Relato de experiência “Sete Mulheres”

Estado: Santa Catarina (SC)

Etapa de Ensino: Ensino Fundamental II

Modalidade: Educação Regular

Disciplina: Artes, Sociologia

Formato: Presencial

Essa proposta surgiu a partir de encontros e rodas de conversa com as adolescentes vinculadas na Instituição CEDEP (Centro de Educação Popular). A instituição é uma OSC (Organização da Sociedade Civil) que atua no desenvolvimento integral da criança e do adolescente no turno inverso da escola, promovendo reflexões e discussões sobre pautas sociais, principalmente sobre situações vivenciadas por esses educandos no dia a dia. Nesses encontros foram surgindo assuntos vinculados ao "meu eu feminino” e todas as dúvidas e questionamentos sobre: o que é ser mulher em nossa sociedade?, o que a sociedade espera ou projeta em cima da mulher? E quais os desafios que enfrentamos todos os dias nos espaços como a escola, ou na rua. Esse trabalho foi desenvolvido com sete meninas, que trouxeram em seu roteiro as temáticas como abuso sexual, importunação sexual, a mulher negra na sociedade, formas de assédio e liberdade de expressão dentro dos espaços educativos, formais, informais e não formais.

A experiência

A experiência foi realizada por meio de rodas de conversa com adolescentes a respeito do que é ser mulher em nossa sociedade, do que é esperado e projetado para as mulheres, e quais desafios enfrentados no cotidiano em espaços como a escola, ou na rua. 

A partir de tais reflexões, o grupo realizou uma leitura crítica da realidade, analisando nossos comportamentos e da sociedade, principalmente no sistema patriarcal. 

As temáticas abordadas foram: abuso sexual, importunação sexual, a mulher negra na sociedade, formas de assédio e liberdade de expressão dentro dos espaços educativos. 

Como resultado, foi produzido um vídeo com as sete adolescentes do grupo, trazendo suas falas e vivências por meio da arte e da dança, a fim de mobilizar a reflexão e ampliar o diálogo sobre as temáticas.

Pessoas envolvidas

Foram sete adolescentes mulheres.

Relato da experiência

A experiência nasceu a partir de demandas trazidas pelas próprias adolescentes, pois em seus relatos, havia muitas dúvidas e indignações sobre como estavam sendo vistas nos espaços educativos. Como com a  proibição de utilizar roupas como shorts, a imposição de posturas “adequadas” nesses espaços, e rótulos de como elas deveriam se vestir, e se portar em algumas situações do dia a dia; bem como advertências verbais “isso não é forma de menina, falar…” entre outras.

Com esses questionamentos, resolvemos trabalhar em rodas de conversa com as adolescentes sobre temáticas como liberdade de expressão, o que a sociedade projeta nas mulheres. E aos poucos, a experiência foi se ampliando e as rodas de conversas se tornaram mais complexas. Fomos, então, refletindo e acolhendo feridas e angústias vivenciadas pelas adolescentes, chegando a assuntos como abuso sexual, toques indevidos/indesejados de colegas e pessoas da família e de que forma essas mulheres negras percebiam essas violações.

Nossa atuação visa educarmos nossos jovens para a vivência em sociedade, com qualidade de vida. Porém, a realidade na qual atuamos, é uma realidade perversa com os jovens, visto que estamos em território de altos índices de violência, identificados pelo narcotráfico e de grande vulnerabilidade social. Segundo Cezar e Silva (2021), o Monte Cristo (SC) lidera o ranking de criminalidade e tráfico de drogas da cidade. Dentro de comunidades periféricas, a inserção dos adolescentes e jovens em espaços de criminalidade tem sido perpetuada e naturalizada, gerando um ciclo geracional, no qual a relação com o narcotráfico se mostra como alternativa possível para famílias da região.

Sendo assim, nossos jovens e adolescentes carregam em suas vivências grande peso histórico, que através da resistência, trabalhamos diariamente para que esses atravessamentos não interfiram nos seus direitos como sujeitos.

Estratégias adotadas

As estratégias foram as rodas de conversa, por meio das quais as educandas expressavam-se livremente através do diálogo das suas intenções e vivências. As rodas eram realizadas em todos os encontros. Com isso, as adolescentes sentiram-se livres para expressar seus sentimentos por meio da poesia, da dança e encontraram um novo grupo com identidade e identificação. 

Como processo de desenvolvimento na construção do vídeo, tivemos a preparação do roteiro, realizado por elas. Logo após, foi a preparação da coreografia, que foi realizada dentro da oficina de dança, tendo dois encontros semanais. A gravação foi realizada em 2 momentos: no 1º momento interno no teatro da instituição, por onde as estudantes gravaram as suas falas e trabalharam a parte de autoestima feminina, no 2º momento foi realizada uma gravação externa através da dança. A edição foi realizada pela educadora responsável, e também por uma educanda que dominava as técnicas de edição vídeo e áudio.

E por fim, a apresentação de todas as educandas para a instituição, junto com a coreografia trabalhada. Esse processo ocorreu entre o mês de abril até o mês de novembro e trouxe significativas aprendizagens para todas. Segue o link do vídeo realizado: https://youtu.be/dijh27t8hjU

Dificuldades encontradas

Os desafios encontrados foram através das nossas conversas, pois a cada encontro desencadeamos episódios vivenciados com cada adolescente, assim, cada uma foi sentindo confiança no grupo, para relatar experiências que passaram em suas vidas, trazendo angústias e decepções vindas principalmente no campo familiar, referenciando a figura masculina. Com isso, os educadores mediadores, observando a mobilização do grupo, convidaram profissionais da área da psicologia para o acolhimento dessas angústias/dores e também para mediação nas estratégias para o desenvolvimento psíquico das adolescentes, para que não tivéssemos nenhum prejuízo ou alterações em seus comportamentos, cuidando da saúde mental das envolvidas e também dos próprios educadores.

Outro desafio foi retratar sobre esse assunto no ambiente educacional, visto que tivemos resistências dos profissionais ao lidar com a temática. Com isso, trouxemos o vídeo para uma ação na instituição que chamamos de Fechamento de Eixo, por meio do qual todos(as) os educandos(as) e também educadores estavam presente, para fazermos um momento de reflexão sobre essas práticas e pensarmos em como podemos expandir a consciência, para compreender o espaço da mulher sem determinações e nem limites.

Principais aprendizagens

Pensando dentro da área das ciências humanas, as adolescentes envolvidas aprenderam a autonomia do “eu feminino”, na compreensão de que cada mulher tem formas e jeitos diferentes. E também aprenderam a dizer não e impor limites para comportamentos que ferem o íntimo, além de saber pedir ajuda quando necessário, principalmente quando se sente só. Utilizamos a dança, a arte, a escuta e a fala como práticas terapêuticas para lidar com os problemas sociais, como forma de identificação no mundo.

Aprenderam a empatia para que outras mulheres não passem pelas mesmas dificuldades que essas adolescentes passaram, e saibam se defender e procurar seus direitos, sem serem oprimidas.

Dentro do campo do ensino, as adolescentes aprenderam o contexto histórico da mulher, direitos e deveres e a dominação de uma sociedade patriarcal, bem como consciência de classe. Como resultado houve o aumento na procura de discussão desses assuntos pelos educadores com mais criticidade e, em outras turmas, uma maior elevação de denúncias de casos ao setor psicossocial da instituição.

Referências Bibliográficas

CEDEP: Centro de Educação e Evangelização Popular, 2023. Disponível em: https://cedeponline.com.br/ . Acesso: 30 abril 2023.

CINELLI, Nair Pereira Figueiredo et al. A influência do vídeo no processo de aprendizagem. 2003.

DA SILVA, Maria Marlene; DA SILVA CEZAR, Rafael. PROJETO AVANÇAR: PERSPECTIVA SOCIAL DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL POPULAR NO TERRITÓRIO DO MONTE CRISTO EM FLORIANÓPOLIS/SC. UÁQUIRI-Revista do Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade Federal do Acre, v. 3, n. 1, p. 11-11, 2021.

DE FIGUEIRÊDO, Alessandra Aniceto Ferreira; DE QUEIROZ, Tacinara Nogueira. A utilização de rodas de conversa como metodologia que possibilita o diálogo. 2012.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987

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