Virando Homem: Masculinidades e Adolescência
Estado: Minas Gerais (MG)
Etapa de Ensino: Ensino Fundamental II
Modalidade: Educação Regular
Disciplina:
Formato: Presencial
Sou professora da área de Psicologia Escolar da Escola de Educação Básica da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Tenho graduação e mestrado em Psicologia pela UFU e doutorado em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP). Sou uma mulher cis feminista e bissexual que vive um relacionamento conjugal homoafetivo. Tenho compromisso com a educação feminista, antirracista e anticlassista como parte do meu projeto de contribuir, por meio de minha existência e atuação profissional, com a construção da justiça social.
Objetivos
- Promover a compreensão sobre os conceitos de gênero e sexualidade;
- Promover a reflexão e compreensão sobre as desigualdades de gênero;
- Promover a compreensão dos conceitos de machismo, feminismo e violência de gênero;
- Promover a reflexão sobre como a masculinidade normativa e as desigualdades de gênero afetam o desenvolvimento e as possibilidades de vida de cada um;
- Promover a reflexão e compreensão sobre as diferentes formas de viver a masculinidade;
- Contribuir com possibilidades de vida mais saudáveis, empáticas e significativas para os meninos adolescentes.
Conteúdo
- Desigualdade de gênero, machismo, violência de gênero e feminismo;
- Padrões normativos de gênero e as possibilidades de vida;
- Impactos dos padrões normativos de gênero nos índices de saúde e violência;
- Gênero, sexualidade e suas diferentes formas de expressão e vivência;
- As diferentes masculinidades.
Metodologia
Sugerimos a divisão da classe para que esse plano de aulas seja desenvolvido apenas com alunos, visando garantir a eles um espaço confortável e instigante para refletir sobre as masculinidades. Em nossa experiência prévia, com turmas que, até aquele momento, não contavam com estudantes trans ou não-binários, observamos que nas discussões sobre gênero, as alunas protagonizaram o debate, enquanto os alunos tenderam a não se envolver nas reflexões, parecendo não sentir que a temática dizia respeito também às suas vivências. Avaliamos que isso se deveu, primeiramente, à disseminação do feminismo entre as alunas, que têm demonstrado, nas discussões, domínio dos repertórios críticos sobre gênero. Esse aspecto pode ter tido o efeito de constranger os meninos no compartilhamento de reflexões e ideias que pudessem soar machistas.
Ao mesmo tempo, entendemos que isso também foi efeito, justamente, da manifestação dos padrões binários de gênero nesses grupos, fazendo com que os meninos buscassem se diferenciar das meninas com posturas brincalhonas, irreverentes e desconectadas de reflexões do âmbito pessoal/emocional. Essa dinâmica se mostrou diferente em turmas formadas apenas por meninos, quando percebemos abertura e envolvimento com os temas.
Contudo, para evitarmos reforçar as lógicas binária e cis normativa, é importante que o/a/e docente tenha sensibilidade ao contexto no qual será desenvolvido o trabalho, se preparando previamente para acolher estudantes cis, trans e não binários. Nesse sentido, propõe-se uma aula inicial, com toda a turma, abordando a temática da identidade de gênero, para criar um ambiente em que alunas, alunos e alunes possam se manifestar com relação a sugestão de divisão da turma, podendo, inclusive, escolher a forma de divisão que lhes parecer mais adequada.
Os dois grupos podem, então, debater o mesmo tema, isto é, masculinidades, ou masculinidades e feminilidades, com a inversão das temáticas entre os grupos, após finalizada a sequência didática.
A sequência apresentada aqui foi desenvolvida visando a promoção de reflexões e aprendizagens sobre como os padrões normativos de “ser homem” afetam os meninos.
Aula 1 – Gênero, identidade de gênero e orientação sexual
* Esta aula será feita com a turma completa, com a divisão em dois grupos ocorrendo ao final
1- Atividade de aquecimento (tempo estimado 5 minutos)
Solicitar que estudantes fiquem em duplas. Entregar a cada dupla pedaços de 2 metros de papel pardo e uma canetinha. Solicitar que façam o contorno do corpo do/a/e colega no papel pardo. Para isso, cada dupla deve escolher quem desenhará e quem será desenhado, isto é, cada dupla fará apenas um desenho. Depois, deixar os desenhos no chão, ao centro da roda. Esses desenhos serão utilizados em atividade posterior. Essa atividade visa possibilitar que estudantes tensionem o limite com o corpo do outro e descontraiam, preparando-se para a discussão do dia.
2- Atividade de reflexão em grupo (tempo estimado: 20 min.)
Convidar a turma a assistir o curta-metragem “Eu não quero voltar sozinho pra casa”, que conta uma história de dois adolescentes que se apaixonam. Após a exibição do filme, perguntar à turma o que entenderam, estimulando-os a conversarem.
Pode ser interessante perguntar:
- Quem achou que o personagem principal ficaria com a menina?
- Vocês imaginaram o que aconteceria no final do filme? Por quê?
A partir dessa conversa, explicar os conceitos de heteronormatividade, homofobia e sexualidade.
3- Atividade de reflexão em grupo (tempo estimado: 15 min.)
Convidar estudantes a assistirem a dois trechos do longa “Alice Júnior”, um filme sobre as vivências de uma adolescente trans em uma nova escola.
Apresentar os trechos:
- Minuto 27:27 até 30:30
- Minuto 42:00 até 47:11
Após a exibição dos trechos, estimular as/os/es estudantes a contarem o que mais os chamou atenção.
- Sobre o primeiro trecho, sugerimos perguntar: quais outras vivências e preocupações vividas pela personagem, para além de ser uma mulher trans, vocês notaram? No filme, a personagem fala de paqueras, da ansiedade pelo primeiro beijo na boca e da perda da mãe, mostrando que a vida de uma adolescente trans não se resume ao seu gênero.
- No segundo trecho, vale perguntar se compreenderam a queixa de Alice com relação à fala do amigo, supostamente elogiosa, de que ela não parecia ser trans. Além disso, é importante discutir, no âmbito dos padrões de masculinidade, a ação do amigo de tirar sua própria blusa de frio para aquecer as duas meninas que estavam com ele vendo o pôr do sol, dentre elas, a Alice.
Em conexão com essa conversa, explicar os conceitos de gênero e transfobia. Ao abordar gênero, é importante explicitar a diferença entre cisgênero e transgênero, ressaltando que é possível, ainda, não se identificar com nenhum gênero, nem masculino, nem feminino, sendo uma pessoa não-binária. A partir disso, explicar a transfobia e suas diversas formas de manifestação.
4 - Atividade de produção coletiva (tempo estimado: 10 min.)
Orientar as/os/es estudantes a escreverem, dentro dos contornos de corpo que estão no chão, com suas palavras, a definição de gênero, sexualidade, homofobia, heteronormatividade e transfobia. Ao final, solicitar que leiam o que todos colocaram e se permitam perceber como esses conceitos marcam nossos corpos e nossas vidas.
Para finalizar, apresentar a sugestão de divisão da turma por gênero, compondo um grupo apenas de meninos. Caso a turma tenha outra sugestão, é importante considerá-la visando acolher as diferentes expressões de gênero.
Aula 2 - O que é ser homem? Estereótipos e normas em movimento
1- Atividade de aquecimento (tempo estimado: 10 min.)
Em roda, orientar cada aluno a escolher um colega para apresentá-lo, dizendo uma qualidade dele. Com isso, objetiva-se prepará-los para ouvirem e serem ouvidos em grupo, bem como estimulá-los no exercício de olhar e falar sobre um outro homem, de forma elogiosa. Além disso, a atividade possibilita que o/a docente conheça os alunos, caso não tenha um trabalho prévio com eles. Essa atividade parte do pressuposto de que os alunos já se conhecem.
Um aluno deve iniciar a apresentação, preferencialmente de forma voluntária, sendo que as demais seguem na sequência de cada aluno apresentado, tal como feito em dinâmicas de amigo-secreto. Por exemplo: O aluno 1 inicia as apresentações apresentando o aluno 8. Após sua fala, a palavra estará como aluno 8, que por sua vez apresentará outro aluno.
2- Atividade de reflexão individual (tempo estimado: 10 min.)
Projetar ou escrever no quadro branco as frases “Homem que é homem é…” e “Homem que é homem não…”. Em seguida, orientar os alunos para que, individualmente e em silêncio, completarem as frases. Distribuir para eles fichas de papel sulfite e caneta. Orientá-los a escrever em letra grande, legível à distância, e a colar suas fichas com as respostas no quadro branco, utilizando fitas adesivas. Informar que eles terão 5 minutos para essa tarefa.
Antes da leitura das respostas, convidá-los a assistir a um trecho do documentário “The Mask You Live In".
- Minuto 6:32 ao 7:19.
Nesse trecho, é mostrado um momento de um encontro de um grupo de homens, realizado em uma penitenciária americana, em que os participantes relatam normativas sobre masculinidade que aprenderam quando crianças.
Alguns exemplos de suas falas:
- Homens resolvem problemas por meio da violência
- Homens não choram
- Homens devem ganhar dinheiro
- Homens são mulherengos.
3- Compartilhar em grupo (tempo estimado: 10 min.)
Depois de assistir o trecho, convidá-los a ler as respostas nas fichas coladas no quadro branco e, em discussão grupal, relacionar suas respostas com o que viram no vídeo.
Perguntas para estimular essa discussão:
- O que mais apareceu nas respostas de vocês?
- Isso aparece também no vídeo?
- Algo surpreendeu vocês nas respostas dos colegas?
- De onde vocês acham que vêm essas ideias sobre ser homem?
4- Exposição dialogada sobre o conceito de padrões normativos de gênero (tempo estimado: 20 min)
Com a utilização de slides, projetar o conceito de padrões normativos de gênero e alguns dados sobre os efeitos da masculinidade normativa na vida dos homens.
Slide 1 - Padrões normativos de gênero são comportamentos considerados naturalmente masculinos ou femininos, como a força, a inteligência e a competitividade, no caso dos homens, e a sensibilidade, a beleza e a capacidade de cuidar, no caso das mulheres.
Com base nisso, as meninas são convidadas a brincar de casinha e de boneca, enquanto os meninos são estimulados a brincar com carrinhos e a praticar esportes. Além disso, é considerado natural que homens se relacionem sexualmente e afetivamente com mulheres e vice-versa, como já dito na aula anterior, ao abordarmos a heteronormatividade.
Vale lembrar que os padrões normativos de gênero também são atravessados, de forma interseccional, por outros marcadores como raça, classe, idade e regionalidade. Por exemplo, mulheres brancas são consideradas frágeis e delicadas, enquanto mulheres negras são consideradas mais resistentes à dor e ao trabalho pesado. (Como referência para o trabalho docente, pode ser lido o texto "E não sou uma mulher?", de Sojourner Truth, indicado na bibliografia.)
Slide 2 - Esses padrões normativos do que é ser homem influenciam a adoção de práticas de risco pelos homens. As três principais causas de morte de homens estão vinculada aos padrões de masculinidade: as brigas entre homens (na qual se destacam os homicídios, com uma proporção de 7 homens por mulher); os acidentes de trânsito (3 homens por mulher) cirrose hepática pelo consumo abusivo de álcool (mais que o dobro de homens). O índice de suicídio entre homens, no Brasil, é 3.23 maior do que o índice de suicídio entre mulheres, considerando homens e mulheres de todas as idades.
Após a apresentação do slide 1, estimular os alunos a relatarem o que entenderam e a darem outros exemplos de padrões normativos de gênero e como eles se relacionam com outras características das pessoas (como classe, raça, idade, região de moradia).
Após a apresentação do slide 2, complementar explicando que homens têm maior possibilidade de fazerem uso abusivo de álcool e outras substâncias tóxicas, de se envolverem em brigas corporais, de fazerem uso da violência como forma de resolução dos problemas e de adotarem comportamentos agressivos no trânsito, como alta velocidade, manobras imprudentes e direção sob efeito de substâncias. E que, além disso, tendem a comportamentos de violência contra a mulher, quanto em relacionamentos heterossexuais.
Estimular que os alunos compartilhem o que entenderam e comentem, com as perguntas: vocês já sabiam disso ou se surpreenderam com esses dados? Você já viram comportamentos assim acontecerem com homens com quem vocês convivem?
Como exemplo de um comportamento de risco influenciado por padrões de gênero, projetar, no telão ou parede, um trecho da série This is Us, temporada 2, episodio 14, chamado “Domingo de super bowl” (do início até o minuto 5:31).
Esse trecho mostra o personagem Jack, homem branco, heterossexual, casado e pai, se responsabilizando pelo salvamento de toda a família durante um incêndio e depois, colocando sua vida em risco para salvar, ainda, o cachorro de sua filha, fato que acaba por repercutir em sua morte, na trama, pela grande inalação de fumaça.
Após a exibição do trecho, instigar os alunos a identificarem os padrões normativos de gênero na diferença de comportamentos do pai e do filho, da mãe e da filha. A partir dessa conversa, fazer o fechamento da aula.
Aula 3 - Os padrões normativos do que é ser homem em sua vida
1- Atividade de aquecimento (tempo estimado 5 minutos)
Com os alunos sentados em roda, convide-os a fazerem uma dinâmica de “pense rápido” e falarem brincadeiras e outras atividades que meninos não podem fazer. Oriente-nos a não pensarem muito, a ideia é falar a primeira coisa que vier a mente. A/o/e docente, posicionada/o/e em meio a roda, vai apontando um aluno por vez, de forma aleatória, e repetindo a frase “menino não pode…” que deve ser completada por cada um. A/o/e docente deve estimular que os alunos sejam rápidos na resposta. Para isso, pode pular o aluno que não responder imediatamente quando chamado, voltando a ele posteriormente. Pode-se fazer uma segunda rodada, caso haja tempo.
O objetivo é estimular, de forma divertida, o explicitar dos estereótipos e normativas de gênero que atravessam o cotidiano dos alunos, preparando-os para a atividade de reflexão individual que farão.
2- Atividade de reflexão individual seguida de discussão grupal (tempo estimado: 10 min.)
Convidar os alunos a assistirem um trecho do documentário The Mask You Live In.
- Minuto 10:12 ao 12:29
Projetar o filme no telão ou parede. Nele um rapaz relata sobre como sentiu o peso da cobrança por se tornar “macho” quando entrou na adolescência, destacando uma experiência que teve na escola. Ele relata que começou a sofrer bullying, sendo chamado de mulherzinha e veado, e que se defendeu disso mudando seu comportamento e se afastando de um grande amigo que era ainda mais alvo de perseguição dos demais meninos.
Após a exibição do filme, convidar os alunos a compartilharem o que entenderam. Perguntar: vocês se lembram de ver algo semelhante acontecer perto de vocês? Explorar as respostas, perguntando mais detalhes das experiências que contarem.
3- Atividade de reflexão individual, seguida de discussão grupal (tempo estimado: 35 min.)
Projetar ou escrever no quadro branco a seguintes questões: Qual foi a primeira vez que você ouviu a ordem “seja homem!” ou “vira homem!” ou “haja como um homem!”? Conte:
- Que idade você tinha?
- Quem te disse isso?
- O que estava acontecendo?
- O que você estava fazendo?
- Onde você estava?
Distribuir fichas de papel e canetas e solicitar que os alunos respondam a essas questões individualmente e de forma silenciosa, refletindo sobre elas, sem se identificarem no papel. Informar que eles terão 10 minutos para responderem.
Depois, recolher as fichas, embaralhá-las e redistribuí-las, uma para cada aluno, buscando garantir que nenhum fique com sua própria ficha. Solicitar que cada um leia a ficha que recebeu e comente. Explicar que o aluno “dono” da ficha pode se manifestar se quiser, mas que a identificação não é necessária. É preciso cuidar para que os alunos não façam o movimento de tentar descobrir o autor das respostas, gerando constrangimento aos autores de cada ficha de respostas. Estimular os comentários sobre as fichas lidas, perguntando: Essa situação já aconteceu com você ou com alguém próximo a você? Como você acha que esse aluno se sentiu nessa situação narrada?
Depois que todos tiverem lido as fichas, estimular a discussão sobre o que ouviram e sobre a relação de suas respostas com o trecho do documentário assistido. As seguintes perguntas podem ser disparadores de discussão: Quais semelhanças vocês observaram nas respostas? Porque vocês acham que as pessoas disseram isso para vocês, onde elas aprenderam essas ideias? As pessoas que disseram para vocês “agirem como homem” foram homens ou mulheres? Faz diferença o gênero da pessoa que falou isso para vocês? Por quê? Quais semelhanças vocês percebem entre o que relataram nas respostas e o trecho do documentário que assistimos?
A partir do desenrolar da discussão, fazer o fechamento da aula.
Aula 4 - Rompendo o silêncio
1- Atividade de aquecimento (tempo estimado 5 minutos)
Em roda, solicitar que os alunos fiquem em pé e, virando-se um de frente para as costas do outro, que façam um pouco de massagem nos ombros do colega que está à frente. Contar o tempo de um minuto e solicitar que eles se virem para o outro lado, repetindo o movimento, isto é, fazendo massagem no colega que está do seu outro lado. Contar mais um minuto e encerrar a atividade.
Essa atividade busca romper o distanciamento físico que os homens guardam com relação ao corpo de outro homem, bem como experimentar esse contato com uma ação prazerosa. Com isso, podem se preparar para as reflexões relacionadas aos sentimentos, que serão foco da aula.
2- Atividade de reflexão individual (tempo estimado: 45 min.)
Convidar os alunos a assistirem um trecho do documentário “O Silêncio dos homens”. Projetar do início até o min 7:05. Nesse trecho, diferentes homens fazem relatos sobre o processo de entrar em contato com as emoções, nomear sentimentos e se abrir para conversar sobre isso, evitando o processo de silêncio dos homens que gera efeitos negativos em sua saúde mental.
Após a exibição do trecho, entregar aos alunos pedaços de papel e orientá-lo a escrever relatos completando a frase: Eu sofri quando… Oriente-os a escrever quantas situações desejarem mas, pelo menos, uma cada um. Oriente-os de que a tarefa é individual e deve ser feita em silêncio e respeitando a privacidade do colega. Após escreverem, devem dobrar o papel, de modo que não seja possível ler o que está escrito nele. Dar 3 minutos para que façam isso.
Depois, recolher os relatos e juntá-los a outros, preparados previamente, em que esteja escrito algumas situações difíceis, como: Sofri quando fui chamado de gordo; sofri quando meu pai me bateu; sofri quando não consegui tirar nota boa; sofri quando fiquei sozinho no recreio. É importante ter alguns relatos preparados previamente para o caso de alguns alunos se recusarem a fazer ou para o caso de poucos participantes e, consequentemente, poucos papéis. Também podem ser preparados papéis previamente no caso de se querer garantir a abordagem de algum assunto. Embaralhar esses papéis e reservar.
Entregar a cada um deles, um copo descartável. É preciso que seja um copo descartável bem maleável, facilmente rasgável, pois é isso que será feito. Explicar aos alunos que a/o/e docente irá ler cada um dos relatos, que estão nos papéis e que, ouvindo cada um dos relatos, cada vez que o que for lido for algo que eles também sentiram ou passaram, eles devem fazer um rasgo no copo, abrindo sua boca até o final. Assim, posicionada/o/e no meio da roda, a/o/e docente deve pegar um relato por vez e lê-lo, dando o tempo para que os alunos rasguem seu copo. Ao final, solicitar que os alunos olhem ao redor e observe os copos de todos. Convide-os a perceber que muitos copos estão com muitos rasgos. E convide-os a refletir que, algumas vezes, achamos que algo que se passa conosco acontece apenas com a gente, mas, muitas vezes, esses sentimentos são também vividos por outras pessoas. Com essa dinâmica, os alunos conseguirão se conectar com os sentimentos uns dos outros sem terem que falar sobre esses sentimentos diretamente, algo que demanda mais tempo de trabalho para ser conquistado.
Depois, retome a leitura de cada papel e instigue os alunos a nomearem os sentimentos envolvidos nas situações que relataram nos papéis. Por exemplo, caso algum papel traga como relato: sofri quando mudei de cidade, pergunte aos alunos quais sentimentos estão envolvidos numa mudança de cidade. Instigue-os qualificar o máximo possível esses sentimentos. Por exemplo, se disserem medo, pergunte: medo de quê? de não fazer novos amigos? de não se adaptar? Fazer isso para cada um dos papéis, buscando abarcar todos até a finalização do tempo da aula.
Aula 5 - Desigualdade de gênero e o assédio às mulheres
1- Atividade de aquecimento (tempo estimado 15 minutos)
Projetar um trecho do filme “Eu não sou um homem fácil”.
- Minuto 2:21 até o minuto 12:37
Convidar os alunos a assistirem prestando muita atenção na relação entre homens e mulheres. Nesse filme, o personagem principal, que é um homem com comportamentos machistas bastante típicos, após ter um acidente, acorda em um mundo em que as mulheres é que dominam e os homens são submissos.
No trecho selecionado para exibição, o personagem aparece antes e logo depois do acidente, de modo a deixar muito explícito, de modo cômico, o quanto a desigualdade de gênero desvaloriza e objetifica as mulheres. Após exibição do trecho, convidá-los a comentar o que entenderam, com perguntas que os auxiliem a identificar e nomear as desigualdades de gênero mostradas no filme.
Por exemplo:
- Como era o comportamento dele no início do filme?
- O que mudou quando o mundo se inverteu e as mulheres estavam dominando?
- O que aconteceu quando ele saiu na rua?
- Vocês observaram o que estava escrito atrás da calça do personagem, depois que ele acordou no mundo “invertido”?
- Como as mulheres do seu ambiente de trabalho reagiram à entrada dele no ambiente? Vocês notaram que as roupas dele passaram a ser observadas?
- Ele parecia satisfeito ou incomodado com as cantadas das mulheres?
2- Atividade de reflexão em grupo (tempo estimado: 35 min.)
Essa atividade visa levar à compreensão dos diferentes tipos de violência à mulher, enfocando a objetificação e o assédio como formas de violência, a partir da discussão de notícias reais e atuais de assédio. Para isso, dividir os alunos em 4 trios ou grupos e para cada grupo entregar uma notícia diferente.
Sugere-se as notícias:
- “Motorista culpa jovem por assédio: ‘Estava com short tipo Anitta’”
- “97% das mulheres dizem que já sofreram assédio no transporte público e privado no Brasil, diz pesquisa”
- “Para 27% dos universitários, abusar de garota bêbada não é violência”
- “Alunas de escola de Santa Catarina são proibidas de usarem shorts pela direção”
Solicitar que os alunos leiam as matérias nos pequenos grupos, dando a eles o tempo de 5 minutos para isso. Depois, com todos em roda, solicitar que cada pequeno grupo relate sobre a notícia que leu aos demais. Durante esse relatar, explore os relatos com perguntas, de forma a estimular que os alunos se atentem para trechos ou conceitos importantes para a compreensão da cultura do machismo, como o de objetificação da mulher.
Além disso, estimule que eles exercitem seu pensamento crítico sobre as temáticas, buscando problematizar noções machistas sobre o comportamento das mulheres que estão ligadas à cultura do estupro com perguntas como:
- Vocês consideram que quando uma mulher está com uma roupa curta ela está pedindo para ser “cantada” ou assediada?
- Vocês acham que uma “cantada” é um elogio para a mulher?
- Vocês concordam com os 27% dos entrevistados na pesquisa que acham que uma mulher bêbada pode ser violentada por estar bêbada?
- Vocês já tinham parado para pensar que homens comuns, como estudantes universitários, são capazes de praticar o estupro?
- Você já presenciaram um homem xingar ou hostilizar uma mulher porque ela não aceitou uma investida dele?
- Vocês já ouviram dizer que mulher diz não querendo dizer sim, porque tem que se fazer de difícil?
Ao final da discussão, deixar aos alunos uma tarefa de casa: oriente-os a conversarem com mulheres do seu convívio - mãe, irmãs, tias, avós, amigas, professoras etc. - sobre as situações de cantadas e assédio às quais já foram submetidas. Solicite que eles peçam alguns detalhes às mulheres: que tipo de assédio foi, onde elas estavam, o que fizeram.
Peça, ainda, para eles perguntarem se essas mulheres se preocupam com a roupa que vão vestir pensando no risco de estupro e se elas evitam ir a alguns lugares em determinados horários por medo de estupro. Solicitar que cada aluno converse com, pelo menos, uma mulher de seu convívio.
Aula 6 - Violências contra a mulher e Dia Internacional da Mulher
1- Atividade de aquecimento (tempo estimado 10 minutos)
Relembrar a atividade deixada como tarefa de casa na aula anterior e solicitar que os alunos apresentem os relatos que ouviram. Deixar que cada aluno conte o que “pesquisou” e, durante esses relatos, estimular que eles perguntem uns aos outros questões sobre os relatos feitos. Fechar esse momento convidando-os a perceber que o assédio e a violência contra a mulher está entre nós, em nosso cotidiano.
2- Atividade de reflexão em grupo (tempo estimado: 10 min.)
Exibir um trecho do documentário “Precisamos falar com os homens?”
- Minuto 34:35 até o 36:33
Nesse trecho uma estudante relata uma violência sofrida por ela pelo recebimento, pelo celular, de mensagens de assédio, enviadas por um colega da escola, nas quais ela era tratada como um objeto. A partir disso, convidar os alunos a compartilhar o que entenderam, estimulando-os a relacionar isso com o que acontece na escola deles, com perguntas como:
- Que tipo de violência foi essa sofrida pela menina?
- Qual o impacto que as mensagens tiveram nela, ela se sentiu elogiada?
- “Vocês já viram algo semelhante acontecer nessa escola?”
- “Vocês já pararam para pensar na forma como vocês se referem às meninas?”
Para esse momento, é importante se preparar previamente procurando saber se alguma situação de assédio havia acontecido na escola nos últimos anos, pois casos de gravação de vídeos ou fotos e compartilhamento desses conteúdos sem o consentimento têm se tornado comuns e ganham muita repercussão quando acontecem.
Assim, muito facilmente um relato sobre uma situação vivida na escola pode se tornar uma conversa estigmatizada e cristalizada sobre vítima e culpado, algo que é preciso estar preparada/o para desconstruir e problematizar, no sentido da identificação das estruturas do machismo que nos atravessam e nos moldam.
3- Exposição sobre os tipos de violência contra a mulher e sobre o Dia da Mulher (tempo estimado: 10 min).
Com a apresentação de slides ou apoio do quadro branco, apresentar aos alunos os conceitos de violência física, verbal e psicológica, É importante, nessa explicação, relacionar os tipos de violência com situações típicas do cotidiano escolar, como dominação dos meninos em discussões quando o assunto é esportes ou mesmo dos espaços esportivos da escola, as “piadas” sobre a aparência das meninas, a objetificação das meninas em conversas privadas de meninos etc.
É muito importante, nessa apresentação, ressaltar que o machismo não é “coisa” de homem, apenas, pois sendo estrutural, ele atravessa e influencia os comportamentos de meninos, meninas e menines, o que explica algumas meninas terem comportamentos machistas, que reforçam a violência de gênero.
Importante, também, citar dados da violência doméstica no Brasil e a Lei Maria da Penha. Também pode ser muito rico apresentar as iniciativas de luta contra a violência de gênero que envolvem os homens, como o movimento He for She e a campanha “O Valente não é Violento” da ONU Mulheres. Esses movimentos têm slogans interessantes e personalidades públicas respeitadas, que convidam os meninos a se perceberem como parte da desconstrução da violência contra as mulheres.
Vale preparar-se para responder questões sobre os conceitos como manterrupting, bropriating, mansplaining e gaslighting, que estão circulando nas redes sociais. Por fim, apresentar a origem do Dia Internacional da Mulher, explicando seu caráter de luta pela igualdade de gênero e ressaltando como ele tem sido utilizado como mais uma forma de reforçar a desigualdade de gênero, em mensagens publicitárias que falam, por exemplo, de uma suposta capacidade natural da mulher de cuidar e oferecem à mulher serviços de estética. Pode ser interessante selecionar algumas peças publicitárias da cidade em que será realizada a aula para os alunos se conectarem com a discussão.
4- Atividade de reflexão e intervenção coletiva (tempo estimado: 20 minutos)
Convidar os alunos a responderem, individualmente, as questões:
- O que você acha que os alunos podem fazer na escola para não reproduzirem comportamentos que ofendem, objetificam ou desvalorizam as alunas?
- O que você pode fazer todos os dias para ser um homem que respeita as mulheres?
Entregar cartolinas e orientar que respondam às questões nas cartolinas, de modo a construírem cartazes coletivos que serão colados em algum ponto da escola em que todas/os possam ver, se configurando em uma intervenção. Caso seja possível, é interessante que essa intervenção aconteça próximo ao Dia Internacional das Mulheres.
Recursos Necessários
Materiais:
- Sistema de áudio e vídeo
- Quadro branco
- Papeis sulfite
- Lápis de cor
- Canetinhas coloridas
- Cartolinas
- Canetas ou lápis para escrever
- Fita adesiva
- Copos descartáveis
- Papel pardo
Filmes:
- Meetup Pourriat, E. (Dir.). (2018). Eu não sou um homem fácil [Longa-metragem; Streaming]. França: Netflix. Disponível na Netflix. Ribeiro, D. (Dir.). (2010).
- Eu não quero voltar sozinho [Curta-metragem; Streaming]. São Paulo: Lacuna Filmes. Disponivel em: https://www.youtube.com/watch?v=1Wav5KjBHbI&ab_channel=
- Precisamos Falar com os homens? Documentário produzido pela ONU Mulheres, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=jyKxmACaS5Q&ab_channel=ONUMulheresBrasil
- O silêncio dos homens, documentário produzido pelo Papo de Homem, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=NRom49UVXCE&ab_channel=PapodeHomem
- The mask you live in, documentário dirigido por Jennifer Siebel Newsom, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=k4yFShxUb2E
- Fogelman. D. (Dir.) (2016). This is Us [Série; streaming]. EUA: Amazon Prime Video - Episódio 14 da temporada 2. Disponível no Amazon Prime Video.
- Baroni, G. (Dir.) (2020). Alice Junior [Longa-metragem; Streaming]. Brasil: Netflix. Disponível na Netflix.
Duração Prevista
Processo Avaliativo
Espera-se uma transformação no sentido de identificação dos diferentes aspectos e manifestações das desigualdade de gênero, bem como no sentido da legitimação das expressões e vivências das masculinidades não hegemônicas.
Observações
Referências Bibliográficas
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