Oficinas da liberdade: ressignificando a gravidez na adolescência

Estado: Rio de Janeiro (RJ)

Etapa de Ensino: Ensino Fundamental II, Ensino Médio

Modalidade:

Disciplina: Biologia

Formato: Presencial

Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Graduação em Licenciatura Plena em Ciências Biológicas - Faculdades Integradas Maria Thereza. Tem experiência na área de Ensino em Ciências e Biologia no Ensino Fundamental II e Ensino Médio. Atuação e áreas de interesse: Educação sexual desbiologizante na escola, Gravidez na Adolescência, Relações de Gênero, Masculinidades, Sexualidades e Interculturalidade. Professor Docente I Biologia e Ciências do Estado/RJ (Seeduc ). Especialista em Ensino de Biologia UERJ/FFP. Especialista em Ensino de Ciências e Biologia IBqM UFRJ. Especialista na Educação Básica em Biologia Colégio Pedro II- Programa Residência Docente. Integrante do Grupo de Pesquisa PROFEX na PUC-RIO de estudos sobre a Profissão, Formação e Exercício Docente.

Objetivos

O objetivo central consiste em compreender as percepções dos estudantes sobre as relações de gênero na escola, partindo do contexto da gravidez na adolescência. E contribuir para a construção de novas abordagens sobre o tema na escola, a partir das percepções das alunas e dos alunos.

E nos objetivos específicos:

  1. Aprofundar as reflexões sobre a gravidez na adolescência, a partir das relações de gênero, segundo as percepções dos estudantes;

  2. Identificar as percepções das alunas e alunos sobre a gravidez na adolescência e a influência da escola sobre o assunto;

  3. Verificar onde e como as alunas e alunos buscam informações sobre a gravidez na adolescência;

  4. Reconhecer qual o papel da família, suas percepções sobre a gravidez na adolescência e relações de gênero;

  5. Visibilizar as alunas e alunos pesquisados em suas adolescências na atualidade.

Conteúdo

O conteúdo desenvolvido no projeto aborda o tema da gravidez na adolescência, adolescências, sexualidades e estudos de gênero amparado no referencial teórico de Maria Heilborn, Michel Bozon e Guacira Louro.

Metodologia

A sequência didática foi realizada através de oficinas pedagógicas considerando quatro dimensões dessa prática pedagógica: ver, saber, comprometer-se e celebrar (CANDAU et al., 2013).

A primeira dimensão (ver) trata do respeito às vivências dos sujeitos envolvidos no processo; a segunda dimensão (saber) aborda a possibilidade do aprofundamento do conhecimento oriundo das trocas geradas ao longo do processo. Já a terceira dimensão (comprometer-se) fala sobre as mudanças geradas a partir da obtenção dos novos conhecimentos, ou seja, os participantes do processo encontram-se em uma nova possibilidade de posicionamento na vida. Por fim, a quarta dimensão (celebrar) aponta para o regozijo produzido pelo processo de ensino-aprendizagem.

O projeto abrange quatro oficinas pedagógicas voltadas para Estigmas e contrapontos da Gravidez na Adolescência; Relações de Gênero na Gravidez na Adolescência; Ser Adolescente e Onde buscar informações. As oficinas foram desenvolvidas em dois dias.

Oficina 1

Estigmas e contrapontos da gravidez na adolescência. Para tal processo, serão apresentados os conceitos de estigmas e contrapontos aos alunos sendo contextualizados com exemplos do cotidiano como preconceito, abandono escolar, redução no padrão de vida, conflitos familiares, risco à saúde, insuficiência de maturidade, pai adolescente não se envolve no processo, pobreza, amadurecimento, desejo como projeto de vida, liberdade, prazer, aproximação dos jovens com a família e alternativa para sair de casa. A partir disso, se inicia a oficina. Cada aluna e aluno receberá um bilhete, que armazena um estigma e um contraponto. Uma vez com o bilhete em mãos, as alunas e alunos lerão em voz alta cada palavra. A cada palavra lida, elas serão registradas no quadro branco da sala de aula para posteriores discussões sobre o assunto. Alguns eixos norteadores estarão presentes ao longo da mediação da oficina como: O que vocês pensam sobre isso? Concordam? Discordam? Todas as situações são assim?

A segunda etapa da primeira oficina abrange a análise de imagens, que apresentam estigmas e contrapontos da gravidez na adolescência. Os estudantes serão divididos em dois grupos, no qual cada grupo apontava o que cada imagem estava representando, segundo suas análises mediante os recursos discutidos ao longo da oficina. Enquanto as alunas e alunos vão descrevendo suas percepções, os debates vão sendo construídos entre os grupos. Os estudantes registrarão nas imagens (E) para estigma e (C) para contraponto. As imagens foram selecionadas a partir das características dos estigmas e contrapontos da gravidez na adolescência, frutos da revisão bibliográfica do estudo.

No final da oficina I, será apresentado um trecho do documentário Meninas, que permite uma nova retomada nas reflexões sobre os estigmas e contrapontos em relação a gravidez na adolescência. A primeira oficina pedagógica será encerrada com uma roda de debates, a partir de discussões sobre alguns trechos do documentário.

Oficina 2

O carro-chefe deste trabalho abrange os estudos de gênero com recorte sobre a gravidez na adolescência, portanto a segunda oficina pedagógica, "Relações de gênero na gravidez na adolescência", tem como finalidade apontar como esse processo manifesta-se através das percepções das alunas e alunos envolvidos nesta pesquisa. A oficina apresentará algumas questões norteadoras ao longo de sua realização como: A sociedade é igual para meninas e meninos? Quem constrói esses comportamentos? Eles devem ser rígidos ou flexíveis? Isso pode ser mudado?

Para tal atividade, as dinâmicas da oficina são divididas em três momentos: debates sobre casos reais, dinâmica dos balões-vivos (jargões nossos de cada dia) e ficha comportamental dos gêneros. Após a  apresentação para o grupo dos objetivos da oficina, neste primeiro momento, serão divididos em dois grupos com cada grupo recebendo um caso da vida real. Cada caso será analisado e, posteriormente, ocorrerão os debates.

O segundo momento da oficina pedagógica II começará com a entrega de um balão para cada aluno. Nisso, os participantes encherão o balão até ele estourar. Posteriormente, lerão as palavras encontradas nos seus respectivos balões. As palavras representam os jargões usados em nosso cotidiano, ou seja, expressões que nesse caso foram selecionadas, pensando-se nas relações de gênero do dia a dia: “Sou homem, pô", “Nasci para isso...é a minha vocação”, “Eu que trabalho aqui”,“Você que cuida da casa e das crianças “Eu trabalho aqui... Eu sustento a casa!", “Queria ver meu corpo 'funcionando'”, “Queria provar que sou homem”, “Queria casar com o homem amado”, ”Queria provar que sou mulher”, “Você fez...você cuida”, “Culpa da paixão”, “Já vai abrindo as pernas”, “Quem engravida é mulher”, “ Você não fica com ninguém... é viado” e “Você só anda com meninas... é lésbica”. O conceito de jargão será apresentado ao grupo.

Após isso, os alunos serão divididos em dois grupos, tendo cada grupo recebido duas tabelas para serem preenchidas com as respectivas palavras encontradas nos balões. Estas foram completadas segundo suas percepções de jargões usados voltados para o feminino/ masculino ou ambos.

No terceiro momento da oficina, os alunos serão apresentados à Ficha Comportamental (listagem com comportamentos diversos associados aos gêneros: cuidar das crianças, orientar sexualmente os filhos, trabalhar fora de casa, usar brincos, realizar trabalhos domésticos, ter docilidade e romantismo, embelezar-se, amamentar o filho no seio, ser elemento "central" na relação seja namoro ou sexual, defender o cônjuge, ter força física e coragem, manter economicamente o lar, dirigir caminhão, decidir sobre a anticoncepção, viajar sozinho, praticar esportes radicais, urinar em pé, ter espírito prático e objetivo, usar cosméticos e dançar balé). Este documento retrata comportamentos que acontecem no cotidiano, que são relacionados ao feminino ou ao masculino. A proposta da oficina consiste que cada grupo selecione, na tabela, os comportamentos de acordo com seus critérios sobre um comportamento associado ao feminino ou masculino. Posteriormente, as respostas serão debatidas pelos grupos ao longo da atividade e depois com o coletivo.

No total, os participantes serão divididos em quatro grupos. O primeiro dia de oficinas pedagógicas será encerrado com a construção de uma atividade feedback, onde cada aluno poderia escrever de um dos lados do papel, um sentimento pela participação na oficina e do outro lado como a escola deveria lidar com a gravidez na adolescência.

Oficina 3

O segundo e último dia da sequência didática se iniciou com a terceira oficina pedagógica, que tem como tema o levantamento das percepções dos alunos sobre sua própria adolescência. Através das oficinas pedagógicas, suas visões de mundo foram trazidas à tona, em relação a si mesmos e quanto aos seus pares.

A oficina tem como objetivo levantar as visões dos adolescentes em relação a si mesmos e em relação à adolescência. Para tal, em seu primeiro momento, os participantes da oficina selecionarão algumas frases de uma caixa de diálogo com informações que apontam “estigmas atrelados à adolescência”: (1) “Não têm nada na cabeça, não têm preocupação com o futuro, sequer ser alguma coisa”; (2)“ Estão perdidos devido à não preocupação com o estudo, com uma carreira e com o próprio futuro e a uma tendência a viverem a vida ligando-se apenas ao momento”; (3) “Viver a vida o mais que puder”; (4)“ Despreocupado politicamente, sem interesse pelos problemas sociais”; (5) “Escola: lugar para ascensão social através de um diploma ou um emprego”; (6) “Escola: lugar de passeio, convivência social, encontrar amigos e namorar”; (7)“ Os adolescentes têm muita liberdade”; (8) “Pais não sabem orientar os filhos adolescentes”; (9) “Autoafirmação da sua identidade... de quem são”; (10) “Eu acho que a adolescência de hoje está, de modo geral, muito desorganizada, muito desmiolada, eles não estão pensando muito na vida”; e (11) “só pensam em sexo, bebida e diversão, sem se preocupar com o futuro”.

Após a seleção de cada frase, os participantes serão direcionados a reflexões mediante algumas questões norteadoras: Você se identifica com isso? Todos adolescentes são iguais? Essa frase representa todos adolescentes? Como são os adolescentes? Essas questões são vividas da mesma forma pelas alunas e pelos alunos?

Após esse momento, os alunos serão apresentados a algumas imagens do país Moldávia. A escolha desse tema ocorreu a partir do estudo do livro “Sexualidade adolescente como direito?” da autora Vanessa Leite (2013). A autora usa a realidade desses adolescentes como forma de visibilizar a variedade de vivências que podem existir na adolescência. A tarefa inicial, para ambos os grupos, consistirá no registro de suas percepções sobre cada imagem, ou seja, os integrantes do grupo deverão registrar suas particularidades ao contemplarem as imagens expostas. Vale destacar que nenhuma informação neste momento foi fornecida ao grupo sobre aquele país. Isso aconteceu posteriormente.

Após o registro e coleta das imagens, será apresentado um vídeo retratando o contexto da Moldávia, além de uma reportagem sobre o assunto divulgada no livro citado. A partir disso, algumas considerações serão feitas pelo grupo sobre o assunto. O vídeo selecionado apresenta um documentário sobre a realidade do país, que tem como característica uma população presente predominantemente de adolescentes, visto que os adultos emigram para outros países vizinhos em busca de melhores oportunidades. Algumas questões norteadoras foram usadas ao longo desta etapa da oficina: Vocês se identificam com essa realidade? Há aproximação com nossa realidade? Os adolescentes dos grandes centros urbanos são os mesmos do interior? Existe diferença entre Rural x Urbano? O que você pensa sobre isso?

Nessa oficina, como um dos objetivos busca a visibilidade da adolescência atual, um dos pontos desenvolvidos tratava-se da autoimagem desses adolescentes em relação ao seu grupo, à sociedade e a si mesmos. Portanto, no terceiro momento da oficina pedagógica será usado o vídeo Tour pelo meu rosto, que retrata a autoimagem, o autocuidado e a negritude.

A atividade final desta oficina acontecerá através do uso de um espelho, no qual será passado para cada participante olhar para si mesmo. Esse espelho apresenta em seu formato uma característica peculiar: foco e desfoco, ou seja, quando usado de um lado, você tem a percepção clara de si e quando usado do lado oposto, você vislumbra usa imagem desproporcional.

Após isso, os alunos realizarão um minuto de silêncio e ficarão olhando uns para os outros. No fim, escreverão cada um em seu próprio papel, um pouco sobre si mesmo, a partir da indagação inicial: “Quem é você adolescente? Eu sou...”.

Oficina 4

A quarta oficina pretende dialogar sobre os caminhos para construção e obtenção de informações sobre a temática da gravidez na adolescência com os alunos. A oficina pedagógica acontecerá mediante o uso de imagens e elaboração de pirâmides, representando o grau de informações e sentimentos das alunas e alunos para com suas fontes de informação. Os estudantes registrarão se as respectivas imagens atendiam ou não atendiam suas próprias expectativas enquanto fonte de informações sobre a temática da sexualidade e gravidez na adolescência. As questões levantadas perpassaram pela família, escola, amigos e internet.

Para tal, mediante o grau de relevância entre a imagem e o canal de busca de informações, os participantes montarão suas próprias pirâmides. As pirâmides foram construídas com três referenciais de escala: base, centro e topo. Ou seja, os amigos, família, escola e internet estariam em qual grau de fonte para informações, segundo as percepções dos participantes? Uma vez montadas suas pirâmides, os participantes serão levados para reflexões sobre o resultado de cada uma. Vale destacar que as pirâmides podem apontar para vários ângulos de análises. Ao longo do processo, os participantes refletirão sobre as seguintes questões norteadoras: Sua família atende suas expectativas? Seus amigos atendem suas expectativas? A internet atende suas expectativas? A escola atende suas expectativas?

Recursos Necessários

Quadro branco da própria sala de aula para registro de algumas questões, piloto, folhas de papel ofício, envelope de carta, balões, TV com entrada para pendrive, tesoura, cola e espelho.

Duração Prevista

As oficinas pedagógicas apresentam cada uma duração de 1h15min podendo ser realizado em dois dias ou uma oficina semanal. O projeto em questão foi desenvolvido durante minha dissertação de mestrado. Nesse contexto, as oficinas pedagógicas aconteceram em dois dias seguidos no contraturno escolar. No primeiro dia, ocorreram as oficinas: I (Estigmas e contrapontos da Gravidez na Adolescência) e II (Relações de Gênero na Gravidez na Adolescência). E no segundo dia, oficina III (Ser Adolescente) e oficina IV (Onde buscar informações). No total participaram das oficinas pedagógicas: catorze estudantes (doze meninas e dois meninos).

Processo Avaliativo

O processo avaliativo ocorreu de forma diagnóstica e formativa ao longo do processo. As tabelas sobre os jargões, ficha comportamental, imagens analisadas, produção de pirâmides sobre fontes de informações, a atividade "eu sou" e o registro pela participação nas oficinas foram usadas para análise das percepções dos estudantes sobre a gravidez na adolescência e as relações de gênero.

Observações

O projeto foi desenvolvido como recorte da minha dissertação de mestrado. A pesquisa foi desenvolvida em turmas dos nonos anos de ensino. As atividades foram realizadas em 2018. Em 2019 reproduzi as oficinas pedagógicas em minhas turmas nos anos finais do ensino fundamental (oitavos e nonos anos) e ensino médio. Todas as oficinas foram reproduzidas adaptadas para turmas com quase 40 alunos. Uma estratégia nesse contexto consiste na divisão da turma em grupos e mediação das dinâmicas propostas.

Referências Bibliográficas

CANDAU, V. (Org). Rumo uma Nova Didática. 23. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

BOZON, Michel. Sociologia da sexualidade. Rio de Janeiro: FGV, 2004.

HEILBORN, M. ( Org.) O aprendizado da sexualidade: reprodução e trajetórias sociais de jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Garamond e Fiocruz, 2006.

__________, (Org.) Sexualidade, reprodução e saúde. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009.

LEITE, V. Sexualidade adolescente como direito? A visão de formuladores de políticas públicas. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2013.

LOURO, G. (Org.) Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâneo na educação. 9.ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

E a minha dissertação de mestrado:

MOURA, Thiago de Souza; Ressignificando a Gravidez na Adolescência na escola: como as percepções das alunas e dos alunos estão permeadas pelas relações de gênero? Rio de Janeiro, 2019. 222p. Dissertação de Mestrado – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

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