Mais de 90% da população defende que escola discuta pobreza, desigualdade e direitos dos estudantes
Pesquisa nacional realizada pelo Cesop/DataFolha e coordenada pela Ação Educativa e Cenpec mostra apoio à abordagem de temas como política, educação sexual e discriminação racial nas escolas.
Embora a ideia de que professores falem de política na sala de aula divida opiniões, a grande maioria das pessoas concorda que a escola deva discutir temas como pobreza, desigualdade e os direitos dos estudantes. É o que revela a pesquisa nacional Educação, Valores e Direitos, coordenada pelas organizações Ação Educativa e Cenpec, e realizada pelo Centro de Estudos em Opinião Pública (Cesop/Unicamp) e Instituto Datafolha. O levantamento ouviu 2.090 pessoas em todo o país sobre questões consideradas polêmicas relativas à política educacional. A realização da pesquisa contou com recursos do Fundo Malala.
A aparente contradição é compreensível devido à descrença com o sistema político-partidário, assinalam os especialistas que coordenaram a pesquisa. “Apesar disso, quando trazemos questões concretas, como as desigualdades sociais e o acesso a direitos, a população entende que é papel da escola fazer esses debates. Os dados reforçam que uma educação crítica e democrática, que contribua para a formação cidadã de seus estudantes, tem um grande respaldo social”, analisa Romualdo Portela, diretor de pesquisa e avaliação do Cenpec.
Quando perguntados se professores devem evitar falar de política na sala de aula, 56% disseram concordar. No entanto, a abordagem de pobreza e desigualdade social tem apoio de 93%, mesmo índice dos que disseram que professores devem ensinar aos alunos o que fazer quando seus direitos não são respeitados.
A pesquisa foi produzida no âmbito de uma articulação da sociedade civil que vem atuando há anos no enfrentamento do fenômeno da censura, perseguições e autocensura nas escolas, promovidas por movimentos ultraconservadores. Esses grupos são orientados à manipulação e disseminação de informações falsas e preconceituosas – principalmente em períodos eleitorais – estimulando o pânico moral, em especial, com relação às agendas de igualdade de gênero, sexualidade e raça, atacando a democracia e os princípios básicos de uma educação crítica e dialógica.
“Os resultados da pesquisa trouxeram esperança ao revelar que a população não está abraçando esse discurso autoritário do jeito que esses movimentos ultraconservadores costumam alardear. A grande maioria da população defende uma escola crítica, que prepare seus filhos para a vida, que discuta direitos e que aborde as agendas da igualdade de gênero, da educação sexual e do enfrentamento do racismo e de outras desigualdades, como forma – inclusive – de proteger crianças, adolescentes e jovens da violência, discriminação e abuso sexual”, afirma Denise Carreira, integrante da Ação Educativa e da Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala e uma das coordenadoras da pesquisa.
Em 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou diversas leis que censuraram a atividade docente, entre elas a Lei Escola Livre, de Alagoas, que vedava o que chamou de “doutrinação ideológica” por parte do corpo docente ou da administração escolar. Para a corte, a imposição de uma pretensa neutralidade tem como propósito constranger e perseguir pessoas que eventualmente sustentem visões críticas ou que se afastem do padrão dominante. “O Movimento Escola sem Partido e outros grupos ultraconservadores criam deliberadamente uma confusão entre a abordagem de temas políticos e o que chamam de ‘doutrinação ideológica’, com o objetivo de atacar a educação e restringir o direito de estudantes a acessar informações e conteúdos essenciais ao direito à educação. As decisões do STF reafirmam isso”, argumenta Salomão Ximenes, professor de Direito e Políticas Públicas da UFABC.
Os resultados da pesquisa mostram ainda um amplo apoio para que questões raciais e de gênero sejam tratadas nas escolas:
- 89% dos entrevistados concordam a discussão sobre desigualdades entre homens e mulheres;
- 82% entendem que a escola deve promover o direito de as pessoas viverem livremente sua sexualidade, sejam elas heterossexuais ou LGBTs;
- 91% são favoráveis à discussão sobre a discriminação racial;
- e 81% defendem a inclusão de estudantes com deficiências em escolares regulares.
“No contexto eleitoral dramático que o país vive, os resultados da pesquisa fazem um alerta e um chamado às forças democráticas: não sucumbam às ameaças e as chantagens de grupos ultraconservadores. Há espaço junto à população para a retomada de uma agenda pró-direitos, que promova uma educação de qualidade, que enfrente desigualdades e comprometida com os direitos das meninas e mulheres, pessoas LGBTQIA+, negras, indígenas e com deficiências, entre outros grupos discriminados”, destaca Denise Carreira.
Veja mais informações sobre a pesquisa:
- Na contramão do homeschooling, população defende o direito de crianças frequentarem a escola
- Ampla maioria defende que igualdade de gênero e educação sexual sejam abordadas nas escolas
- Maioria da população é favorável às cotas raciais
- Para maioria da população brasileira, educação deve ser mais confiada a professoras(es) do que a militares
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Sobre a Ação Educativa
Criada em 1994, é uma organização de direitos humanos, sem fins lucrativos, com uma trajetória dedicada à luta por direitos educativos, culturais e da juventude. Desde a sua fundação, integra um campo político de organizações e movimentos que atuam pela ampliação da democracia com justiça social e sustentabilidade socioambiental, pelo fortalecimento do Estado democrático de direito e pela construção de políticas públicas que superem as profundas desigualdades brasileiras, bem como pela garantia dos direitos humanos para todas as pessoas. Desde 2018, a Ação Educativa é apoiada pelo Fundo Malala. Saiba mais: https://acaoeducativa.org.br/ | https://generoeeducacao.org.br/
Sobre o Cenpec
Cenpec é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que há mais de 30 anos trabalha pela promoção da equidade e qualidade na educação básica pública brasileira. Por meio da produção de pesquisas e de tecnologias educacionais, contribui no desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens, na formação de profissionais de educação, na ampliação e diversificação do letramento e no fortalecimento da gestão educacional e escolar. Em parceria com redes de ensino, espaços educativos e outras instituições de caráter público e privado, atua dentro e fora das escolas públicas para diminuir as desigualdades e garantir uma educação de qualidade a todos e todas. Saiba mais: www.cenpec.org.br.