalismo religioso fragiliza as ações nas quebradas, e ter uma pastora sensível para esses temas mostra o quanto somos reconhecidas como uma coletiva que realiza um trabalho de respeito aos corpos e não de erotização, como muitas fake news tentam pregar.”

Imagem via Instagram @espacopubere e @vulvarias

Masculinidade Quebrada

O Masculinidade Quebrada surgiu em 2018 no Grajaú, Zona Sul de São Paulo, a partir das movimentações que o debate de gênero ganhava na região – mas que vinham de mulheres e meninas. Em uma metodologia de seis conversas, que abordam masculinidade, rede de afetos, sexualidade, relação com o feminino, violência de Estado e novas possibilidades, o coletivo nasceu com a ideia de “quebrar” a masculinidade hegemônica, trazendo novas perspectivas para que pessoas de todas as idades que se identificam com o masculino entendam gênero como algo construído socialmente. 

“O Grajaú é um dos distritos com maior número de notificações de violência de gênero, então havia uma constatação de que era urgente pensar sobre relações de gênero com homens, não só com mulheres”, comenta Raul Gomes, psicólogo responsável pelas atividades do coletivo. A iniciativa também conta com a supervisão de Elânia Francisca do Puberê, para que os integrantes e responsáveis do coletivo possam realizar “uma crítica maior aos processos de masculinidade”, conforme explica Gomes.

Imagem via Instagram @masculinidadequebrada

Okupação Cultural Coragem

A Okupação Cultural Coragem existe desde 2016, originada de um projeto chamado “Reggae na rua”, em que artistas tocavam um som de forma totalmente independente nas imediações da COHAB II, Zona Leste de São Paulo. Dos shows de reggae às batalhas de rap, artistas e produtores culturais passaram a ocupar um espaço nos arredores da Praça Brasil que viria a se tornar a Okupação, fortalecendo as atividades de artistas da região.

Com exposições como a “Aruanda”, que fala sobre religiões de matrizes africanas, e fortalecendo o corre de mulheres periféricas – são sete mulheres e dois homens na coordenação do coletivo -, a Okupação funciona de domingo a domingo, com coletivos de literatura, teatro, dança, rap, entre outras manifestações culturais que integram a programação cultural do espaço. “Hoje, a Okupação Cultural Coragem faz parte do circuito cultural da cidade, e o que eu mais curto são as exposições – a gente traz para a ocupação boas exposições, com muita qualidade, pra comunidade periférica acessar”, comenta Michele Cavalieri, produtora cultural e presidente do coletivo C.O.R.A.G.E.M – Coletivo de Ocupação, Revitalização, Arte, Graffiti, Educação e Música.

Imagem via Instagram @okupacaoculturalcoragem

Mães do Morro

Mães artistas, artesãs e oficineiras são as protagonistas das atividades realizadas pelo coletivo “Mães do Morro”, que surgiu em 2019 devido à falta de espaço e acolhimento para elas e seus filhos – tanto em eventos no território do Morro Doce, zona noroeste de São Paulo, quanto em outros lugares da cidade. Além das atividades culturais, as mães do morro organizam palestras e assessorias jurídicas sobre abandono paterno, violência doméstica, violência obstétrica, não romantização da maternidade, entre outros temas. 

“Além de fortalecer o fazer cultural da quebrada, o coletivo também tem um espaço de formação, principalmente para mulheres em situação de vulnerabilidade social”, conta Cida Marinho, uma das responsáveis pela iniciativa. “Por meio das rodas de conversa, podemos trazer dores, espaços de troca, vivências e espaços de escuta para essas mulheres”, complementa, em atividades que acontecem em praças e centros culturais da região.

Imagem via Instagram @maesdomorro

Rede Família Stronger

Fundado por Roberto Stronger, o coletivo surgiu em 2006 no Largo do Arouche, região central de São Paulo, com o intuito de proteger e acolher pessoas periféricas LGBTQIA+. Após 17 anos de atuação, o objetivo principal do coletivo é o direito à cidade, trabalhando com setorizações voltadas à atuação política e à promoção da saúde, principalmente com a prevenção de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), e por núcleos, como os voltados a pessoas transmasculinas, periféricas e negras.

Elvis Justino, integrante da Família Stronger há mais de 10 anos, explica que promover cultura pelo caminho inverso “saindo da Paulista e região central e voltando para nossos barracos e vielas” é revolucionário, pois além da ocupação da cidade ser um direito, e não um favor, “pessoas LGBT da periferia estão sendo protagonistas de suas próprias histórias.”

Imagem via Instagram @redefamiliastronger

Coletivo Acuenda

O Acuenda é um coletivo de drag queens que surgiu em 2014 no Jardim Romano, Zona Leste de São Paulo. Entre espetáculos e conversas sobre temas como gênero, sexualidade, racismo ou xenofobia, é por meio da cultura que os integrantes do coletivo divulgam a arte drag queen periférica e desejam que ela seja cada vez mais pulsante e viva nos extremos da cidade.

“A gente fala muito sobre identidade de gênero, orientação sexual e sobre a linguagem drag mesmo, que muitas pessoas ainda confundem com travestis e transexuais, e colocamos isso muito em pauta para mostrar as diferenças. Através dos eventos culturais, conseguimos aos poucos plantar essas sementinhas nas pessoas”, conta Bruno Fuziwara, da coordenação do coletivo. 

Imagem via Instagram @coletivoacuenda

Maracatu Ouro do Congo

Entre as construções de alfaias e os batuques, educadores iniciaram as atividades do Maracatu Ouro do Congo em 2009, mas a ideia de que ali se formava um grupo começou a partir de 2010, com um maior estudo sobre as questões de espiritualidade que envolvem o maracatu. A partir das atividades realizadas pelos artistas, uma rede de articulação cultural passou a se formar de maneira orgânica no Campo Limpo, Zona Sul de São Paulo, com o maracatu sendo levado a oficinas em diversas escolas e espaços culturais da região.

“A gente tem como objetivo trazer essa cultura pra cá – quando ela atravessa 3 mil quilômetros de Recife até São Paulo, a gente acolhe com muito respeito às questões de espiritualidade e as técnicas, queremos entregar algo com excelência como eles nos ensinam”, conta Paulo Félix Pinheiro, um dos fundadores do Maracatu. Ele relata que coloca toda a energia possível quando toca o tambor porque o maracatu não é só por ele, mas também por Antônio Severo da Silva: fundador do Ouro do Congo nascido em Cabo de Santo Agostinho (PE), que tinha o sonho de viver o Maracatu em São Paulo.

Imagem via Instagram @maracatuourodocongo

Adeola – Princesas Guerreiras

Ao serem convidadas para conversarem com crianças e adolescentes em um centro cultural no interior de São Paulo em 2015, as educadoras Denise Teófilo e Raísa Carvalho perceberam que o referencial literário de quando eram crianças não tinha muitas referências de personagens negras – e quando existia essa representação, muitas vezes era fomentando subjetividades racistas. Assim, nasce o “Adeola – Princesas Guerreiras”, que leva às crianças referências estéticas, históricas, de música e de arte dos povos africanos e afro-brasileiros. 

“Nossa proposta é conseguir criar imagens e possibilidades de histórias sobre rainhas e guerreiras,  envolvendo o lúdico e a brincadeira para acessar memórias sobre a história que ainda precisa ser recontada”, compartilha Teófilo. Das experiências mais marcantes do projeto, a educadora destaca o momento de coroação com turbantes, em que as crianças constroem coroas com tecidos. “O brilho no olhar das crianças pretas ao verem as princesas com certeza é a nossa experiência mais marcante.” 

Imagem via Instagram @princesasadeola

Com Rede Malala, Nobel da Paz pede que governo brasileiro ouça meninas e sociedade civil

Em visita ao Brasil para se encontrar com ativistas e meninas de projetos desenvolvidos pela Rede Malala em diferentes estados, Malala Yousafzai pediu que o governo brasileiro avance na implementação de políticas progressistas e leis que promovam a equidade de gênero e de raça na educação.

A mais jovem vencedora do Prêmio Nobel da Paz, Malala Yousafzai, realizou uma visita de uma semana ao Brasil para se encontrar com integrantes da Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala no Brasil (Rede Malala) e meninas dos projetos implementados pelas organizações parceiras da rede. 

Em Olinda (PE), Malala participou de uma roda de diálogo com meninas negras, indígenas e quilombolas de projetos implementados pela Rede Malala e por organizações apoiadas pelo Fundo Malala por meio do Girl Programme (Programa Meninas), no Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF). A cofundadora do Fundo Malala também teve um jantar com integrantes da Rede Malala que atuam em Pernambuco: Paula Ferreira, do Comitê Pernambuco da Campanha Nacional pelo Direito à Educação; Givânia Silva, cofundadora da CONAQ; Ana Paula Ferreira Lima, coordenadora na Associação Nacional Indigenista (ANAÍ); Rogério Barata, educador do Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF), e Cassia Jane, coordenadora de projetos no Centro das Mulheres do Cabo (CMC). 

Fotos Malala no Brasil @redemalala - Créditos Fundo Malala

No Cabo de Santo Agostinho (PE), a Nobel da Paz se reuniu com integrantes do projeto “Meninas em Movimento pela Educação”, implementado pelo CMC, com apoio do Fundo Malala. Meninas ativistas contaram como conduziram buscas ativas na comunidade para identificar meninas que deixaram a sala de aula e analisar os motivos da evasão escolar. Malala se encontrou com membros do Comitê Intersetorial de Combate à Evasão Escolar, formado pelas meninas do projeto, Cassia Jane, além de representantes do governo municipal. A Nobel da Paz foi ainda entrevistada por meninas ativistas no programa de rádio “Papo de Menina”. 

Fotos Malala no Brasil @redemalala - Créditos Fundo Malala

Diálogo interministerial 

Em Brasília, Malala juntou-se a integrantes da Rede Malala e meninas ativistas brasileiras em um diálogo interministerial no Ministério da Educação (MEC) para discutir os desafios enfrentados por estudantes, sobretudo negras, indígenas e quilombolas, para acessar uma educação de qualidade no Brasil. Estiveram presentes o ministro da Educação, Camilo Santana, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e representantes de secretarias-executivas das pastas de Direitos Humanos e Cidadania, Mulheres, Povos Indígenas e Secretaria da Presidência da República. 

Malala pediu comprometimento com o novo Plano Nacional de Educação (PNE) e investimentos robustos na educação do país. “As vozes das meninas devem estar no centro das discussões que definem o futuro delas. É preciso garantir a participação de ativistas e de meninas na formulação de políticas educacionais e a colaboração entre o governo e a sociedade civil para mudar o futuro das meninas. Eu espero que o governo brasileiro avance na implementação de políticas progressistas e leis que promovam a equidade de gênero e de raça, incluindo a total implementação da história e cultura afro-brasileira e indígena nos currículos escolares”, disse a mais jovem Nobel da Paz. 

A Rede Malala entregou aos ministérios um monitoramento sobre o direito à educação e cobrou prioridade para aumento do financiamento à educação. Em 2022, as ativistas pela educação apoiadas pelo Fundo Malala iniciaram o projeto coletivo Eleições, para garantir que a educação de meninas fosse prioridade nos atuais mandatos. Mais de 500 candidaturas, incluindo a do presidente Luís Inácio Lula da Silva, assinaram a Carta Compromisso pelo Direito à Educação, um pacto com 40 pontos por uma educação equitativa e de qualidade. 

“A educação tem sofrido cortes significativos. O Plano Nacional de Educação (PNE), cuja vigência termina em 2024, prevê 10% do PIB para a educação e nós estamos na metade disso. Não podemos ficar submetidos a teto de gastos”, afirmou Cleo Manhas, assessora de políticas do INESC e integrante da Rede Malala, que ainda defendeu que o MEC revogue o decreto de escolas cívico-militares e lidere um processo de desmilitarização das escolas, além de revogar o Novo Ensino Médio. 

Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e integrante da Rede Malala, frisou que 85% das estratégias do PNE não foram cumpridas. “É necessária a construção e compromisso por um novo Plano Nacional de Educação que não retroceda. Queremos a inclusão de todas as pessoas na educação dentro das suas diversidades. Precisamos ousar e não perder mais 10, 20 anos”.

Denise Carreira, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE-USP) e sócia-educadora da Ação Educativa reiterou a necessidade de retirada do Fundeb e dos pisos mínimos das políticas sociais e ambientais do novo arcabouço fiscal e chamou atenção para o enfrentamento dos movimentos autoritários nas escolas. A professora cobrou o fim do Programa de Escolas Cívico-Militares, a construção de um programa nacional de promoção da igualdade de gênero, raça na educação e a construção de um Observatório sobre a Violência contra Profissionais de educação destacando iniciativas da Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação., como a pesquisa Educação, Valores e Direitos. “Neste contexto tão desafiante, é urgente que as políticas educacionais priorizem a construção de uma cultura democrática e de direitos humanos, associada a uma cultura voltada para a transição ecológica, que contribua efetivamente para a construção e sustentação de um projeto de justiça racial, social, de gênero e ambiental no país”.

Givânia Maria da Silva, co-fundadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ) e integrante da Rede Malala, ressaltou a negligência com a educação escolar quilombola no Brasil. “Sem território, não há educação para os povos originários e o povo quilombola. O território é a base da educação. Segundo o Censo, as escolas quilombolas são as que menos têm conectividade, salas de leitura, bibliotecas e quadras de esporte. Apenas 2% dos quase 6 mil quilombos do Brasil têm escolas com ensino médio. As Diretrizes Nacionais para Educação Escolar Quilombolas, aprovadas em 2012, ainda não foram implementadas”, disse. 

Por fim, em São Paulo, Malala participou de um painel organizado pela Imaginable Futures juntamente com ativistas da Rede Malala: Benilda Brito, coordenadora do projeto Mandacaru Malala; Suelaine Carneiro, coordenadora no Geledés – Instituto da Mulher Negra, e Andreia Martins, membro da direção da Redes da Maré. 

Educação inclusiva para meninas

Como parte do projeto Eleições, junto com a Rede Malala, um grupo de 20 meninas negras, indígenas, quilombolas, do campo, trans, travestis e com deficiência desenvolveu o Manifesto #MeninasDecidem pelo Direito à Educação, que traz as prioridades das meninas brasileiras por uma educação antissexista, antirracista e com financiamento adequado. Bia Diniz, de 17 anos, é uma delas. 

“Precisamos não apenas falar de evasão escolar, mas de negligência escolar. Nós – mulheres indígenas, negras, quilombolas, trabalhadoras rurais, LBGTQIAP+, trans e travestis – somos excluídas desses espaços. Não queremos que o Ministério da Educação debata sobre educação sem as meninas. Queremos entrar pela porta da frente e construir os rumos da educação do nosso país”, disse durante o diálogo interministerial. 

Em resposta às demandas apresentadas, o ministro da Educação, Camilo Santana, destacou ações para o reajuste da alimentação escolar, a recomposição orçamentária das instituições federais, a implementação do Programa Escola em Tempo Integral e a efetivação do Pacto Nacional pela Retomada de Obras da Educação Básica.

Sobre a Rede Malala

Desde 2018, o Fundo Malala investiu mais de US$ 3,6 milhões em organizações parceiras e seus programas em todo o Brasil, alcançando mais de 3 milhões de meninas em todo o país. Nossos parceiros no Brasil se concentram em ajudar meninas negras, indígenas e quilombolas de comunidades rurais e áreas urbanas pobres a terem acesso à educação de qualidade. Eles defendem o antirracismo, incluindo ambientes escolares e para aumentar o orçamento nacional da educação.

A Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala no Brasil (Rede Malala) reúne 11 ativistas e suas organizações da sociedade civil que atuam em diversas regiões do país para garantir o direito à educação de meninas, com foco em meninas negras, indígenas e quilombolas de comunidades rurais e áreas urbanas em situação de vulnerabilidade. Para saber mais sobre esse trabalho, visite malala.org/countries/brazil ou siga-nos nas redes sociais em @RedeMalala

Sobre o Fundo Malala

O Fundo Malala (Malala Fund) está trabalhando por um mundo onde todas as meninas possam aprender e liderar. O Malala Fund defende os recursos e as mudanças políticas necessárias para dar a todas as meninas uma educação secundária, investe em líderes educacionais locais e amplifica as vozes das meninas que lutam pela mudança. Saiba mais em malala.org e @MalalaFund.

Combate ao abuso: conheça 3 propostas para trabalhar prevenção da violência na escola

No Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, o projeto Gênero e Educação separou algumas propostas e experiências para fortalecer o papel da escola na proteção de educandos e no combate à violência

Imagem da matéria Combate ao abuso: conheça 3 propostas para trabalhar prevenção da violência na escola, do site Gênero e Educação. Na foto, duas crianças estão brincando e sorrindo

O 18 de maio é reconhecido como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. A data é concretizada em memória à Araceli Crespo, uma menina de 08 anos, que foi raptada, violentada e assassinada em 1973. O caso, que se tornou símbolo de luta e mobilização, completa 50 anos e segue sem nenhuma medida de punição dos culpados

As instituições educacionais são locais potentes para identificação de casos, formação de redes de proteção, apoio e prevenção. E a abordagem de gênero e raça nas escolas são caminhos que possibilitam o combate às violências, que também está presente na lógica da omissão das desigualdades. Em 2020, por meio dos julgamentos no Supremo Tribunal Federal, tentativas de proibir o debate nas escolas foram consideradas inconstitucionais por violarem direitos fundamentais de estudantes.

É preciso fortalecer o papel da escola no enfrentamento das violências e dos abusos contra crianças e adolescentes. Ecoar experiências positivas e conhecimentos em torno desse desafio é uma forma de tecer redes e ampliar a proteção de educandos.

Conheça 3 propostas para serem trabalhadas na escola:

Fanzine como potência educativa no combate à violência doméstica

Atividade busca debater com estudantes a violência doméstica no cotidiano e abordar direitos humanos. A partir da confecção de fanzines e da coleta de informações sobre os diferentes tipos de violência, a escola organiza momentos de discussão, convidando também representantes de movimentos sociais ou da defensoria pública do estado para conversar sobre o tema. A autora da proposta é Marcielly Cristina

Pipo e Fifi: conhecer para prevenir

Por meio da contação de história e do desenho, essa experiência conta como a obra “Pipo e Fifi” foi utilizada para promover ações de cuidado com crianças, prevenção do abuso e da violência sexual e incentivar crianças a refletirem e se posicionarem em relação aos seus sentimentos e emoções. As autoras da atividade são Cristiane Pereira e Léia Teixeira.

Juntes: Relações saudáveis na adolescência

O projeto interdisciplinar prevê atividades para identificar mecanismos de opressão, relacionamentos abusivos e outros tipos de violências contra meninas e mulheres. A partir de diferentes materiais, as atividades promovem o questionamento dos papéis de gênero, das discriminações raciais e refletem sobre a importância do diálogo e da rede de afetos. As autoras do projeto são Aldenora Conceição e Jaqueline Aparecida.

PNLD: decisão da Justiça determina exclusão de livros didáticos que violem direitos humanos

Organizações que compõem a Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação moveram uma Ação Civil Públca questionando o edital de 2021 do PNLD

Imagem da matéria "PNLD: decisão da Justiça determina exclusão de livros didáticos que violem direitos humanos" do site Gênero e Educação. Na imagem, há estudantes em sala de aula, sentados em suas mesas olhando para a frente, onde está a professora diante de um quadro

Uma decisão da 4ª Vara da Justiça Federal determinou que as obras selecionadas pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) devem respeitar princípios éticos e democráticos e não podem ser incluídos materiais que violem direitos humanos ou façam proselitismo religioso. A sentença foi proferida na quarta-feira, 10 de maio, no âmbito de uma Ação Civil Pública movida por organizações que compõem a Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação que refutava o edital de 2021 do PNLD. 

O edital lançado pelo governo Bolsonaro havia alterado os critérios de editais anteriores, retirando a cláusula que excluía obras que violassem direitos humanos e que veiculassem preconceitos raciais, sociais, de gênero, entre outros –em seu lugar, foi incluída uma cláusula que transformava a observância princípios éticos e de cidadania em mero critério de avaliação.

Julgamento da Ação Civil

Na sentença, o juiz Renato Coelho Borelli julgou procedente o pedido para que os editais do PNLD reincorporem as cláusulas de proteção aos direitos humanos e à diversidade. Tendo em vista que o edital de 2021 já foi finalizado, o juiz determinou a implementação imediata de uma etapa de monitoramento, para que a União identifique e recolha as obras que não estiverem de acordo com esses critérios. A ação foi apresentada pela Ação Educativa, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Geledés – Instituto da Mulher Negra, Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) e Associação Nacional de Juristas pelos Direitos Humanos LGBTI (ANAJUDH-LGBTI). A ação teve como subsídio um estudo crítico do edital do PNLD lançado em 2021 realizado pela Associação de Lingüística Aplicada do Brasil (ALAB) e apresentado ao Fórum das Ciências Humanas, Sociais, Sociais Aplicadas, Letras, Linguística e Artes (FCHSSALLA).

“O edital do PNLD 2021 trouxe alterações aparentemente sutis, mas com implicações profundamente perversas e duradouras para o direito à educação”, explica a professora e pesquisadora Fernanda Vick, integrante da Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação. “ Os critérios para seleção das obras induziam a produção de materiais didáticos que praticamente apagavam as diferenças e desigualdades estruturantes da nossa história e sociabilidade e simplesmente deixavam de abordar a condição da população LGBTQIA+. Foi uma clara tentativa de tirar esses temas do debate escolar e inverter o sentido da política pública, que vinha em um processo de aprimorar mecanismos de promoção de uma educação não discriminatória”. 

Ver mais: Projeto ultraconservador para a educação inclui a criminalização de debates sobre direitos humanos, gênero, raça, sexualidade e ataques à laicidade

Como funciona o PNLD

O Programa Nacional do Livro Didático foi criado em 1985, com o objetivo de distribuir livros escolares para estudantes de escolas públicas. Atualmente, é regido pelo decreto n. 9099/2017, que estabelece que o programa deve avaliar e disponibilizar obras didáticas, pedagógicas e literárias e materiais de apoio a escolas e instituições conveniadas. Editoras e autores inscrevem as obras que desejam que façam parte do programa. As obras são avaliadas por especialistas e as aprovadas passam a fazer parte do Guia Digital do PNLD. Com base nesse catálogo, as escolas escolhem quais obras e coleções serão adotadas.

Contatos para imprensa

Mariana Nepomuceno e Tales Rocha (Agência Galo/Assessoria da Ação Educativa)
(11) 97152-4834 e 98870-1089
mariana.nepomuceno@agenciagalo.com; tales.rocha@agenciagalo.com

Semana de Ação Mundial 2023 abre inscrições para a maior atividade pela educação do planeta

Nova edição da SAM terá como temas a renovação do PNE (Plano Nacional de Educação) e a descolonização do financiamento da educação

A 20ª Semana de Ação Mundial, maior ação coletiva em prol da educação do planeta, vai acontecer entre os dias 19 e 26 de junho e está com as inscrições abertas até 15 de maio!

De 2003 a 2022, a Semana já mobilizou mais de 90 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo cerca de 2 milhões de pessoas apenas no Brasil.

Como acontece a cada edição, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, como realizadora da SAM, fará o envio gratuito de materiais e certificados para as/os participantes.

INSCREVA SUA ATIVIDADE JÁ: A DISTRIBUIÇÃO DE MATERIAIS IMPRESSOS É LIMITADA ÀS 1.000 PRIMEIRAS INSCRIÇÕES!

As inscrições para realizar uma atividade da SAM 2023 e para receber os materiais impressos gratuitamente pelos correios podem ser feitas neste link. Haverá certificado de participação mediante envio de relatório das atividades realizadas. Veja mais informações abaixo.

Novo PNE e descolonização do financiamento da educação!

Com o tema Descolonização do financiamento da educação e o último ano do Plano Nacional de Educação (2014-2024), a SAM 2023 vai promover a participação democrática e a mobilização popular em torno da renovação do PNE, mostrando a importância da atualização da Lei do PNE sem retrocessos, com ousadia para a garantia de uma educação pública de qualidade a todas as pessoas. 

Descolonizar o financiamento significa que os Estados devem financiar a educação, e devem fazê-lo usando o máximo de recursos disponíveis, sejam eles recursos internos contínuos (PIB, impostos, empréstimos) como externos (cooperação internacional), bem como aquelas que possivelmente poderiam ser mobilizados (através de uma reforma tributária progressiva e outras reformas). Saiba mais na página “O que defendemos?”.

Com uma série de materiais disponíveis no site, como o Manual da SAM 2023 (a ser disponível em breve), a SAM propõe temas a serem trabalhados em atividades autogestionadas realizadas por professores, famílias e responsáveis, e estudantes, toda a comunidade educacional, gestores, conselheiros, tomadores de decisão e todas as pessoas preocupadas com a garantia do direito à educação. 

Plano Nacional de Educação

Os dias de evento também incluem a data de aniversário do Plano Nacional de Educação (PNE), dia 25 de junho de 2014, quando foi sancionado (Lei 13.005/2014). Assim, a SAM brasileira continua dedicada ao monitoramento da implementação do PNE, que é o nosso principal caminho para que toda a população brasileira possa ter acesso a uma educação pública de qualidade, da creche à universidade.

Este é o último ano do PNE. É também neste ano que o governo federal terá de enviar ao Congresso Nacional um novo Projeto de Lei com o PNE para o próximo decênio — o atual finda sua vigência em junho de 2024. 

Junto com os materiais disponibilizados no site da SAM, haverá a divulgação de uma série de cartelas do Balanço do PNE, que atualiza diversos dados educacionais e aponta patamares de cumprimento e, infeliz e especialmente, de descumprimento de cada uma das 20 metas do PNE. É também um valioso material para as atividades realizadas. Estamos na reta final do período para o cumprimento das metas (2014-2024) e ainda nenhuma delas foi integralmente cumprida.

Inscreva-se na SAM 2023

Para participar, acesse o portal da SAM 2023 e baixe os materiais digitais de divulgação virtual para já começar a mobilização para suas atividades. Basta acessar a aba “Materiais”. Em breve, disponibilizaremos também o Manual da SAM 2023 e mais subsídios.

Assim que realizar as atividades, o participante deve postar as fotos, vídeos e relatos! Assim como divulgar nas redes sociais usando as hashtags #SAM2023, #DescolonizaFinanciamento, #PNEpraValer e #SemRetrocessoComOusadia.

Certificado

Para receber um certificado de participação, a/o participante deve preencher o formulário no site semanadeacaomundial.org, indicando as atividades que pretende realizar com os materiais de apoio.

Logo após a Semana de Ação Mundial, a/o participante deve escrever um breve relatório das atividades realizadas, informando também o número de pessoas mobilizadas – anexando fotos e vídeos, autorizando ou negando sua divulgação. Para mais informações, escreva para sam@campanhaeducacao.org.br.


Realização
Campanha Nacional pelo Direito à Educação

Comitê Técnico da SAM 2023
Claudia Bandeira – Ação Educativa
Ana Paula Brandão – ActionAid
Liz Ramos – Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF)
Nesly Lizarazo – CLADE – Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação
Guelda Andrade – CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
Liliane Garcez – Coletivxs
Luana Rodrigues  – Escola de Gente – Comunicação em Inclusão
Nelson Cardoso Amaral / Rubens Barbosa de Camargo – Fineduca – Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação
Thais Martins – Mais Diferenças
Ingrid Ribeiro – REPU – Rede Escola Pública e Universidade
Gilvânia Nascimento – UNCME – União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação
Jhonny Echalar – Comitê GO da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Jhonatan Almada – Comitê MA da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Maria Lima – Comitê MS da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Felipe Baunilha – Comitê PB da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Sandra Teresinha  – Comitê PR da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Rita Samuel – Comitê RN da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Walterlina Brasil – Comitê RO da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Angelita Lucas – Comitê RS da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Darli de Amorim Zunino – Comitê SC da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Raquel Maria Rodrigues – Comitê SP da Rede da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

Apoio
Campanha Global pela Educação
CLADE – Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação
Trindade Tecnologia

Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Ação Educativa
ActionAid
Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF)
Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (CEDECA-CE)
Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE)
Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca)
Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (Mieib)
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
Rede Escola Pública e Universidade (Repu)
União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme)
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime)


ASSESSORIA DE IMPRENSA
Renan Simão – assessor de comunicação da Campanha Nacional pelo Direito à Educação
comunicacao@campanhaeducacao.org.br
(11) 95857-0824 

O olhar interseccional por uma escola mais acolhedora

Reconhecer as diferenças é passo fundamental para acolher a diversidade e enfrentar as desigualdades na educação

Gênero e Educação e Interseccionalidade - O olhar interseccional por uma escola mais acolhedora. Imagem feita a partir de fotos de Mídia NINJA

Você já deve ter ouvido a palavra interseccionalidade por aí. Nos últimos anos, o debate sobre o conceito e sua aplicação no dia a dia tem ganhado espaço. Mas, afinal, o que seria essa tal interseccionalidade? E o que ela tem a ver com educação?

A interseccionalidade apareceu como um conceito, pela primeira vez, no final da década de 1980. Kimberlé Crenshaw, defensora de direitos civis estadunidense e uma das principais referências da teoria crítica de raça, apresentou o conceito em um artigo em que discute o caso de Emma DeGraffenreid, uma mulher negra que processou uma fábrica por não querer empregá-la. A motivação, segundo Emma, era pelo fato de ser uma mulher e negra. No entanto, o juiz não acatou sua denúncia, pois, havia empregados negros e empregadas mulheres na fábrica. Creensahw identificou, então, que Emma estava sofrendo com uma dupla violência: a de raça e a de gênero, de forma interseccional.

Em documento elaborado para um encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero na III Conferência Mundial contra o Racismo, em 2002, Crensaw traz que a interseccionalidade “trata especificamente da forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras. Além disso, a interseccionalidade trata da forma como ações e políticas específicas geram opressões que fluem ao longo de tais eixos, constituindo aspectos dinâmicos ou ativos do desempoderamento”.

A ideia desse intercruzamento de opressões está presente nos debates propostos por outras feministas negras, também aqui no Brasil, como é o caso de Lélia Gonzalez. A intelectual e ativista brasileira discutia como o racismo e o sexismo operam na vida das mulheres negras de formas bem peculiares.

No entanto, o olhar da interseccionalidade não é restrito apenas a raça e gênero. Ele contempla diversas formas de opressão que, como afirma Crenshaw, “se sobrepõem e criam múltiplos níveis de injustiça social”. Orientação sexual, classe social, religião, nacionalidade, ter algum tipo de deficiência, entre outros marcadores devem ser observados quando se propõe uma discussão interseccional no combate às desigualdades.

Interseccionalidade e a escola como espaço para combate às desigualdades

Paula Ferreira, pedagoga e antirracista integrante do Comitê Pernambuco da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação e Ativista Pela Educação do Fundo Malala no Brasil, acredita na “interseccionalidade como um instrumento político, analítico e também teórico metodológico que questiona as opressões – contra mulheres negras em especial – em função do patriarcado, do capitalismo, do racismo que são estruturantes  e que geram desigualdades”. 

E isso está profundamente relacionado à educação. Por ser um espaço que reúne diversas bagagens, diversos corpos, vivências e formas de se relacionar e de estar no mundo, a escola é terreno fértil para propor discussões e ações para enfrentar as desigualdades que estão postas.

Para o projeto Gênero & Educação, a educação deve prezar pelo diálogo, liberdade de aprender e ensinar, pluralidade pedagógica e pela construção de uma cultura democrática. Neste sentido, valorizar as diferenças e enfrentar qualquer forma de discriminação é tarefa coletiva e permanente de educadoras, estudantes, gestores seja no dia a dia da escola, seja nas práticas pedagógicas.

Edital Igualdade de Gênero na Educação 2023: inscrições abertas até 02 de maio!

O Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica 2023: enfrentando o sexismo, racismo e a LGBTQIAfobiaestá com inscrições abertas. A iniciativa é realizada pela Ação Educativa por meio do projeto Gênero e Educação, em aliança com ampla rede de parceiras e com apoio do Fundo Malala.

+ Saiba mais sobre o Edital aqui!

Nos 20 anos da Lei 10.639/2003, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, tornando obrigatório o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira, o 3º Edital Igualdade de Gênero na Educação Básica está recebendo propostas de planos de atividades e práticas cotidianas, planos de aula, sequências didáticas e relatos de experiências que contribuam para a efetiva implementação da lei 10.639/03 assim como a 11.645/08, em uma perspectiva interseccional

O edital visa valorizar o conhecimento e a experiência de educadoras de creches, pré-escolas, escolas e universidades e ecoar decisões do STF, de 2020, que estabeleceram como dever do Estado brasileiro a abordagem de igualdade de gênero em escolas.

Militarização e cultura de ódio: pesquisadoras refletem sobre o aumento da violência nas escolas

Casos de violência nas escolas exigem análises profundas sobre o fenômeno ultraconservador na educação. Medidas de perseguição e militarização da educação são caminhos perigosos e impulsionam violações de direitos e crimes de ódio.

Militarização e cultura de ódio: pesquisadoras refletem sobre o aumento da violência nas escolas

Ao longo dos últimos anos, temos vivenciado o avanço do ultraconservadorismo no país, e, consequentemente, ataques diversos nas instituições democráticas e nos princípios que regem a Constituição do Brasil. No campo da educação, não tem sido diferente: perseguições, censura e assédio nas escolas promovidos por movimentos autoritários têm gerado clima de desconfiança, medo e ameaça.

Na última semana, a tragédia na Escola Estadual Thomazia Montoro, em São Paulo, tomou a todos por um grande luto e pesar. E é momento de refletir sobre o ataque que não foi um caso isolado na história recente do país. Para a professora da UnB, Catarina de Almeida Santos, “os ataques contra as escolas constituem-se crime de ódio contra mulheres, pessoas negras, pessoas com deficiência, LGBTQIAPN+, ou seja, ódio contra a diversidade. Assim, o racismo, o machismo, a heteronormatividade, os supremacismos e os discursos de ódio, alimentam o extremismo e consequentemente os ataques. O vigilantismo, em todas as suas formas, não será a solução, ao contrário, pois o cerceamento do diálogo resulta em mais ódio”.

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação emitiu uma nota de pesar e convida a todos a uma reflexão crítica sobre a relação da intolerância e de ações extremistas com o aumento da violência contra as escolas e, consequentemente, contra a sociedade.  “É importante ressaltar que o aumento de ideias e comportamentos fascistas, de extrema direita entre a população, de uma cultura de ódio, xenofobia e intolerância em suas mais variadas formas, contribuem diretamente para um cenário propício a atitudes cada vez mais violentas na sociedade, seja nas escolas, ou fora delas”. 

A organização alerta que, após tragédias como a da escola Thomazia Montoro, ascendem narrativas sobre a falta de segurança e a violência nas escolas e ressalta que  é preciso analisar a questão de forma mais profunda. O debate não pode se limitar a uma questão de segurança pública e deve passar “pela discussão sobre o fim da militarização das escolas, sobre o desarmamento da sociedade, sobre a ausência do Estado na promoção de uma cultura de paz, de políticas públicas da saúde mental para sua população e, fundamentalmente, é preciso uma resposta firme contra ações e discursos fascistas”. Leia a nota na íntegra aqui!

Renata Aquino, professora de história, pesquisadora da censura na educação e de humanidades digitais, acredita que “esse cenário é maior que a escola. Nós estamos perdendo direitos no campo da educação, do bem estar social, da saúde, etc., e esses ataques são sintomas mórbidos desse tecido social se desfazendo em meio a uma crise violenta. A escola é importante para tratar isso, mas ela é só uma parte”.

 “A polícia na escola ou a militarização das instituições escolares e suas normas hierarquizadas, com a padronização de vestimentas, corpos e comportamentos, negam as diferenças e os sujeitos. A imposição dos princípios da área de segurança em detrimento dos da educação impedem o diálogo, os estudos e debates sobre os temas que alimentam o extremismo”, alerta a professora Catarina. 

O processo de militarização das escolas viola liberdades de expressão, de organização e de associação sindical dos professores, e não tem qualquer amparo legal seja na Constituição Federal, seja na Lei de Diretrizes e Bases e seja no Plano Nacional de Educação. Há registros de que escolas militarizadas já são alvo de denúncias de assédio moral e sexual e de abusos, não são mais seguras e ainda promovem violações de direitos e violências.

Ver mais em: Projeto ultraconservador para a educação inclui a criminalização de debates sobre direitos humanos, gênero, raça, sexualidade e ataques à laicidade

Neste momento de retomada de um diálogo democrático na sociedade brasileira, é urgente que se estabeleça um esforço coletivo para debater tais questões, como uma responsabilidade conjunta de toda a sociedade e a via não é pela militarização. “As escolas que não podem ser responsabilizadas pelo extremismo, são parte da solução, mas para isso, precisam ser instituições educativas com condições objetivas de desenvolver a formação de sujeitos e não de soldados, que é o que objetiva a pedagogia do quartel”, finaliza Catarina.