Clube de Leitura Black Girls

Estado: São Paulo (SP)

Etapa de Ensino: Ensino Médio

Modalidade: Educação Regular

Disciplina: História, Língua Portuguesa

Formato: Híbrido

Ana Caroline Gonçalves, natural de Paulínia, SP, é uma pedagoga de 26 anos. Embora tenha tido apenas um contato superficial com a literatura em sua juventude, foi na idade adulta que conseguiu incorporar a leitura como parte essencial de sua vida.

Amanda, uma jovem de 16 anos, faz parte do Coletivo Black Girls. Suas paixões incluem a dança e o desenho, e, neste momento, ela está em busca do seu projeto de vida, explorando as possibilidades que o futuro reserva.

Ana Clara Fernandes Nascimento, aos 17 anos e natural de Sumaré, é uma entusiasta da dança, escrita, leitura e estudos sobre política e movimentos sociais. Sua jornada como ativista iniciou em 2021, quando recebeu o convite para se unir ao Clube de Leitura Black Girls. Sempre movida pelo desejo de impactar positivamente a sociedade, Ana Clara encontra imensa satisfação ao testemunhar o notável crescimento do Clube, que agora se tornou um elemento essencial em sua vida.

Ruan Coutinho é um jovem de 18 anos e estudante do Colégio Pei Luiz Campo Dall'Orto Sobrinho. Reconhecido por sua comunicação habilidosa e vontade de aprender, Ruan é um entusiasta de interações sociais e muito prestativo. Em 2022, Ruan teve a oportunidade de se juntar ao coletivo Black Girls, o que ampliou sua compreensão sobre os desafios sociais de longo prazo que a sociedade enfrenta. Sua missão de vida se consolidou com o desejo contínuo de fazer a diferença na sociedade. Participar do coletivo permitiu a Ruan se aceitar e explorar mais profundamente sua própria origem, especialmente através da leitura de obras de autores negros e suas histórias inspiradoras. Ele acredita que essas experiências transformadoras influenciaram sua perspectiva sobre a vida e o mundo em que vivemos. Ruan considera importante o esforço coletivo para disseminar livros de grande relevância e, entre as atividades do coletivo, destaca as intervenções escolares e entrevistas com escritores negros na escola como momentos inspiradores que o motivam a continuar seu envolvimento com o coletivo.

Eliana Cristo é Professora de História na Rede Estadual de Sumaré, na Escola Luiz Campo Dall'orto Sobrinho. Licenciada em História pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – Campus – Aquidauana), com 24 anos de experiência no ensino. Com 50 anos, ela não apenas se destaca na sala de aula, mas também é uma ciclista entusiasta e uma apaixonada por livros. Durante sua carreira como professora, Eliana tem se destacado por sua abordagem inovadora, focando em projetos, Iniciação Científica e ações que promovem o protagonismo e a liderança dos jovens. Atualmente, um de seus projetos notáveis é o "Clube de Leitura Black Girls", uma iniciativa coletiva em parceria com a professora Ana Caroline Gonçalves da Sala de Leitura. Este clube utiliza a literatura como uma ferramenta para aplicar a Lei 10.639/03, destacando as narrativas e histórias de escritoras negras. Eliana acredita que referências positivas inspiram e transformam vidas.

EXPLIQUE A EXPERIÊNCIA BREVEMENTE

No ano de 2022, um grupo de estudantes do Ensino Médio e mais duas professoras da Escola Estadual Luiz Campo Dall’orto Sobrinho, localizada na cidade de Sumaré-SP, criou um Clube de Leitura denominado “Black Girls”. O objetivo desse clube era incentivar a leitura de obras escritas por autoras negras, as quais faziam parte do acervo da Sala de Leitura da escola, mas que não tinham visibilidade entre as alunas.

 

Simultaneamente, o coletivo empreendeu ações para adquirir novas obras de escritoras negras, as quais seriam adicionadas ao acervo escolar. O grupo chegou à conclusão de que essa iniciativa era uma necessidade premente a ser abordada no ambiente escolar, uma vez que as estudantes negras compunham a maioria dos alunos na Escola Estadual Luiz Campo Dall’Orto Sobrinho e vivenciavam diariamente a escassez de referências positivas relativas a outras mulheres negras. De maneira geral, as estudantes negras não prosseguem com seus estudos após o Ensino Médio, muitas vezes devido a casamentos precoces ou à entrada precoce no mercado de trabalho.

QUAIS SÃO OS ATORES ENVOLVIDOS?

Estudantes do Ensino Médio (1ª, 2ª e 3ª série), docentes, funcionários e gestores da Unidade Escolar

RELATO DA EXPERIÊNCIA

No Brasil, as mulheres negras ainda constituem a maioria que luta pela sobrevivência e por uma vida digna, muitas vezes desempenhando atividades domésticas, apresentando baixa escolaridade e assumindo frequentemente o papel de chefes de família. As crianças e jovens que vivenciam práticas que valorizam os seus conhecimentos, origens e oralidade desenvolvem uma autoestima positiva em relação a si mesmas. Conforme apontado por Joice Berth, é indiscutível que, sem o fortalecimento da autoestima, não conseguiremos iniciar sequer um processo lúdico de empoderamento, isso contradizendo a banalização conceitual do termo (2018, p. 93).

A disponibilização de uma educação que englobe a cultura afro-brasileira, a história da África, as conquistas de mulheres negras, cientistas, escritoras e empreendedoras pode influenciar os sonhos e perspectivas de adolescentes negras. Tendo em vista as demandas das estudantes negras da Escola Luiz Campo Dall’Orto Sobrinho, bem como a conscientização de que a Lei 10.639/03 deve ser implementada diariamente na escola, este relato apresenta as iniciativas do Clube de Leitura “Black Girls”. Selecionamos a literatura produzida por mulheres negras como um instrumento de emancipação e oportunidades para motivar as estudantes negras de uma escola pública a prosseguirem nos estudos, buscando referências positivas no âmbito da leitura, escrita e utilizando sua própria voz como estratégia de resistência.

Apesar de haver uma legislação em vigor, a inclusão de escritoras negras e da literatura negra nos currículos escolares brasileiros ainda não alcançou o ideal. A lei não direciona explicitamente o trabalho em sala de aula para se basear nas narrativas das mulheres negras. A literatura pode tanto reforçar estereótipos quanto desconstruí-los, e, conforme aprendemos com Conceição Evaristo, as vivências de uma mulher negra podem estabelecer laços de identificação. Com base nesses princípios, o Clube promoveu, em 2022, a leitura de livros e organizou eventos virtuais na plataforma Google Meet/YouTube intitulados “Café Literário”, em parceria com a Sala de Leitura da Escola PEI Luiz Campo Dall’Orto Sobrinho.

Adicionalmente, o clube promoveu outras atividades, tais como rodas de leitura, conversas com escritoras, oficina de escrita criativa presencial com a escritora Cidinha da Silva e outra oficina de escrita via Google Meet com a escritora Simone Ricco do Rio de Janeiro. Foram produzidos cartazes e textos sobre a vida das escritoras negras, bem como camisetas e marcadores de páginas destacando o rosto ou obras das autoras. Além disso, o prêmio “Leitor do Mês do Clube de Leitura — Black Girls”, realizado em conjunto com a Sala de Leitura da escola, promoveu rifas, sorteios e uma arrecadação online para levar 18 estudantes da escola, para participar da 20ª Flip (Feira Literária Internacional de Paraty) no Rio de Janeiro.

O Coletivo elaborou uma agenda de conversas com escritoras negras e concebeu estratégias de divulgação entre os alunos. Foram adquiridos novos livros de autoras negras e, na Sala de Leitura da escola, uma estante vermelha foi destinada para expor todos os livros de autoras negras, autores negros e indígenas. Como resultado dessas ações, o número de empréstimos de livros de autoras negras na Sala de Leitura aumentou de 34 livros no primeiro semestre de 2022 para 233 empréstimos no segundo semestre de 2022. A escola alcançou o primeiro lugar em redação no Saresp de 2022 na Diretoria de Sumaré-SP. Diante desses resultados, foi possível compreender que “um corpo negro educa e transforma” e que os “livros de mulheres negras precisam sair das estantes e suas histórias devem ser compartilhadas”, deixando de ocupar apenas um lugar periférico e ocupando uma posição central.

ESTRATÉGIAS ADOTADAS

Para desenvolver essa experiência, a primeira ação realizada foi estabelecer uma parceria com a professora da Sala de Leitura, seguida de um levantamento dos títulos disponíveis e suas quantidades. O grupo foi formado, e reuniões de planejamento foram conduzidas. Uma contribuição significativa foi a descoberta do Edital Público “Tô no Rumo”, com a proposta sendo selecionada. O clube elaborou um cronograma de atividades para 2022, planejando o primeiro semestre e executando as ações no segundo semestre. Foram selecionados dois autores com obras na Sala de Leitura: Cidinha da Silva e Sergio Vaz. Além disso, foram escolhidas três autoras cujas obras não estavam presentes no acervo: Valéria Lourenço, Bianca Santana e Simone Ricco.

Com base nessa seleção, foram desenvolvidas ações para promover, no ambiente escolar, as trajetórias de vida e os livros publicados pelos escritores. O coletivo organizou camisetas e marcadores de página com fotos, nomes e capas dos livros dos escritores, estabeleceu uma presença na plataforma Instagram, confeccionou cartazes, conduziu rodas de conversa na Sala de Leitura sobre os livros. Também realizou transmissões ao vivo via YouTube, com mediação dos alunos, contando com a participação de Cidinha da Silva e Bianca Santana. Além disso, foi instituído o Prêmio “Leitor do Mês Black Girls”, com reconhecimento para os alunos que mais se destacassem na leitura de autoras e autores ao longo do segundo semestre de 2022.

DIFICULDADES ENCONTRADAS

Inicialmente, foi essencial conquistar o apoio de todo o corpo docente e mobilizar as estudantes negras para participar do debate. O processo de autorreconhecimento como negra muitas vezes ocorre um pouco mais tarde para as jovens, frequentemente como uma maneira de proteção e tentativa de lidar com as violências provenientes do racismo. Tornar-se parte de um Clube de Leitura que promove a leitura de obras de autoras negras e aborda as violências enfrentadas pela população negra no Brasil, especialmente pelas mulheres e jovens negros, teve um significado profundo para alguns estudantes, que puderam afirmar: “sou negra/sou negro”. Com o crescimento do debate e o ganho de espaço e visibilidade na escola, o número de participantes aumentou de 6 estudantes para 22 em 2023.

PRINCIPAIS APRENDIZAGENS

No decorrer da implementação das ações do Clube de Leitura “Black Girls”, diversas lições foram valiosas, mas uma em particular se mostrou essencial: não basta apenas ter os livros nas prateleiras da Sala de Leitura; é crucial que os alunos conheçam as obras e as autoras negras, compreendendo suas histórias e narrativas. Outra percepção crucial é a de que o próprio corpo negro é um agente de educação. Ou seja, mostrar aos alunos negros que o conhecimento pode ser produzido por indivíduos negros, destacar o corpo negro em posições de destaque significa introduzir novas maneiras de interagir com o mundo e de pensar. Isso também implica em centrar o conhecimento nas perspectivas afrocentradas, promovendo a valorização da história negra no Brasil — um fator essencial para empoderar e fortalecer a autoestima dos jovens negros.

 

Nesse contexto, também é relevante capacitar os estudantes para atuarem como mediadores de leitura, fomentando espaços de compartilhamento, liderança e enfatizando que eles têm uma voz a ser usada para construir uma educação antirracista. Uma das maiores lições aprendidas é que explorar outras trajetórias e atuar em coletividade são elementos fundamentais para desafiar as estruturas que ainda excluem os jovens negros da Educação Pública no Brasil. No entanto, uma área que merece maior atenção é a promoção de mais atividades de escrita entre os estudantes

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei 10.639/03. Estabelece a obrigatoriedade do Ensino da História e Cultura afro-brasileira e africana em todas as escolas, públicas e particulares, do ensino fundamental até o ensino médio. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm. Acesso em: 01 mar. 2023.

BRASIL. Plano Nacional de Implementações das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e Indígenas. Disponível em: http://etnicoracial.mec.gov.br/images/pdf/diretrizes_curric_educ_etnicoraciais.pdf. Acesso em: 01 mar. 2023.

NASCIMENTO, Abdias. O genocídio do negro Brasileiro – processo de um racismo mascarado. 3ª ed. São Paulo: Perspectivas, 2016.

EUGENIO JUNIOR, Amauri. Por que mulheres negras são pouco valorizadas no mercado de trabalho? 2018. Disponível em: https://www.almapreta.com/editorias/realidade/por-que-mulheres-negras-sao-pouco-valorizadas-no-mercado-de-trabalho. Acesso em: 10 mar. 2018.

BERTH, Joice. O que é empoderamento? Belo Horizonte: Letramento, 2018. 112 p. Coleção Feminismos Plurais.

CARNEIRO, Sueli. Racismo, Sexismo e Desigualdade no Brasil: consciência em debate. São Paulo: Selo Negro Edições, 2011.

CARDOSO, Fracilene. O negro na Biblioteca: mediação da informação para construção da identidade negra. 1ª ed. Curitiba, PR: CRV, 2015.

DAVIS, Angela. A liberdade é uma luta constante. São Paulo: Boitempo, 2018.

DAVIS, Angela. Mulheres, Cultura e Política. São Paulo: Boi Tempo, 2017.

 

Publicações sobre o Clube de Leitura:

Dia do Professor: 7 ações inspiradoras realizadas por educadores. Portal Lunetas. Disponível em: https://lunetas.com.br/dia-do-professor-acoes-inspiradoras/?fbclid=IwAR2qxtPhc9yob4orBCbLmc8FUBAoYLY5cLW0ZXLa_a2KkyY4y9-fgS2qJ68. Acesso em: 01 mai. 2023.

Vídeo – Tô no Rumo – Ação Educativa: m Luta – Estudantes por um Ensino Médio de Qualidade! Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=VvxTedFjdEE. Acesso em: 01 mai. 2023.

Lives organizadas pelo Clube Black Girls no YouTube:

2º Edição – Café Literário com Cidinha da Silva. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=n9RyWLHwJJs. Acesso em: 01 mai. 2023.

2º Edição – Café Literário com Bianca Santana. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=fyEz4J3CYSg. Acesso em: 01 mai. 2023.

Vakinha online para levar o Clube de Leitura na 20ª Edição Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) em novembro de 2022 – Apoie o Clube de Leitura “Black Girls” na Flip 2022. Disponível em: https://www.vakinha.com.br/vaquinha/apoie-o-clube-de-leitura-da-ee-luiz-campo-na-flip-2022?fbclid=IwAR0SNoMQRYVEzL-NQJDQmiIsIj3D9gg9Vxwoi9NbjCKnwGIGOXZXQ1xZWiM. Acesso em: 01 mai. 2023.

Página no Instagram do Clube de Leitura Black Girls – https://instagram.com/cl_blackgirls?igshid=ZDdkNTZiNTM=. Acesso em: 01 mai. 2023.

 

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